A aguçada sensibilidade das brasileiras pôs à mesa jarras de suco antifascista
O cenário político da última semana ganhou um ingrediente inesperado, impactante e crescente: um movimento nacional e multifacetado de repúdio aberto ao fascismo e de defesa explícita da democracia.
Centrado na rejeição à candidatura de Jair Messias, o movimento é suprapartidário e alcança pessoas e organizações para muito além das campanhas eleitorais. A partir do chamado das brasileiras que se espraiou por manifestos, entrevistas, debates e desembocou na organização de atos públicos, entre eles os convocados para o próximo sábado (29), em todo o país e em muitas cidades pelo mundo, serão um marco decisivo.
Entusiasmado com essa movimentação real da sociedade brasileira, eu conversava com um grande amigo, experiente e arguto analista, que me relatou uma imagem que havia desenvolvido em um encontro com dirigentes sindicais. Discutia-se o que seria o “bolsonarismo”, esse fenômeno do atraso selvagem que provocou reações do porte do #EleNão, dos manifestos de intelectuais e artistas e um pronunciamento sem meias palavras das Centrais Sindicais unidas.
Para meu amigo, o “bolsonarismo” é como uma indigesta vitamina de frutas ruins, batida no liquidificador do cinismo, oportunismo e demofobia e querendo ter por líquido um povo que viraria suco. As frutas são quatro: i) a exploração despolitizada e sensacionalista de um desejo de Ordem; ii) o uso seletivo da bandeira Anticorrupção; iii) o reforço reacionário do Moralismo; iv) a propaganda enviesada do Antipetismo.
O motor das redes sociais, dos grandes meios de comunicação, de entidades e organizações empresariais e da própria campanha eleitoral do ex-capitão aciona um liquidificador desenhado com esmero pela elite brasileira. Pretende-se ocultar sob essa pasta uma diretriz econômica e social que faz da “Ponte para o Futuro”, ora em execução, um oásis de vida boa para os brasileiros.
Quem se der ao trabalho e ao desprazer de ler o programa do frentista do “posto Ipiranga”, escrito por Paulo Guedes com requintes de crueldade, verá que ali se propõe o arrocho brutal, a extinção generalizada de direitos, a transformação do Estado em mero aparato de controle e repressão e o desmonte da Nação. Como esse pudim de horrores não ganharia um voto da esmagadora maioria dos eleitores, a vitamina é ofertada como cobertura e disfarce.
A partir do despertar dos democratas e antifascistas, que vem dando corpo e alma à defesa da civilização em contraponto à barbárie, torna-se muito mais fácil para as campanhas eleitorais que compartilham dos valores do Progresso afirmar o que propõem como alternativa à gosma reacionária e de exploração dos trabalhadores.
Independentemente de suas diferenças, que são reais, todas podem vocalizar uma diretriz comum, de retomada do crescimento econômico e da redistribuição de renda; de combate às múltiplas desigualdades sociais com que convivemos; de viabilização de um Estado prestador de bons serviços e peça decisiva no investimento, na ampliação do consumo de massas e na recuperação da produção interna. Todas podem jogar fora a vitamina do Jair e oferecer bebida muito mais palatável e saudável aos eleitores.
Pelas múltiplas vias abertas pelo #EleNão é possível e necessário conversar com os brasileiros não só sobre a parte mais visível do fascismo – a negação do Outro, o machismo, o autoritarismo, a pregação da violência, a falsa religiosidade, a recusa à democracia – mas principalmente sobre o que pretendem as elites que bolaram a vitamina: muito lucro com pouco salário, emprego e serviços públicos. É uma oportunidade ímpar para, por exemplo, divulgar-se esbulhos, como o da cobrança de 20% de imposto de renda dos que ganham muito menos para garantir que os que ganham muito mais paguem ainda menos, como quer seu Guedes, o gerente do “posto”.
A aguçada sensibilidade das brasileiras pôs à mesa uma alternativa orgânica, jarras e jarras de suco antifascista. Personalidades das mais diversas orientações e entidades dos mais diversos setores já se lançam na certificação da qualidade do néctar democrático. É a hora dos eleitores, afirmando coletivamente que #EleNão, dizerem, pelo voto, que a bebida do momento é #NósSim.
Edição: Pedro Ribeiro Nogueira