É nesse cenário que nós, mulheres, levantamos a nossa voz
Três foram as principais “reformas” levadas à cabo pelo governo golpista de Michel Temer por romperem substancialmente com o “pacto” da Nova República, celebrado na Constituição Federal de 1988. Mas os impactos são maiores para as mulheres.
A primeira reforma foi ratificada na Emenda Constitucional (EC) nº95, popularmente conhecida como “PEC do Teto dos Gastos”. Com essa emenda, o Estado brasileiro manterá congelado, por 20 anos, os 55% do orçamento dedicado à políticas públicas tais como educação, saúde, previdência, ciência e tecnologia, entre outros. Os outros 45% são para despesas financeiras, as quais poderão aumentar sem nenhum problema.
Com a EC95, o governo impacta a vida das mulheres duplamente. Pelo lado da oferta, os serviços públicos são os principais empregadores de mão de obra feminina.
Dessa forma, uma diminuição do peso e do tamanho do Estado tende a afetar a oferta de empregos e o nível de rendimentos dos quais dispõem as mulheres.
Por outro lado, são as mulheres quem mais demandam serviços e equipamentos públicos, principalmente os ligados à creche e as políticas públicas de combate à pobreza. As mulheres negras representam 68% do total de beneficiários do Programa Bolsa Família, por exemplo.
As mulheres também são as mais afetadas pela reforma trabalhista. A modalidade “trabalho intermitente”, aquele em que se recebe apenas pelas horas efetivamente trabalhadas, deve se concentrar mais nos setores de comércio e serviços, nos quais as mulheres representam a imensa maioria.
Além disso, a extensão do tempo dos contratos de tempo parcial e temporário e a regulamentação do “TeleTrabalho” também afetam mais as mulheres. Isso se dá pela forma como opera a “Divisão Sexual do Trabalho” na sociedade, relegando às mulheres toda a obrigação pelas atividades ligada ao trabalho doméstico e de cuidados, tendo que conciliá-los com as demais atividades no mercado de trabalho.
Por fim, se a Reforma da Previdência for aprovada como está tramitando, afetará de forma mais intensa a vida das mulheres.
Em primeiro lugar, ao aproximar as idades de aposentadoria para homens e mulheres, a Previdência Social deixa de reconhecer que as mulheres trabalham mais do que os homens - embora parte desse trabalho não seja assalariado, e, portanto, não tenha contribuição previdenciária. Dados do IBGE atestam que as mulheres trabalham – em média – 10h semanais a mais em relação aos homens no tempo de afazeres domésticos.
Além disso, o aumento de 15 para 25 anos de contribuição previdenciária praticamente inviabilizará a aposentadoria das mulheres, uma vez que a nossa participação no mercado de trabalho é muito mais descontínua.
Frequentemente temos que nos afastar do mercado de trabalho para cuidar de filhos, idosos e pessoas doentes. Isso por força da já mencionada “divisão sexual do trabalho” e também agravado pela retirada do Estado do papel de provedor de serviços públicos. Se essa regra estivesse vigente em 2015, apenas 56% das mulheres aposentadas nesse ano teriam gozado desse direito.
É nesse cenário de enfrentamento ao profundo ataque sobre os nossos direitos que nós mulheres levantamos mais uma vez a nossa voz. Nesse 8 de março sairemos mais uma vez as ruas para bradar: Pela vida das mulheres, democracia e soberania. Temer sai, aposentadoria fica!
Juliane Furno é doutoranda em Desenvolvimento Econômico na Unicamp, formadora da CUT e militante do Levante Popular da Juventude.
Edição: Daniela Stefano