Alvo de destaque na cartilha neoliberal, o pré-sal brasileiro está na mira de parlamentares e multinacionais por meio de diferentes iniciativas. A bola da vez é a chamada cessão onerosa, exposta no Projeto de Lei da Câmara (PLC 78/18). A proposta autoriza a Petrobras a transferir para empresas privadas até 70% dos direitos de exploração do petróleo na camada do pré-sal.
Já aprovada pela Câmara, a medida não foi votada no Senado esta semana por falta de acordo entre as equipes econômicas de Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PSL), presidente recém-eleito.
Os dois discutem atualmente o formato para a distribuição dos recursos, que são alvo também do interesse de estados e municípios. Em meio à crise fiscal, prefeitos e governadores reivindicam participação na divisão do montante como forma de melhorar o fluxo de caixa das suas respectivas gestões.
A cessão onerosa resulta de um acordo feito em 2010 entre a União e a Petrobras para permitir a exploração de 5 bilhões de barris em áreas do pré-sal na Bacia de Santos (SP).
Além da transferência de parte dos direitos de exploração, o PLC 78/18 cria normas para leiloar a produção excedente do pré-sal. A proposta não prevê a divisão dos recursos com municípios e estados, por isso enfrenta resistência entre os entes federados.
O futuro ministro da economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, tenta atualmente costurar um acordo para promover um megaleilão do pré-sal sem que seja preciso submeter a medida à avaliação do Congresso Nacional.
Ele conversa atualmente com o Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a proposta, e trabalha para articular um contrato que fixe novas normas para a cessão onerosa, de forma a facilitar a atuação das petrolíferas privadas.
A disputa pelo pré-sal envolve diferentes atores, com destaque para as multinacionais, interessadas na exploração do excedente, cujo montante chega a 15 bilhões de barris que podem ser explorados ao longo de 40 anos.
A venda do excedente é fortemente criticada por organizações populares, como a Federação Única dos Petroleiros (FUP). O diretor de assuntos institucionais da entidade, Deyvid Bacelar, destaca que, ao longo dos quase dois anos de governo Temer, foram realizados quatro leilões, que deixaram a Petrobras com apenas 25% da exploração do pré-sal. O restante está nas mãos de petrolíferas estrangeiras.
O dirigente ressalta que a entrega do excedente prejudicará não só a soberania nacional, mas a geração de emprego e economia.
“Essas gigantes virão pra cá com encomendas de plataformas, sondas e navios no exterior, ou seja, esses equipamentos não serão produzidos no Brasil. Consequentemente não irão gerar mão de obra e renda aqui no país, e sim lá fora. Além disso, as riquezas do petróleo do pré-sal e dessa área, que é altamente produtiva, também vão pra outros países”.
Geopolítica
A geopolítica mundial é um elemento central nos debates relacionados ao pré-sal. Bacelar chama atenção para os movimentos recentes de aproximação do Brasil aos Estados Unidos, que estão interessados na busca de novas reservas de petróleo.
O produto é chamado popularmente de “ouro negro” por conta do alto valor comercial e energético. O petróleo é utilizado não só como combustível, mas também como matéria-prima para fabricação de outros produtos, como parafina e óleos de grande valor para a indústria automotiva, uma das mais poderosas do mundo.
Nesse cenário, África, Oriente Médio e América Latina têm sido os alvos mais visados porque possuem as melhores reservas. Para os Estados Unidos, responsáveis por cerca de 25% de todo o petróleo consumido no planeta, o Brasil é estratégico por conta do volume disponível nas reservas.
“A gente tem aqui uma reserva que é exclusivamente nossa. Ela é gigantesca. Ao todo, o pré-sal tem mais de 176 bilhões de barris, e essas áreas específicas da cessão onerosa são algo em torno de 20 bilhões. Não é um número pequeno”, explica Bacelar.
O economista Cloviomar Cararine, especialista no setor, acrescenta que o petróleo brasileiro tem ainda outras vantagens para os estrangeiros. Uma delas é o baixo custo, uma vez que a Petrobras fez investimentos volumosos no setor, que utiliza alta tecnologia e já domina o passo a passo da exploração. A outra é o baixo risco, diretamente associado a tais fatores.
Por conta disso, os diferentes projetos de lei e medidas do Poder Executivo que abrem a exploração do petróleo brasileiro para o mercado contam com um forte lobby de multinacionais.
“São reservas já descobertas, já testadas, então, é ganho com certeza, não tem nenhum risco pra quem entrar. É um negócio melhor ainda do que os outros [no mundo]. É colocar o dinheiro no leilão e depois só adquirir os lucros”, critica Cararine.
Edição: Mauro Ramos