A repressão matou nas ruas do Rio de Janeiro um número não divulgado de pessoas
Dois documentários sobre fatos da história brasileira merecem ser vistos por quem deseja se lembrar de fatos importantes que se refletem hoje na política do país. Trata-se de “O Processo”, que mostra com detalhes o que representou a derrubada pelo Parlamento da presidenta eleita, Dilma Rousseff, e o outro “Marcos Medeiros – codinome vampiro”. São peças cinematográficas que terão vigência, digamos, daqui a cem anos ou mais.
“O Processo” deixa mais do que claro a farsa parlamentar, tanto na Câmara dos Deputados, como no Senado. O espectador pode relembrar, por exemplo, que um deputado ao votar em favor da derrubada da presidenta homenageou um militar que chefiou o famigerado DOI-CODI, Carlos Alberto Brilhante Ustra. É o mesmo Jair Bolsonaro que nesses dias comparou o que foi informado por um documento da CIA incriminando o general de plantão Ernesto Geisel com pais que batem no bumbum de crianças e depois se arrependem. E este parlamentar hoje aspira a Presidência da República e conta com o apoio de gente desinformada ou defensora dos métodos vigentes na longa noite escura que se abateu sobre o país de 1964 a 1985.
Já no documentário sobre o líder estudantil Marcos Medeiros, um filme que realmente ganha maior relevo depois que o Brasil tomou conhecimento do documento da CIA sobre Geisel. Marcos Medeiros foi um jovem combatente contra a ditadura empresarial militar, que desde cedo tomou posição em defesa dos interesses da maioria do povo brasileiro.
No documentário são mostradas imagens da crueldade com que agia a repressão das forças ditatoriais. Para quem não se lembra ou está desinformado, naqueles anos 60, alguns anos depois da derrubada do presidente constitucional João Goulart, o povo no Rio de Janeiro e em outras cidades brasileiras foi às ruas manifestar o repúdio aos generais de plantão, naquele momento tendo a frente Artur da Costa e Silva, o militar que substituiu o primeiro golpista, Humberto de Alencar Castelo Branco, que ocupou de fato o governo brasileiro.
A repressão matou nas ruas do Rio de Janeiro um número não divulgado de pessoas não só que se manifestavam contra o arbítrio ou que circulavam nas ruas. Embora tenha sido divulgado que morreram quatro pessoas, o número pode ter sido maior, porque naquele período, nem todas as informações eram divulgadas.
O documentário sobre Marcos Medeiros tem o mérito de lembrar de fatos de responsabilidade dos detentores do poder discricionário. E é relevante também relembrar que depois de Costa e Silva, o Brasil foi governado de fato, inicialmente por uma junta militar e posteriormente por Médici, que ganhava o título de maior assassino de todos, mas que hoje se sabe que foi acompanhado do sucessor Geisel e ainda João Batista Figueiredo, o último general de plantão, todos eles cultuados por Jair Bolsonaro.
Na segunda parte do documentário que relembra a história do bravo brasileiro Marcos Medeiros, os espectadores são informados sobre as incursões do líder estudantil no cinema, tanto em Paris, onde se viu obrigado a se exilar para evitar ser punido pela repressão, em que trabalhou com outro ilustre brasileiro, Glauber Rocha, como posteriormente, no governo de Leonel Brizola, onde teve participação no espaço das artes, então sob o comando de Geraldo Melo Mourão. Em suma, um documentário que deve ser assistido sobretudo pelas novas gerações, da mesma forma que “O Processo”, com fatos mais recentes mas que foram, como se sabe hoje, manipulados pela mídia comercial que apoiou o golpe parlamentar que colocou no poder Michel Temer para executar um projeto denominado “ponte para o futuro”, que levou o país em dois anos a recuar mais de cem.
É muito importante que brasileiros e brasileiras sejam informados sobre fatos da história do país, inclusive para não serem objeto da manipulação da informação. É também importante comparar os tempos atuais com os daquela época, sobretudo os dois tipos de golpes ocorridos, o de abril de 64 e, o mais recente, o iniciado em abril de 2016 e posteriormente confirmado no final de agosto daquele mesmo ano.
É preciso também que a opinião pública seja informada não só sobre o documento da CIA mostrando como agia o general de plantão Ernesto Geisel e outros que ocuparam o posto, como um documento do Departamento de Estado norte-americano sobre a participação do empresário midiático Roberto Marinho com livre trânsito entre os golpistas. Revela o documento, não só o livre trânsito, como também, segundo o então embaixador dos Estados Unidos, Lincoln Gordon, o fato do empresário midiático apoiador do golpe de então ter sido informante da embaixada norte-americana. É necessário saber o motivo pelo qual essa informação não foi divulgada pela mídia comercial, como, por exemplo, foi a denúncia sobre o general de plantão Ernesto Geisel.
Em suma, é hora do país inteiro conhecer, sem nenhum tipo de censura, os acontecimentos históricos. “O Processo” e “Marcos Medeiros – codinome vampiro” cumprem esse objetivo e por isso não podem deixar de ser vistos por quem quer se informar sem subterfúgios.
Edição: Jaqueline Deister