A instituição de ensino superior Estácio de Sá demitiu 1.200 professores nesta semana. A ação surpreendeu alunos, docentes e gerou ampla repercussão pelo fato de a medida ter sido tomada logo após a aprovação da reforma trabalhista.
Flávio* foi um dos professores demitidos. Ele atuava na unidade de Goiânia da Estácio e lecionava na instituição há oito anos e foi dispensado de uma hora para a outra. “Acabei de receber essa notícia. Inclusive já tinha pessoas sabendo antes que eu soubesse. Foi bem seco e simplista, nós só fomos informados do desligamento, não havia uma causa específica, foi só em uma dinâmica de contenção e redução do custo docente", diz.
Para ele, o real motivo do desligamento envolve a precarização do trabalho de professores universitários: "Todos sabem que o real e único motivo foi essa questão de custo, de direitos trabalhistas, que serão todos, por assim dizer, em um futuro muito próximo, negligenciados, como já está sendo”.
A faculdade anunciou as demissões em uma postagem na sua página do Facebook e vem recebendo milhares de reações negativas.
A turma de enfermagem da Estácio de Goiânia chegou a criar um grupo no Whatsapp para organizar ações contra a demissão de boa parte do corpo docente do curso. Os alunos do campus de Curitiba também se mobilizaram e criaram um abaixo assinado online em repúdio às demissões. A petição já conta com mais de mil assinaturas.
Os sindicatos, por sua vez, estão se mobilizando para entrar na Justiça contra a instituição. De acordo com a Presidenta do Sinpro, o Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais, Valéria Morato, a ação constitui uma demissão em massa e, por isso, é ilegal.
“Aqui em Belo Horizonte, são 245 professores [que trabalham na Estácio]. Até agora, a gente tem notícias de 54 demissões, o que caracteriza demissão em massa, e nós vamos questionar isso na Justiça. Para demitir em massa, precisava fazer uma negociação antes com o sindicato para ver outras alternativas”, explica.
Gilson Reis, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimento de Ensino, ressalta que a organização entrará com uma ação no Ministério Público Federal (MPF), denunciando a Estácio de Sá.
Segunda maior empresa educacional no Brasil, a Estácio de Sá vem apresentando dificuldades financeiras no último ano, após uma tentativa frustrada de fusão com a empresa Kroton Educacional. Desde então, foram realizadas diversas tentativas de redução de salário de professores.
De acordo com Reis, agora, com as novas leis trabalhistas, a empresa viu uma possibilidade de reduzir os custos. O que, diz ele, ocorre “através de outros contratos, terceirização, contrato intermitente, autônomo, ou 'pejotização', tem um cardápio enorme para fazerem reduções dramáticas e contratarem professores que se sujeitam a receber um salário miserável”.
Flávio (*) conta que os professores que foram demitidos no campus onde trabalhava eram os que tinham os maiores salários porque ou tinham mais tempo de casa ou eram doutores. “Eu tinha um amigo que brincava que se despedisse um de nós, contratavam dois, três, até quatro [professores] com o mesmo salário. De fato, os novos planos de salário recebem menos do que a gente”.
De acordo com Valentina*, estudante de biologia do campus de Castanhal, no Pará, os alunos também estão sendo prejudicados pela demissão em massa.
“Nós estamos sem coordenador do nosso curso. Já causaram impacto negativo, porque não sei como pretendem manter a qualidade do estudo tirando os melhores profissionais. Sabemos que [os professores demitidos] são mestres, doutores, bem qualificados, com anos de serviço, sendo dispensados sem nenhuma justificativa e motivo aparente”.
Valentina conta que foi bloqueada das redes sociais da Estácio, após exigir respostas da instituição. “Não deram satisfação nem nada. Ontem bombardeamos a página oficial da Estácio exigindo alguma posição ou satisfação, e eles só copiam e colam a resposta. Todo mundo está conversando às escondidas, ninguém pode falar alto demais. A prova disso é que eu fui bloqueada pela própria página, eu entrei ontem para tentar comentar, e eu já estava impedida para comentar”.
Em nota, a assessoria de imprensa do grupo Estácio afirmou que as demissões fazem parte de uma “reorganização em sua base de docentes”, com o objetivo de “manter a sustentabilidade da instituição”. A nota também diz que os novos profissionais serão contratados pelo regime CLT.
Por telefone, a assessora de imprensa confirmou que a economia de gastos é um dos motivos das demissões, porém disse que não é possível responder se os novos salários serão menores do que o dos professores demitidos.
(*) os nomes foram alterados, a pedido dos entrevistados, para preservar o anonimato
Edição: Vanessa Martina Silva