Interferência nos conselhos ambientais, intimidade excessiva entre prefeitura e mineradoras, ocultação de documentos e intimidação de moradores – por meio de ações judiciais – são algumas das irregularidades que foram denunciadas, na quinta (25), ao Ministério Público da cidade de Caldas, localizada no sul de Minas Gerais.
Quem assina as denúncias é a Aliança em Prol da Área de Preservação Ambiental (APA) da Pedra Branca, organização que reúne mais de 13 entidades da região da Serra da Pedra Branca e luta por sua preservação. Em coletiva de imprensa, o presidente da organização Daniel Tygel afirmou que a representação contém 24 fatos, “de grande gravidade”. “O objetivo é dar ciência ao promotor para que ele possa fazer os estudos e iniciar investigações”, aponta.
De acordo com Daniel, as irregularidades começaram quando havia ampla participação da sociedade no Conselho Gestor da APA (Congeapa). Após dois anos de estudos, o Congeapa decidiu revogar a permissão de mineração de uma empresa que atuava na região. Para tentar evitar o cancelamento da licença, a prefeitura chegou a impedir o uso da sala de reuniões do Conselho, que ainda assim realizou a reunião na rua. “As decisões judiciais que foram acontecendo a nosso favor estavam indo contra os interesses econômicos das mineradoras”, afirma Daniel.
Após esse evento, iniciou-se um processo definido por Daniel como “a tomada dos conselhos”. A partir de uma série de movimentações por parte do poder público, os assentos do Congeapa e do Conselho de Defesa do Meio Ambiente (Codema) foram ocupados por integrantes do poder público e representantes de empresas.
Em um dos casos emblemáticos, contados por Daniel, o representante da Câmara Municipal no Congeapa compareceu à reunião que faria a deliberação sobre uma licença para mineração vestido com a camisa da Associação das Mineradoras de Caldas e Santa Rita de Caldas (Amicas). “A pergunta que fica é: ele estava representando a casa do povo, ou a Amicas?”, questiona.
Todos os acontecimentos desembocaram na alteração do artigo 51 da Lei Municipal 1.973/2006, que criou a APA. De acordo com Daniel, “não era uma lei radical. Ela conseguiu conciliar os empregos que a mineração já havia gerado, com a preservação do meio ambiente. O artigo 51, que proibia a abertura de novas lavras, era o coração de um pacto que existia na cidade. Esse pacto foi quebrado e por isso falamos que foi uma traição”.
Após a alteração da lei da APA, aprovada pelo legislativo e sancionada pelo prefeito Ulisses Borges (PTB) no apagar das luzes de 2017, as mineradoras esperam triplicar a área explorada dentro da APA. A prefeitura tem negado o acesso a vários documentos, mas há indícios de que já houve pedidos de novas áreas de mineração com base na nova lei, indicando que algumas empresas já esperavam pela mudança. A reportagem buscou contato com a Prefeitura de Caldas, mas não obteve resposta até o fechamento da matéria.
Área de preservação
A Serra da Pedra Branca é uma área de extrema relevância ambiental e cultural. Seu bioma é Mata Atlântica de altitude e, por abrigar os mais altos picos da região, é uma importante zona de recarga da Bacia do Rio Grande, onde nascem os Rios Mogi e Pardo. O local abriga plantas raras e endêmicas. A região é povoada há muitos anos, antes mesmo da fundação da comarca de Caldas, e possui tesouros culturais como o plantio de uvas e produção de vinho, o artesanato de palha de milho e as sementes de milho crioulas da região.
As organizações que compõem a Aliança em Prol da APA da Pedra Branca esperam agora que o Ministério Público investigue as denúncias para avaliar a possibilidade reversão da alteração da lei. Também foi anunciado que em que breve será elaborado um projeto de lei de iniciativa popular com objetivo de proteger a APA da Pedra Branca.
Edição: Larissa Costa