Todos os dias, 13 brasileiras perdem a vida de forma violenta em algum canto do país. Embora morram mais homens do que mulheres no Brasil — uma outra tragédia, ampliada pelo racismo e pela criminalização da pobreza –, a luta do movimento feminista é pelo reconhecimento de que morremos por outras causas, em outros espaços e contextos e vítimas de algozes muito específicos.
Dessas 13 mulheres, mais de 83% morrerão pelas mãos de homens em quem confiavam e por quem nutriam afeto, o que demonstra a crueldade da situação: a maioria de nós será assassinada por alguém que nos viu crescer, ou com quem tivemos filhos, que frequenta a nossa casa e a quem chamamos de irmão, pai, amigo ou companheiro. Muitas também morreremos vítimas de violência sexual ou de um aborto inseguro.
Neste dia 25 de novembro, Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher, são enormes os desafios a serem superados pelo fim dos crimes de ódio cometidos contra as mulheres, e eleger apenas alguns seria uma injustiça. Porém, é preciso começar de algum lugar, e focar na humanização do atendimento, no apoio às vítimas, na educação e na responsabilização dos meios de comunicação é um importante começo:
– Capacitação de profissionais: É preciso sensibilizar os profissionais que atuam no atendimento e acolhimento das mulheres vítimas de violência e dar a eles condições estruturais para realizar o seu trabalho, por meio do investimento massivo na criação e melhoria dos serviços. A humanização do atendimento é essencial, pois somente ela permitirá à mulher ter o apoio e a força necessários para seguir adiante com a denúncia. Uma mulher que é mal atendida e não volta a procurar o serviço é uma mulher que muito provavelmente entrará para as estatísticas.
– Amparo às sobreviventes e suas famílias: a vítima não pode ser esquecida neste processo, tampouco sua família e sua comunidade. Não bastam as leis e o combate aos crimes se os afetados pela violência são desamparados pelo Estado e pela sociedade. Neste processo, a vítima não pode ser apenas um número e um meio de prova. A valorização da memória das vítimas e a reparação a quem foi afetado também devem ser levadas em conta no enfrentamento da violência. Também é preciso investir em apoio psicológico e social e em programas de geração de renda para que a vítima tenha direito a recomeçar sua vida.
– Educação e conscientização da população: numa sociedade em que o machismo e a misoginia são fundantes e estruturantes das nossas relações e experiências, a violência contra a mulher é algo naturalizado no cotidiano. Para romper com essa mentalidade, é preciso desaprender a misoginia e se educar para a equidade e a justiça. Isso envolve desde a abordagem do tema em sala de aula até a produção de estatísticas que fundamentem as políticas públicas e a realização de campanhas voltadas à população como um todo.
– Uma mídia consciente e responsável: culpabilização da vítima, adoção de termos impróprios que naturalizam e até romantizam a agressão, viés puramente policial e sem contextualização. As reportagens sobre feminicídio no Brasil são um exemplo cruel de como a imprensa pode ajudar a reproduzir a violência contra a mulher. É urgente a capacitação dos profissionais de imprensa sobre a violência contra a mulher, assim como a responsabilização legal dos meios de comunicação que reiterem a violência.
Para saber mais: Dossiê Feminicídio — Invisibilidade Mata, da Agência Patrícia Galvão.
*Vanessa Fogaça Prateano é jornalista, pesquisadora do Núcleo de Criminologia e Política Criminal do curso de pós-graduação em Direito da UFPR e fundadora do Coletivo de Jornalistas Feministas Nísia Floresta.
Edição: Ednubia Ghis