Os municípios são Viamão, Alvorada, Cachoeirinha, Gravataí, Esteio, Sapucaia, Eldorado e Guaíba. Agora, Canoas está prestes a adotar a mesma providência, também induzido pela própria Corsan, a Companhia Riograndense de Saneamento, que deveria executar o trabalho.
Tentando barrar a proposta do governo Sartori de criar PPPs, as tais Parcerias Público Privadas, para tratar os esgotos da região Metropolitana, a oposição da Câmara de Vereadores de Canoas apresentou requerimento à mesa da casa, propondo que se aguarde a conclusão das análises do Ministério Público de Contas e do Ministério Público Federal. Defende que só depois do parecer dos dois MPs parta-se para a votação da proposta que permite a entrega do esgotamento sanitário. A informação é da vereadora Maria Eunice Wolf (PT) que protocolou a entrega e espera a aprovação do requerimento.
Só a Capital escapou
O deputado estadual Nelsinho Metalúrgico (PT), também de Canoas, acha que se tornou prioridade para o governo Sartori entregar “o filé do saneamento da região a empresas amigas”. Argumenta que a Corsan já investiu cerca de R$ 700 milhões na região, dinheiro liberado pelo PAC Saneamento do governo federal. Realizou obras de infraestrutura como a construção de redes de coleta e as ETEs, as estações de tratamento de esgoto. E, agora, vai deixar para o setor privado a parte menos custosa e mais rentável. Ou seja, a finalização da obra e a cobrança da taxa.
A PPP seria por 30 anos. A taxa, exigida dos consumidores, equivaleria a 70% daquela cobrada pela água. A conta será bancada pela população. Na região metropolitana, ficaria de fora das PPPs somente Porto Alegre. Na Capital, houve uma tentativa no ano passado. Porém, a PPP proposta para o DMAE pelo prefeito Nelson Marchezan Jr., do PSDB, foi negada pelos vereadores.
Privatização mascarada
A denúncia partiu da direção do Sindiágua, que representa os trabalhadores do setor de água e esgoto no estado. Segundo Rogério Ferraz, diretor do sindicato, trata-se de uma política de privatização mascarada com o conceito de parceria público privada. Na maioria dos municípios da área, as obras estavam praticamente prontas.
Como exemplo cita Esteio, onde já é coletado 95% do esgoto residencial. Além disso, a Fepam havia exigido a construção de emissário que segue até o rio dos Sinos. Não permitiu que os efluentes, embora tratados, fossem despejados num afluente do Sinos. Mais uma obra que o administrador privado receberá pronta.
Obra dividida
O sindicalista explica ainda que somente em Canoas estava previsto aporte de R$ 216 milhões pelo PAC2 no Orçamento Geral da União. Porém, a prefeitura preferiu dividir a obra em três etapas, sendo a primeira delas a construção da estação de tratamento. Seu custo foi de R$ 66 milhões. Haveria mais duas fases envolvendo a rede de coleta cloacal de custo calculado em R$ 153 milhões.
A Corsan fez o projeto para a primeira etapa e recebeu os recursos, mas não teria concluído – segundo ele – os demais projetos. Com o fim do prazo dado, o Ministério das Cidades recolheu os valores. Na sua interpretação, assim foi feito para facilitar a adoção da PPP para concluir a obra.
A oposição suspeita que, com a aceitação das PPPs, aconteceria o aumento das tarifas arcadas pela população. A Corsan aposta que não haverá reajuste. A companhia tem defendido a criação das PPPs, alegando falta de recursos para investimentos. Sustenta ainda que o processo foi iniciado ainda no governo anterior e que não se trata de discurso ideológico, mas de uma necessidade administrativa. Trata as PPPs como apenas uma alternativa de financiamento mais barato.
Brasil anda na contramão na história
Foto: Walter Campanato
Neste século, foram registrados 267 casos de “remunicipalização”, ou reestatização de sistemas de água e esgoto. No ano 2000, só se conheciam três casos do tipo. É o que aponta mapeamento realizado por onze organizações majoritariamente europeias e publicado pelo site da BBC Brasil. O que mostra que o país anda na contramão da história nessa questão.
A pesquisa assinala que a reversão vem sendo impulsionada por um leque de problemas reincidentes, entre eles tarifas altas, serviços ineficientes e baixo investimento. O estudo detalha experiências de cidades que recorreram a privatizações de seus sistemas de água e saneamento nas últimas décadas, mas decidiram voltar atrás – uma longa lista que inclui lugares como Berlim, Paris, Budapeste, Bamako (Mali), Buenos Aires, Maputo (Moçambique) e La Paz.
Dezoito estados
A tendência, vista com força sobretudo na Europa, vai no caminho contrário ao movimento que vem sendo feito no Brasil para promover a concessão de sistemas de esgoto para a iniciativa privada. O BNDES tem incentivado a atuação do setor privado na área de saneamento, e, no fim do ano passado, lançou edital visando a privatização de empresas estatais, a concessão de serviços ou a criação de parcerias público privadas.
À época, o banco anunciou que 18 estados haviam decidido aderir ao Programa de Concessão de Companhias de Água e Esgoto – do Acre a Santa Catarina.
Crise financeira
O Rio de Janeiro foi o primeiro a se posicionar pela privatização. A venda da Companhia Estadual de Água e Esgoto (Cedae) é uma das condições impostas pelo governo federal para o pacote de socorro à crise financeira do Estado.
O “mapa das remunicipalizações” foi traçado em parceria com o Observatório Corporativo Europeu em 2007. A análise das informações coletadas ao longo dos anos resultou no estudo. Entre 2000 e 2015 foram identificados 235 casos de remunicipalização de sistemas de água, abrangendo 37 países e afetando mais de 100 milhões de pessoas. De 2015 a 2017, foram listados mais 32 casos.
Novas áreas
Noventa por cento dos sistemas de água mundiais ainda são de gestão pública. Mas as privatizações, empurradas por crises fiscais e a adoção da chamada austeridade, seguem como forte tendência.
O mesmo grupo de pesquisadores expandiu seu estudo para outras seis áreas buscando observar os sinais de reestatização. Então, passou a monitorar os setores de energia elétrica, coleta de lixo, transporte, educação, saúde e serviços sociais. Encontrou 835 casos de remunicipalização entre 2000 e 2017. Mas a grande maioria das reversões – 693 – aconteceu entre 2009 e 2017, indicando um aumento na tendência.