Apesar da pressão para que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acelere o processo de julgamento de um possível pedido de impugnação da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Justiça Eleitoral tem prazos legais a cumprir e, em última instância, a palavra final é do Supremo Tribunal Federal (STF). Nas eleições de 2016, 145 candidatos concorreram com registros sob júdice e, finalizado o processo eleitoral, 70% deles conseguiram reverter o indeferimento das candidaturas.
O PT registra a candidatura de Lula nesta quarta-feira (15) no TSE, realizando um grande ato político em Brasília. Três colunas reuniram 5 mil integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST), que se encontraram na capital federal com membros de diversos movimentos sociais e lideranças políticas em defesa da liberdade do ex-presidente e do seu direito de se candidatar. A expectativa é reunir até 30 mil apoiadores de Lula. Na tentativa de sensibilizar o Judiciário, sete militantes estão em greve de fome há 15 dias.
Para o advogado Fernando Amaral, especialista em Direito Eleitoral, a previsão do trânsito em julgado e a presunção de inocência, previstos na Constituição Federal, têm prevalência sobre os dispositivos contidos na Lei da Ficha Limpa, principalmente porque os recursos relativos à condenação no caso do triplex do Guarujá (SP) ainda não se esgotaram. “O fato que me parece evidente, no caso do presidente Lula e no caso das outras eleições, é que a cláusula constitucional, que define a perda dos direitos políticos e impede candidaturas, é uma cláusula que exige o trânsito da sentença em julgado. Não é o caso do presidente Lula”, afirma.
Segundo Amaral, ao mesmo tempo que há o entendimento de que a decisão em segundo grau torna o candidato inelegível por oito anos, também é verdade que a falta do trânsito em julgado abre a possibilidade de reversão da situação jurídica. “Se é verdade que a Justiça Eleitoral julgou e aplicou a Lei da Ficha Limpa, também existe um ou outro precedente”, diz. “Vamos supor que o processo do presidente Lula fosse julgado por algumas das instâncias nesse momento e tivesse algum tipo de reversão, isso não é impossível de acontecer. O que a gente vai fazer? Nós vamos tirar um candidato escolhido com base em quê?”, indaga.
Segundo Amaral, a possibilidade de a Justiça Eleitoral indeferir de ofício ou mesmo rapidamente o pedido de registro da candidatura de Lula irá macular o processo eleitoral. “O Judiciário tem que ter muita responsabilidade no julgamento desse pedido de registro do presidente Lula porque não pode nesse caso ter um tratamento absolutamente diverso da tradição da jurisprudência que existe”, afirma ao defender que a Justiça Eleitoral, inclusive, leve em consideração as provas de inocência apresentadas pelos advogados de Lula em relação ao caso triplex. “Qualquer possibilidade de fazer de ofício, como acelerar, me parece absolutamente arriscado para o processo democrático”, completa.
Ao fazer críticas ao ativismo do Judiciário, o advogado vai além e defende que soberania popular, uma vez que Lula está em primeiro lugar disparado nas pesquisas de intenções de votos, seja levada em conta. “Temos um problema objetivo no processo judicial brasileiro, que é esse ativismo que absolutamente notável nos últimos anos. O Judiciário, infelizmente, tem se posicionado em vários momentos, antes do caso concreto chegar para análise dos juízes, dos ministros, isso além de ser perigoso, e na teoria do bom direito fere a isonomia dos juízes”, afirma.
“Quem tem que decidir quem vai governar é o povo, aquele que a Constituição determina quem vai escolher quem vai governar pelos próximos anos é o voto. Sem permitir esse debate, fica evidente que o presidente foi tolhido no direito de postular a sua candidatura”, acrescenta. Fernando Amaral enfatiza ainda que o STF tem o dever de enfrentar essa questão “independente da questão jurídica”. “Se o presidente Lula vai para o segundo turno é um significativo importante [...], não dá pra dizer que a população não sabe o que aconteceu, a população fez o seu juízo e aí a gente não vai discutir em nenhum momento a soberania popular?”, questiona.
Por mais que o TSE seja célere, conforme parecer jurídico encomendado pelo PT, mesmo cumprindo os prazos mínimos, a decisão mais rápida possível ocorreria na metade da campanha, cerca de 25 dias após o registro.
Os prefeitos que estavam sob júdice, no último pleito foram eleitos sem que sequer houvesse decisão sobre suas candidaturas. Houve casos em que a Corte demorou 150 dias para apreciar. Com base nesses dados, o PT pretende levar a candidatura do ex-presidente Lula adiante, inclusive porque ele não está com seus direitos políticos cassados, o que é garantido pela Constituição. Vale lembrar, que mesmo durante o processo de julgamento da impugnação, ele pode fazer campanha e, a partir do registro, Lula pode participar de debates e conceder entrevistas.
Caso o TSE decida barrar Lula com base na Lei da Ficha Limpa, o petista ainda tem o direito de recorrer ao STF, mas o partido terá uma encruzilhada pela frente, pois a legislação eleitoral determina o dia 17 de setembro, como o prazo final para a troca de candidatos à Presidência. Até essa data o partido vai ter que escolher entre substituir Lula ou recorrer. Na segunda hipótese, existe chance legal de o nome do petista, líder nas pesquisas, figurar nas urnas eletrônicas, mesmo preso. Em caso de vitória, um dispositivo previsto na Ficha Limpa assegura esse direito até a diplomação do candidato eleito. E essa deve ser a opção de Lula e do PT.
Edição: Rafael Tatemoto