É possível disputar eleições sem ser filiado a um partido político? Atualmente, não. No entanto, essa possibilidade passou a ser discutida no Brasil, levantando críticas de ordem jurídica e política. O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá decidir sobre isso nesta quinta-feira (5).
Ricardo Gebrim, advogado e integrante da organização política Consulta Popular, entende que a possível modificação enfraqueceria ainda mais a democracia, favorecendo personalidades em detrimento de projetos de sociedade.
Gebrim ressalta que a alteração pode favorecer “figuras oportunistas” de diversas orientações políticas, mas ressalta a dificuldade dos partidos de direita brasileiros em encontrar nomes competitivos para as eleições de 2018: "[A medida] fortalece a projeção de figuras individualmente, independentemente de projeto político. Desobriga de ter compromissos com o partido que tem programa, projeto para a sociedade. Abre portas perigosas que enfraquecem mais ainda o sistema democrático. Isso vai estimular candidatos oriundos do Ministério Público, da Polícia Federal que estiveram envolvidos na Lava Jato”, analisa.
A questão chegou ao Supremo em junho deste ano, por conta de recurso de Rodrigo Mozzomo. Ele teve sua candidatura à Prefeitura do Rio de Janeiro, em 2016, barrada pela Justiça Eleitoral, justamente por não ser filiado a nenhum partido político.
Chamada a se manifestar, a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou parecer favorável à liberação das candidaturas avulsas. O argumento é de que o Pacto de São José da Costa Rica impede que sejam impostas limitações ao direito de se candidatar. O tratado, do qual o Brasil é signatário, não menciona de forma expressa a questão da filiação partidária.
A Constituição Federal, por outro lado, coloca de forma expressa como condição de elegibilidade ser filiado a um partido político. Em outras palavras, no entendimento da PGR, o pedido incomum de Mozzomo apontaria que um trecho original da Constituição seria inconstitucional.
Por esse motivo, Alexandre Soares, professor de Direito do Mackenzie, critica o entendimento da Procuradoria e diz que a liberação seria juridicamente “problemática”. Para ele, as condições de elegibilidade não ferem o direito à participação política, uma vez que estabelecem critérios gerais e válidos a todos.
Ele explica que, no ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição está acima dos tratados, e que, caso o Supremo seja favorável às candidaturas individuais, estaria rompendo a jurisprudência que vem historicamente sendo construída. Isso porque o texto elaborado pelos constituintes em 1988 não é passível de modificação pelo Judiciário.
“O artigo 14 da Constituição fala em condições de elegibilidade. Uma leitura que me parece clara é de que, se é uma condição, se você não preenche, não pode ser candidato. Em um dos incisos está a filiação a partido político. Não parece passível de interpretação. Isso não é emenda constitucional, foi o poder constituinte originário. Me parece complicada a ideia de regras constitucionais serem inconstitucionais”, diz.
A liberação de candidaturas avulsas enfrenta também outras críticas. A assessoria técnica do Tribunal Superior Eleitoral elaborou nota apontando dificuldades operacionais para que candidatos sem partido possam disputar eleições.
Uma delas é a maneira de escolher o candidato via urna eletrônica, já que 80% dos softwares que serão utilizados em 2018 já estão prontos. Outro ponto que geraria conflitos seria o cálculo de tempo de televisão, que hoje é definido de acordo com o tamanho da bancada parlamentar de cada partido.
Se aprovada pelo Senado, a regra passará a valer já nas eleições de 2018.
Edição: Vanessa Martina Silva