Após 16 dias do desabamento do prédio Wilton Paes de Almeida, no centro de São Paulo, a Prefeitura acionou o Ministério Público pedindo providências com relação as famílias que permanecem acampadas no Largo do Paissandú.
O documento assinado pela secretária de Direitos Humanos e Cidadania, Eloísa de Sousa Arruda, alega que crianças e adolescentes se encontram em condições insalubres e degradantes e que há resistência por parte dos responsáveis em aceitar as ofertas do poder público, como aluguel social e acolhimento em albergues.
Em resposta ao ofício enviado no dia 7 de maio, o Ministério Público afirmou que enviará o Conselho Tutelar ao local e, caso constatadas condições degradantes, será aplicado o artigo 98, inciso 2 do Estatuto da Criança e do Adolescente que permite o afastamento dos menores do convívio dos pais.
A ameaça assustou Leofabia Rodrigues da Silva, 35 anos, que está acampada com os dois filhos, uma menina de 10 e um menino de 16 anos. “Eu não tenho nem palavras, porque, ave maria, se mexer com meus filhos eu não aguento. Nós somos mães, somos trabalhadoras, nós somos honestas, nossos filhos estão sendo bem cuidados, almoçam, jantam, tudo”, desabafa.
De acordo com Lucas Pereira da Silva, 30 anos, um dos coordenadores do acampamento, atualmente vivem nas barracas cerca de 180 crianças de 100 mães.
“Ninguém está aqui por brincadeira, isso foi uma tragédia o que aconteceu. Porque a Prefeitura quer tirar as crianças das mães? A Prefeitura poderia inverter essa história e dar moradia. Ele faz isso? Não. Cadê o Bruno Covas, você sabe onde ele está?”, protesta.
Jéssica Saturno dos Santos, de 19 anos, ficou sabendo pela reportagem a possibilidade de perder a guarda da filha de 3 meses por estar acampada na rua. Ela morava no prédio com o marido e acabou perdendo tudo com o incêndio. Jéssica disse que aguarda o auxílio-aluguel para tentar conseguir um lugar para morar.
“Não estava sabendo disso, não. Porque é por causa do governo que a gente está aqui. Se ele tivesse dado uma casa para casa um de nós, não estaríamos aqui passando essa humilhação. Pretendo esperar, porque se ele ajudar a gente com o bolsa-aluguel ou alguma coisa assim, dava pra alugar uma casa, correr atrás de um trabalho, colocar ela na creche e viver a vida como a gente pode.”
Já Deise da Silva Rodrigues tem 7 filhos, 5 deles estão vivendo nas barracas. A dona de casa considera uma covardia a ameaça de retirar a guarda das crianças. Ela conta que tem medo de ir para os albergues ofertados pela Prefeitura por serem espaços coletivos e ter filhos de ambos os sexos.
“Eu não fui para abrigo porque o que eles queriam levar é o Pedroso e lá é tudo misturado, homens e mulheres. E eu tenho menina, por isso, ficar num albergue misturado dá medo, eu não conheço quem está lá dentro, pode fazer algum mal com as minhas meninas e até com os meninos também", relata.
Janaína Gomes, 35 anos, está sentindo na pele o afastamento dos filhos de 12 e 4 anos desde o desabamento do prédio. Quando se viu desabrigada, ela optou por se separar deles e relata a saudade e a dor que é ficar distante do convívio diário.
“Estão com o pai dele, porque o pai dele falou que quando eu arrumar um lugar ele me devolve o menino. É muito difícil porque as vezes ele traz o menino aqui um pouquinho, aí eu fico com ele, mas ele já está desapegando de mim já. Está mais acostumado a ficar com o pai dele e tem medo de ficar aqui.”
As famílias têm contado com a colaboração de voluntários que vão até o Largo do Paissandú oferecer brincadeiras, contações de histórias e outras atividades recreativas para distrair os meninos e meninas que acabaram perdendo inclusive seus brinquedos com o incêndio. Procurada, a Prefeitura de São Paulo apenas enviou o ofício encaminhado ao Ministério Público, e preferiu não se pronunciar sobre o assunto.
Edição: Mauro Ramos