Lava Jato

“Nem toda classe está idiotizada”, diz procurador que protestou em palestra de Moro

Juiz paranaense subiu ao palco na abertura do Congresso Brasileiro de Procuradores Municipais, em Curitiba

Brasil de Fato | Curitiba |

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Manifestantes afirmam que "Moro é visto como um julgador que fragiliza o modelo acusatório desenhado na Constituição de 1988"
Manifestantes afirmam que "Moro é visto como um julgador que fragiliza o modelo acusatório desenhado na Constituição de 1988" - Daniel Giovanaz

O juiz Sérgio Moro fez uma das palestras de abertura do Congresso Brasileiro de Procuradores Municipais na noite desta terça-feira (21), no teatro da Ópera de Arame, em Curitiba (PR).

Um grupo de procuradores havia planejado abrir oito faixas com as letras da palavra “vergonha”, assim que o magistrado começasse a falar ao microfone. Porém, a equipe de segurança do evento decidiu apreender os objetos antes da palestra.

Afronta

Procuradora em Fortaleza, Rosaura Brito Bastos explica o motivo dos protestos. “A gente considera o convite ao Sérgio Moro uma afronta para a advocacia. O evento é de advogados, e ele é um juiz que reconhecidamente não respeita as prerrogativas dos advogados. Inclusive, ele já mandou um advogado fazer concurso para juiz, o que é um absurdo, um desrespeito”, analisa.

Com as faixas apreendidas, os procuradores mudaram de estratégia: começaram a vaiar e gritar a palavra “vergonha” sempre que o nome de Sérgio Moro era citado no palco. Como o grupo era minoritário, os gritos de protesto eram abafados por aplausos, na maioria das vezes.

“Eu vi que ele levou até um susto quando a gente começou a dizer que [a presença dele] era uma vergonha. Ele não esperava isso”, disse Guilherme Rodrigues, ex-presidente da Associação Nacional dos Procuradores Municipais (ANPM), que organiza o Congresso. “Nem toda a classe está idiotizada. Nem todo mundo entrou nessa barca furada, nesse jogo midiático. É bom que isso fique registrado. Lá na frente, os colegas que estão nos recriminando, nos condenando, vão nos agradecer”, completou.

Desde maio

A polêmica começou há seis meses, quando os procuradores receberam a notícia de que Sérgio Moro seria um dos palestrantes do evento. Setenta e dois membros da ANPM enviaram uma carta à organização “visando preservar nossa entidade de qualquer acusação de partidarização política”. O texto, enviado no dia 25 de maio, também ressalta que “o juiz Sérgio Moro é visto como um julgador que fragiliza o modelo acusatório desenhado na Constituição de 1988, revelando pouco apreço ao processo justo”.

Como alternativa, os procuradores indicavam que a palestra de Moro fosse seguida de um “contraponto”, do ponto de vista jurídico. Um dos juristas sugeridos para cumprir esse papel no evento foi Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça.

Carlos Figueiredo Mourão, presidente da ANPM, respondeu a carta com um ofício, em nome da Associação, no dia 31 de maio. O argumento dele é que a palestra do magistrado seria relevante do ponto de vista do combate à corrupção no Brasil: “Em momento algum, cogitou-se fala do palestrante sobre atuação judicial, persecução criminal, operação Lava Jato ou qualquer outro tema. Destaca-se, também, que (...) a posição defendida pelos palestrantes não espelha a posição da organização do evento, mas servem para fomentar o debate”.

Controvérsia

Segundo a assessoria de imprensa do evento, os cartazes que formavam a palavra “vergonha” não foram tomados à força, mas sim, entregues à organização após um acordo com os manifestantes, “para evitar bagunça”.

Guilherme Rodrigues relata o incidente de outra forma. “Enfrentei os seguranças e entrei [com as faixas] na marra. Eles ameaçaram chamar o comando da polícia, e nós falamos que podiam chamar, que eu não entregaria [as faixas]. Depois, eles aproveitaram um descuido nosso e puxaram a faixa. Ainda reagi e tentei tomar de volta. Foi aí que os colegas pediram para deixar para lá”, disse.

A palestra durou cerca de uma hora, mas os procuradores insatisfeitos deixaram o teatro logo ao início da fala do juiz. Sérgio Moro falou sobre o avanço da operação Lava Jato, pediu rigor no combate à corrupção sistêmica e não comentou as reações negativas de parte da plateia.

Edição: Ednubia Ghisi