"Eu sonho em brasileiro, penso em brasileiro, tenho uma família brasileira. Estou construindo uma casa aqui. Para quê? Se estivesse essa preocupação [de fugir], estaria construindo uma casa aqui? Se estou construindo uma casa aqui é porque acho que vou viver junto com a minha família.". A declaração é de Cesare Battisti, ex-ativista italiano.
Vivendo em Cananeia, no litoral de São Paulo, ele recebeu o Brasil de Fato para uma entrevista exclusiva. Battisti falou sobre o processo aberto contra ele, no início de outubro, quando foi preso e indiciado pela Polícia Federal pelos crimes de evasão de divisas e lavagem de dinheiro, fato que o coloca em risco de ser extraditado do Brasil.
Na ocasião, a polícia afirmou que o ex-ativista tentava atravessar a fronteira com a Bolívia com o equivalente da R$ 23 mil. O valor é superior aos R$ 10 mil com os quais é permitido sair do país. Ele nega veementemente as acusações.
"Eu não fui pego na Bolívia, nem na fronteira com a Bolívia. Eu não tinha esse dinheiro. Esse dinheiro pegaram de três pessoas e colocaram tudo nas minhas coisas porque só assim poderiam forjar um crime. Era uma operação que estava em curso há muito tempo", acusou.
Aguardando o processo em liberdade, o futuro de Battisti será decidido nesta terça-feira (24) pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que julga o pedido de habeas corpus feito pelos advogados de defesa do italiano.
Caso os ministros decidam pela não concessão do pedido, Battisti fica à mercê da decisão do presidente golpista Michel Temer (PMDB), cuja tendência é extraditá-lo.
Caso complicado, a versão de Battisti ganha mais detalhes no relato feito por Carlos Lungarzo, autor do livro “Os Cenários Ocultos do Caso Battisti”. Ex-professor da Unicamp, em seu blogue, Lungarzo faz um acompanhamento rigoroso do caso.
"Estive reconstruindo. Ele vinha sendo perseguido desde um certo lugar. Ele diz que estava longe da fronteira, estava a 200 quilômetros. A polícia revistou todo o carro e não encontrou nada, salvo esse dinheiro. Obrigaram os três a se aproximarem da fronteira. O juiz disse que ele tinha a intenção de sair, então o juiz adivinha a consciência", pontuou.
O ex-ativista justifica a iniciativa contra ele por conta do seu passado político. O governo italiano atribui a ele as ações do grupo antifascista Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), no anos 1970.
Dalmo Dallari, professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), ressalta que a extradição de Battisti precisa ser baseada em um fato novo. O jurista explica que o governo Temer tenta uma distorção da lei para forçar uma possibilidade de punição de Battisti.
"O que poderia acontecer é uma reabertura se descobrissem um fato novo. Fato antigo, mas novo pelo conhecimento, que tivesse influído na prática dos atos de que ele é acusado. O que estão chamando de fato novo é essa prisão ilegal. Não é um fato novo, não tem influência para reabrir o prazo da punição", pontua.
O ex-deputado Luiz Eduardo Greenhalgh atuou na defesa de Battisti até 2009, também faz uma análise crítica da situação de Battisti. Ele aponta que a possível extradição do italiano é um dos legados do golpe parlamentar de 2016, que destituiu a presidenta Dilma Rousseff.
"O que se pretende é uma violência. Uma violência! Hoje é com Cesare Battisti, amanha será com cada um de nós. Não há segurança jurídica no Brasil de Temer", disse.
Battisti obteve o visto de permanência do Conselho Nacional de Imigração do Brasil em agosto de 2011. Apesar dos percalços, ele afirma ter esperança de que Temer não vai decidir por sua extradição.
Edição: Simone Freire