Se consolidada, a chamada frente pela democracia, reunindo democratas e forças de diversos partidos em torno da candidatura de Fernando Haddad(PT) a presidente, pode tirar a centro-esquerda do "canto do ringue" contra Jair Bolsonaro (PSL). "Pelos movimentos que temos visto, há possibilidade de isso acontecer. É um clamor, porque muitos estão dizendo que é a hora de defender a democracia. Isso é o mais estratégico agora", diz o sociólogo Cândido Grzybowski, do Ibase.
Os partidos PSB e Psol já decidiram pelo apoio à candidatura de Haddad. Ontem (10), foi a vez do PDTanunciar o mesmo, assim como as centrais sindicais. Para Grzybowski, se esse movimento avançar, são reais as possibilidade de Haddad e essas forças ganharem a eleição. "Mas tem que elaborar o discurso também e dar um salto de qualidade nessa questão", alerta.
Grzybowski lembra que, de um total de 147 milhões de brasileiros aptos a votar, 30 milhões de eleitores, ou 20,32%, se abstiveram. Dos 117 milhões que votaram, cerca de 3 milhões votaram em branco e 7,2 milhões anularam o voto. No total, brancos, nulos e abstenções somaram 29% do total de eleitores do país.
Na opinião do sociólogo, mobilizar esse contingente de eleitores pode ser decisivo, inclusive porque Bolsonaro não deve conseguir movimentar parcela significativa deles. Ele observa que, pela rejeição que tem, o candidato poder ter chegado próximo ao seu teto, embora ainda tenha algum espaço para crescer.
"Por outro lado, as estratégias de Bolsonaro vão continuar mais fortes do que nunca nas redes sociais", avalia. "E não se trata de inverter o voto desses fanáticos (apoiadores do candidato)– pois tornou-se mesmo um movimento fanático, há violência por toda parte –, mas de tentar mobilizar os quase 30% que não foram votar, que votaram nulo ou em branco. Podemos conseguir talvez 10%."
O professor destaca o papel da chamada "grande imprensa" no atual processo. "A mídia entra forjando o antipetismo, mas não promovendo Bolsonaro tão claramente. Porém, essa mídia foi tolerante com ele."
Para o analista, o candidato do PSL soube usar melhor as novas mídias e redes do que qualquer outro candidato e essa é uma variável fundamental.
Hoje, há analistas e jornalistas comparando o atual processo eleitoral brasileiro com 1989, quando Fernando Collor foi ao segundo turno contra Luiz Inácio Lula da Silva e venceu, entre outros fatores ajudado por manipulações de informações e o episódio Abílio Diniz.
Em 1989, havia a questão de corrupção, e Collor se apresentou como alguém que ia combater esse mal, sendo o "caçador da Marajás". O termo foi usado por Bolsonaro nesta terça-feira (9). Ele prometeu "acabar com a farra dos marajás".
"Acontece que Collor não tinha essa postura de feições fascistas de Bolsonaro. Podia ser um oportunista, enquanto Bolsonaro era folclórico, mas nunca escondeu seu autoritarismo, sua visão fascista, misógina, racista, contra direitos. Collor não tinha um discurso dessa ordem", diz Grzybowski.
Entre as semelhanças, estão "os interesses por trás" de Collor e Bolsonaro. "Os dois são instrumentos." Em 1989, estávamos no fim da então "década perdida", já no começo da globalização e de expansão da agenda neoliberal.
"Collor foi visto pelo chamado mercado como uma alternativa naquele quadro. Está sendo a mesma coisa agora. Eles embarcam em qualquer coisa que evite um Estado um pouco mais regulador ou que se volta ao social. Mas, nesse momento, o candidato tem feição fascista, o que é uma diferença importante", aponta o sociólogo.
Como Collor, Bolsonaro, ou os responsáveis por sua campanha, soube captar o sentimento popular que começou com a insatisfação manifestada em 2013, nos movimentos incorporados pela direita. Para Grzybowski, "a esquerda perdeu a oportunidade de entender aquele momento".
Hoje, o sentimento popular clama por emprego e renda e tem sonhos frustrados. São 13 milhões de desempregados. "O acesso à universidade foi real, mas as pessoas estão precisando de trabalho. E agora Bolsonaro representa uma saída, mas uma 'saída sem saída'. O que ele diz? Esse Paulo Guedes (coordenador da área econômica de Bolsonaro) é do mais radical neoliberalismo."
Edição: RBA