Após o encerramento da caravana de Lula por Minas Gerais, movimentos populares avaliam que, se o objetivo do ato era ouvir a população e fomentar debates, ele foi bem-sucedido. Porém, ressaltam a importância da mobilização popular, do trabalho com as bases para a resistência ao golpe parlamentar que destitui a presidenta Dilma Rousseff em 2016 e da construção de um projeto de nação que vá além do tema eleitoral.
Dirigentes dos Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Levante Popular da Juventude, Central Única dos Trabalhadores (CUT) e União Nacional dos Estudantes (UNE) concordam que percorrer 20 cidades de Minas — passando pelo Vale do Jequitinhonha, Vale do Mucuri, Vale do Aço, do Rio Doce, Norte e região Central — revelou uma forte identificação de Lula com a população dessas cidades e com as políticas sociais colocadas em prática durante os governos petistas.
O carinho com os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff foi reflexo do reconhecimento pela melhoria das condições de vida, avalia o militante do Levante Popular da Juventude Luiz Paulo Macedo Alves. Além disso, a disposição de viajar pelo país e conhecer a realidade — especialmente dos lugares mais empobrecidos — seria um diferencial em relação aos políticos que escolhem governar a partir de seus gabinetes, aponta o jovem.
Já a presidenta da Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais, Beatriz Cerqueira, avalia que, “no caso de Minas, temos senadores que não conversam com o povo e votam de acordo com seus interesses privados. Temos uma bancada de deputados federais, com raras exceções, que têm votado tudo contra a classe trabalhadora” .
A caravana mostrou também uma indignação crescente com as políticas do governo golpista de Michel Temer (PMDB), como apontam parlamentares do Partido dos Trabalhadores que acompanharam a ação. “A caravana funciona como um processo de resistência ao golpe que segue acontecendo no Brasil. É preciso fortalecer a resistência, porque a agenda dos neoliberais não parou”, ressalta Marília Campos, deputada estadual pelo PT em Minas.
Para além das eleições
Os entrevistados destacaram a necessidade de defender a candidatura de Lula e sua eleição em 2018. No entanto, reforçaram que apenas isso não é suficiente para enfrentar o contexto de golpe no Brasil. Para eles, o elemento mais destacado para isso é a organização e mobilização popular.
“O golpe também ocorreu porque nós falhamos em não colocar na nossa estratégia a capacidade de reação do povo. Veja o exemplo da Venezuela, com um governo que foi capaz de enfrentar o imperialismo e fazer democracia direta”, pontua o deputado estadual Rogério Correia.
Soniamara Maranho, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), avalia que a caravana sinalizou para uma necessidade fundamental de as esquerdas voltarem ao trabalho de base: “Essa é nossa tarefa como movimentos populares, ajudar a construir o debate de um projeto como prioridade no Brasil”, afirma.
Ela entende que não adianta apenas eleger um governo progressista. “É preciso força social”, resume, citando outros países da América Latina que investiram no empoderamento do povo, como a própria Venezuela, Cuba, Bolívia e Equador.
A necessidade de conversar com as pessoas e insistir para um posicionamento frente ao cenário político é destacada também por Jessy Dayane, vice-presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE). “Acho que a caravana, as eleições, a Frente Brasil Popular, têm construído estímulos para que o povo se posicione — denunciando que foi golpe, é retrocesso, que não é um ataque a Lula, é um ataque a um projeto — para depois se mobilizar. Precisamos ter avanços democráticos, fazer mais medidas inclusivas, para atender as necessidades do povo”, pontua.
Programa
Ênio Bonenberger, da direção do MST, parafraseia Geraldo Vandré e sentencia: “A sociedade brasileira, os movimentos e o PT têm que entender que a vida não se resume a eleições. É uma parte importante do processo democrático, da cidadania, mas é uma parcela pequena da democracia brasileira”, afirma. Ele cita o processo de construção de um programa que tem sido feito pela Frente Brasil Popular — que reúne dezenas de organizações e partidos do Brasil — como um esforço necessário e que precisa se ampliar. “Precisamos garantir que as ideias não fiquem no discurso e não se dissolvam durante a construção de alianças que ocorrem na época de eleições”, defende.
Todos sublinham a necessidade de caminhar junto e atrair mais pessoas para a ideia da necessidade da construção de um projeto popular. “Estamos botando muita fé nas unidades dos movimentos de esquerda. É importante que, após a eleição a gente consiga manter a unidade e garantir que as mudanças sejam efetivadas”, conclui Luiz Paulo, do Levante Popular da Juventude.
Referendo e democratização da mídia
Além de defender a retomada de um processo de soberania nacional, Lula disse em seus discursos ao longo da caravana que pretende convocar um plebiscito revogatório para anular as medidas de Temer.
Uma crítica muito forte em relação aos governos petistas é a ausência de um processo de regulação e democratização dos meios de comunicação privados, elencados pelos entrevistados como um dos principais agentes do golpe contra Dilma, em 2016. Agora, a pauta tem aparecido nas falas públicas de Lula. “Acho que de fato quando a gente teve no governo não atacou como tinha que atacar o monopólio, a Rede Globo. Estou convencido que democratizar a comunicação é algo central para o próximo governo”, reconhece o senador Lindbergh Farias.
Além desses dois temas – que todos concordam que são centrais em um possível governo petista em 2018 — os movimentos citam ainda diversas outras pautas, como uma reforma fiscal que reverta a desigualdade social, reforma agrária, políticas para a juventude, reformas no Judiciário e diversas outras, como a convocação de uma Assembleia Constituinte, para a mudança do sistema político.
Edição: Vanessa Martina Silva