Deputados da oposição na Câmara Federal reagiram fortemente à assinatura do decreto que oficializa a intervenção militar no estado do Rio de Janeiro. Durante a publicação do documento, na tarde desta sexta-feira (16), o presidente golpista Michel Temer (MDB) disse que pretende suspender a intervenção quando os parlamentares avaliarem que há condições para a aprovação da reforma da Previdência.
Para o líder do PSB na Câmara, Júlio Delgado (MG), o discurso confirma a suspeita de que haveria relação entre o decreto e o possível fracasso da reforma. A proposta se arrasta no Legislativo desde 2016 e ainda não tem expectativa de sucesso.
“A crise de violência do Rio não começou da semana passada pra cá. É muita coincidência que o decreto seja publicado nas vésperas da data marcada pra votação da [reforma da] Previdência. A coincidência na política não existe", afirmou o parlamentar.
A ligação entre as duas coisas se dá pelo fato de a Constituição Federal proibir a aprovação de emendas constitucionais, como é o caso da reforma, durante esse tipo de ação estatal.
A argumentação de Temer é de que a medida irá ajudar a combater o crime organizado. Em declarações dadas nesta sexta, o general Walter Souza Braga Netto, nomeado como interventor militar para comandar a operação federal no Rio, informou que será iniciado um estudo para definir as ações.
O anúncio foi criticado pelo deputado federal Alessandro Molon (Rede), da bancada do Rio de Janeiro. Ele aponta falta de planejamento do governo e reforça que a medida não corresponderia ao que o Planalto tem dito.
“Isso mostra que não é a segurança da população que está vindo em primeiro lugar. No fundo, o que o governo quer é adotar uma manobra para desviar o foco da reforma da Previdência", assinalou.
Para aprovar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287, nome oficial da reforma na Câmara, o governo precisa de 308 votos. Enquanto a base aliada do Planalto e os opositores intensificam a queda de braço em torno da matéria, o Congresso deverá votar, na próxima segunda (19), o decreto sobre a intervenção militar. Segundo a Constituição, ele precisa ser autorizado pelo Legislativo, mas tem validade imediata.
A medida divide opiniões. Alguns deputados defendem a intervenção, mas, em geral, a iniciativa vem sendo amplamente criticada por parlamentares e movimentos do campo progressista.
Para o líder do Psol na Câmara, Ivan Valente (SP), o decreto ofusca a necessidade de medidas mais estruturantes e coordenadas que possam de fato reduzir os índices de violência.
“O povo do Rio e do Brasil inteiro espera que a segurança seja resolvida também com saúde, educação, emprego, inteligência policial", destacou.
Rio de Janeiro
A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) destaca que as tropas federais já estiveram no estado outras vezes e não ajudaram a frear o avanço da violência. Ela defende que o Exército poderia auxiliar o estado nas ações de inteligência, mas critica o uso das tropas no patrulhamento ostensivo, que consiste nas ações de rua.
“As Forças Armadas não são forças policiais. Elas são preparadas para a guerra, para matar, não são forças de segurança do cidadão. A cidadania precisa de uma segurança pública que a proteja”, argumentou.
O advogado Gabriel Sampaio, ex-secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, afirma que a publicação do decreto, discutido por Temer em parceria com o governador do Rio, Pezão (MDB), atesta a incapacidade do governo estadual em administrar a crise na segurança pública.
Ele aponta como um dos problemas as estratégias de atuação da polícia, que atende desde ocorrências de brigas de vizinhos até casos relacionados ao crime organizado. A prática, segundo ele, impede que os agentes concentrem as ações em problemas mais complexos, como a repressão ao comando do tráfico de drogas e armas.
“Você tem uma margem de condutas exigidas do trabalho policial que hoje se mostra cada vez mais insustentável", sublinha.
Sampaio defende a adoção de medidas de prevenção da violência, além da integração das atividades dos agentes de segurança e de uma revisão das prioridades das ações policiais.
“Se o país não rediscutir de forma ampla e profunda a política de segurança pública, nós vamos repetir cada vez mais essa fórmula fadada ao fracasso”, considera.
O decreto sobre a intervenção militar tem data final prevista para 31 de dezembro deste ano.
Edição: Mauro Ramos