O trabalho infantil voltou a crescer nos últimos três anos, depois de mais de uma década em queda. Os dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), registram contínua redução do número de crianças e adolescentes trabalhando no país entre 2005 e 2014. Em 2015, porém, o contingente voltou a crescer, alcançando 2,7 milhões.
Neste Dia Mundial e Nacional de Combate ao Trabalho Infantil, celebrado no 12 de junho, especialistas alertam para a ameaça de que ainda mais crianças e adolescentes integrem essa estatística, especialmente levando em conta os desmontes de direitos trabalhistas em curso e os cortes nos orçamentos de programas sociais.
É o que aponta Guilherme Feliciano, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). Para ele, um dos principais problemas são os cortes no orçamento dos auditores do trabalho.
"O investimento na área de fiscalização há algum tempo deixou de ser uma prioridade pelo governo federal. Hoje, você tem uma estagnação de anos no quadro de auditores fiscais do trabalho, que, em relação ao trabalho infantil, tem uma função de ser o primeiro elo no processo de erradicação desse fenômeno. Eles estão em situação emergencial, estão comprometendo políticas públicas caras à própria agenda do trabalho recente, por conta desse baixo efetivo", afirmou.
Feliciano explica que esses auditores são responsáveis por fiscalizar a necessidade de implementação do Programa de Erradicação do Trabalho Escravo (Peti), que integra o Sistema Único de Assistência Social (Suas), do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). De acordo com Felipe Tau, articulador da Rede Peteca, projeto da ONG Cidade Aprendiz para combater o trabalho infantil, nos últimos anos vêm ocorrendo cortes na própria bolsa do Peti, que funciona por meio de transferência de renda.
"O orçamento do programa vem caindo, e nosso desafio agora é acompanhar como os recursos oferecidos aos mil municípios atendidos pelo Peti, escolhidos justamente por terem uma alta incidência de trabalho infantil, estão sendo utilizados", pontuou.
Questionado sobre o Orçamento Federal destinado ao Peti nos últimos anos, o MDS argumentou apenas que muitas das famílias que inicialmente eram atendidas pelo programa foram transferidas para o Programa Bolsa Família na última década, por entrarem no perfil de renda do programa. "Em 2016, uma média de 118 mil famílias com crianças e adolescentes identificadas em situação de trabalho infantil, com perfil de renda para o Programa Bolsa Família, receberam R$ 358,6 milhões em benefícios".
Retrocessos
Segundo Guilherme Feliciano, outra mudança central que ameaça o combate ao trabalho infantil foi a aprovação da Reforma Trabalhista, que entrou em vigor em novembro do ano passado.
Felipe Tau destaca que a própria Rede Peteca, em parceria com outras organizações da sociedade civil, engajou-se em uma campanha para controlar as mudanças referentes ao trabalho infantil durante a elaboração da Reforma Trabalhista.
"Fizemos uma campanha no ano passado para impedir que a Lei do Aprendiz fosse descaracterizada na esteira das outras mudanças da reforma, a ponto de ser completamente ineficiente e a gente acabar com esse instrumento. Então, de maneira geral, a reforma foi resguardada de um ataque mais forte ao trabalho infantil", afirmou.
No entanto, ainda há pelo menos 18 projetos de lei em tramitação que propõem a redução da idade mínima para trabalhar com carteira assinada, de acordo com um levantamento do Caderno Legislativo da Criança e do Adolescente de 2016, elaborado pela fundação Abrinq.
Edição: Diego Sartorato