A Revolução Russa é considerada a primeira experiência bem sucedida de tomada do poder pelos trabalhadores. Figuras como Lênin, Trotsky, Sverdlov e Stálin aparecem em muitas obras como seus grandes personagens. Os eventos de 1917, entretanto, tiveram participam ativa de mulheres, dirigentes e militantes, que muitas vezes têm seu papel histórico subestimado.
Recentemente, há um consenso crescente na historiografia de que a primeira etapa da Revolução, ocorrida em Fevereiro, tem como seu ponto crucial e impulsionador o dia 23 de fevereiro do calendário juliano, então utilizado na Rússia. O episódio fundamental que que levou ao fim da monarquia absolutista foi uma manifestação de trabalhadoras por conta do Dia Internacional da Mulher. Em nosso calendário, ele é lembrado no Oito de Março.
Neste especial, o Brasil de Fato faz uma pergunta: quantas mulheres revolucionárias você conhece?
Abaixo, confira os perfis de mulheres que dedicaram suas vidas à luta revolucionária na Rússia, antes, durante e após 1917.
Konkordia Samóilova
Nascida em 1876, Konkordiia Samóilova era também conhecida como Natasha Bolshevikova, devido sua relação profunda com a corrente bolchevique. Entrou no Partido Social Democrata Russo em 1903 e realizou trabalho político pela organização na Revolução de 1905, sendo presa por 14 meses.
Realizava muitas atividades e cursos para as mulheres trabalhadoras, tendo dedicado grande parte de sua vida a elas. Ajudou a dirigir o principal jornal do Partido, o Pravda (A Verdade). Foi uma das únicas pessoas a criticar a reprodução de papéis historicamente delegados às mulheres, como a formação de enfermeiras ao invés de inspetoras. Morreu de cólera em 1921.
Angélica Balabanoff
Angelica nasceu no ano de 1878 em Chernigov, na Ucrânia, e passou alguns anos na Itália, onde teve contato com o marxismo. Com doutorado em Filosofia, no ano de 1900 entra para o Partido Socialista Italiano.
Durante reuniões na Conferência de Zummerwald, realizada após o fim da 2ª Internacional, conhece nomes como Lênin, Rosa Luxemburgo, Clara Zetkin e Inessa Armand e se junta ao Partido Bolchevique durante a Revolução de 17.
Balabanoff tinha pontos de vista firmes e claros, motivo pelo qual tinha dificuldades de lidar com Lênin. Angelica também foi secretária da 3ª Internacional, cargo que abandona em 1922, após a desilusão com várias atitudes e ideias dos camaradas durante a Revolução e volta para a Itália para liderar o Grupo Maximalista. Se junta ao Partido Socialista dos trabalhadores em 1947 e morre em 1965, em Roma (Itália).
Elena Dimítrievna Stássova
Militante partidária, Elena tinha muitas responsabilidades dentro da organização, mas não gostava muito de ser vista e, por conta disso, não costumada ir para a linha de frente nos protestos. Estava sempre atolada de trabalho e à postos, pronta para qualquer tarefa.
Elena fez parte dos “velhos bolcheviques”, tendo nascido em 1873, em São Petesburgo. Era de família nobre e entrou para o Partido Social Democrata Russo em 1898. Foi eleita como membro do Comitê Central do Partido Bolchevique em 1912 e é presa no ano de 1916.
Após a Revolução de Fevereiro, foi nomeada secretária do Comitê, onde exerceu o cargo até 1920. Durante a Revolução de Outubro, Stássova era uma das lideranças, por quem os guardas e trabalhadores estavam sempre atentos esperando respostas e ordens. Morreu em 1966, com 93 anos.
Inessa Fyodorovna Armand
Apesar de ter nascido na França, em 1874, Inessa morou na Rússia a maior parte da vida, onde participou intensamente na luta dos bolcheviques, sendo, inclusive, secretária do Comitê de Organizações Estrangeiras, coordenando todos os bolcheviques da Europa Ocidental.
Foi também enviada de Lênin à conferência da 2ª Internacional em Bruxelas, onde figuras importantes como Roxa Luxemburgo, Leon trotsky e Julius Martov também estavam presentes. Sua ligação com Lênin foi intensa, chegando a ter com ele uma relação amorosa.
Sua história na Rússia se deu quando foi morar com a tia em Moscou, após o falecimento do pai. Casou-se as 18 anos com um fabricante de têxtil e juntos, em Moscou, abriram uma escola para crianças camponesas. Neste período, Inessa também se envolveu com a ajuda à mulheres indigentes, o que já demonstrava seu idealismo.
Em 1903, ingressou no Partido Trabalhista Social Democrata e aos 30 anos largou o casamento e foi estudar feminismo na Suécia, se juntando com os bolcheviques. Foi presa, mas conseguiu fugir e instalou-se em Paris, onde conheceu Lênin, entre outros militantes que viviam no exílio.
Junto com Alexandra Kollontai e Nadezhda Krupskaya, Inessa foi editora da Rabotnitsa e após a Revolução de Outubro foi membro executivo do Soviete de Moscou. Também assumiu a direção do Jenotdel, organização com foco na luta pela igualdade feminina dentro do Partido Comunista, e presidiu a Primeira Conferência Internacional de Mulheres Comunistas em 1920. Contraiu cólera e morreu aos 46 anos.
Sofia Gontcharskaia
Sofia nasceu em 1889 e participou da Revolução Russa de 1905. Adentrou ao Partido Socialista, com ideais bolcheviques, quando emigrou para os EUA em 1911, retornando à Rússia justamente no ano da Revolução.
Após fevereiro, e a não aceitação por parte do governo das reivindicações da população, Gontcharskaia lidera um sindicato da área de serviço de lavanderia, ramo onde predominavam as mulheres.
Uma greve liderada por ela teve adesão de 40 mil trabalhadoras, onde as reivindicações eram aumento de salário, diminuição de horas de trabalhado, fim do assédio sexual e benefícios de maternidade. Sofia também participou da Revolução de Outubro e foi oficial do Exército Vermelho nos Montes Urais.
Nadejda Krupskaia
Nascida em São Petesburgo em 1869, Nadejda também foi a companheira de Lênin. Cresceu em meio às duras críticas que o pai, oficial do Exército, fazia ao regime czarista e já desde criança tinha um desejo de ajudar o povo sofrido. Após a morte do pai, Nadejda deu aulas gratuitas aos filhos de operários ao mesmo tempo em que ela e a mãe trabalhavam para sobreviver.
Aos 21 entra em um grupo de estudos marxistas e começa sua militância. Neste processo, conhece Lênin e torna-se sua secretária e braço direito. É autora do folheto “A Mulher Operária”, de 1913, enfatizando a exploração da mulher no trabalho e fez também parte da fundação de jornal “Rabótniza”, focado na questão da mulher operária.
É autora do panfleto “A Mulher Trabalhadora”, de 1900, um dos primeiros escritos do contexto russo sobre mulheres e trabalho e foi uma das principais organizadoras do Jenotdel, o departamento feminino do PC soviético, com ênfase no discurso do direito da mulher ao próprio corpo e ao aborto.
Nadejda sempre se envolveu com educação e durante a Revolução Bolchevique, em 1917, torna-se Comissária da Educação, continuando o trabalho que realizava na juventude de alfabetização dos operários. Mesmo após a morte de Lênin, ela continuou seu trabalho educativo durante o comando de Stálin.
Ela também é autora do livro “Memórias de Lênin”, que contém detalhamentos da vida do companheiro. Nadejda morreu em 17 de fevereiro de 1939, em Moscou, e ficou conhecida entre os companheiros como uma pessoa firme que mesmo nos momentos de dificuldade e perigo tinha um foco na vitória da justiça.
Aleksandra Kollontai
Nasceu em 1872 e veio de família nobre. Foi membro do Partido Social-Democrata. E fez parte, juntamente com as militantes Nadiéjda Krúpskaia e Inessa Armand, do conselho editorial da publicação chamada “Rabótnitsa”, que tinha como foco conscientizar politicamente as mulheres operárias.
Escreveu “O comunismo e a família”, onde fala sobre a transformação das relações familiares. Lutou pelos direitos das mulheres desde antes da Revolução e foi a primeira mulher que ocupou um cargo no alto escalão do governo russo. É autora de "Autobiografia de uma mulher comunista sexualmente emancipada”, que traz a questão da mulher de, mesmo quando se recebe direitos, na prática continuarem sofrendo opressão, seja com tarefas domésticas ou pela alta de autoridade familiar.
Foi responsável pelo Jenotdel, o Primeiro Congresso das Mulheres Trabalhadoras e Camponesas de toda a Rússia dentro do Partido Comunista, onde foi diretora geral em 1920 e 1921. Após entrar para a Oposição Operária, passou o resto da vida cumprindo atividades diplomáticas até sua morte, em 1952.
Klavdia Nikolaeva
Operária e de origem pobre, Klavdia nasceu em 1893 e juntou-se aos bolcheviques em 1908 em defesa dos sovietes e do comunismo. Discursava estimulando as mulheres a lutarem e trazê-las para o Partido Bolchevique.
Fez parte do Rabótnitsa, jornal direcionado às mulheres operárias. Foi bastante ligada às questões da maternidade, por ser ela mesmo mãe. Chegou ao cargo de direção do Jenotdel, setor do Partido Comunista ligado às mulheres, em 1924, ficando até 1927. Morre em 1944, não sem antes ter sido também membro do Comitê Central por quatro vezes.
Colaboração: Pesquisa e informações de Thaiz Senna | Edição: Simone Freire | Artes gráficas: Wilcker Morais