Começou com uma prateleira, depois uma parede de madeira e mais outra, e por aí foi”. Foi indo até que uma casa de dois andares, em cima de uma mangueira, estava construída. Quem conta a história é a catadora Grace Hellen de Oliveira, uma das moradoras da Casa da Árvore, como já é conhecida entre os frequentadores. Na casa, que está numa pequena área gramada na avenida Barão Homem de Melo, no Nova Suíça, na zona oeste de Belo Horizonte, uma biblioteca a céu aberto com uma quantidade incontável de livros. Além de Grace, vivem lá mais três pessoas que, antes, moravam na rua.
Existente há dois anos, a Casa da Árvore foi ameaçada, na semana passada, por uma notificação da Prefeitura de Belo Horizonte, que exigia a desocupação e a demolição da edificação, dali a dois dias, contados a partir de 13 de setembro. Segundo a psicóloga Neide Pacheco, uma das organizadoras de uma rede de apoio aos moradores da Casa da Árvore, a PBH alegou que a notificação foi motivada por reclamações dos comerciantes da região. “Ainda disseram que poderia ter problema no período da chuva, que a estrutura podia cair... Enfim, deram essas desculpas que nós não aceitamos”, afirma.
Luana Ferreira Lima, advogada do Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos da População em Situação de Rua e dos Catadores de Materiais Recicláveis, ressalta que os moradores da Casa da Árvore estão exercendo o direito à cidade e deram outro significado para o espaço público. “Aqui era um estacionamento, utilizado de maneira irregular, com muito lixo. Eles limparam e fizeram a biblioteca, que é muito importante para a comunidade”, aponta.
A biblioteca
Grace é a responsável por organizar a biblioteca, que tem publicações de diversos tipos, desde romances, gibis e até livros didáticos. Ela explica que a maior parte é fruto de doações, mas que muitos ela e os outros moradores encontram no lixo.
Apaixonada pela leitura, Grace conta que o local funciona 24 horas e, por isso, não consegue contar o tanto de gente que aparece, pegando ou trocando livros. “Eu me dedico com a alma a essa biblioteca”, fala, sorridente. Aos 30 anos, Grace vislumbra um dia fazer faculdade de letras e dar aulas “Meu sonho é ensinar à terceira idade, porque, pra mim, a fase mais bonita da vida é a velhice”, diz.
Segundo Neide, a biblioteca é uma forma de prestar serviço aos moradores da região, que, na maioria, apoia a permanência dos moradores. “Fizemos um abaixo assinado e em poucos dias coletamos mais de 500 assinaturas. Alunos de escolas públicas, de ensino superior e professores têm vindo visitar, porque aqui é um espaço completamente diferente”, relata.
Próximos passos
Embora esteja suspensa a desocupação, a situação da Casa da Árvore segue instável. De acordo com Luana, a Promotoria de Direitos Humanos foi acionada e há irregularidades na notificação emitida pela PBH. “Queremos que a Prefeitura discuta sobre esse espaço com os seus moradores, garantindo a dignidade delas, a proteção, a assistência à saúde e que não seja feita nenhuma ação de retirada arbitrária e violenta”, aponta a advogada.
Programação. No domingo (24), pela manhã, vai acontecer uma oficina de percussão e, à tarde, um mutirão de organização da biblioteca. Um coletivo de arquitetos fará uma visita e discutirá medidas para melhorar a estrutura da Casa.
Para conhecer mais e fazer doações acesse o link: https://goo.gl/9gqDnU.
Edição: Joana Tavares