Vários grupos de mulheres vêm fortalecendo o movimento percussivo na cidade, reunindo-se em praças, bairros e universidades para aprender instrumentos e balançar contra as estruturas do patriarcado. A invisibilidade das mulheres na cultura e, principalmente, nos instrumentos de percussão, provocou as integrantes a se organizarem, criarem letras de músicas, fazerem instrumentos e repassar o conhecimento para outras manas.
O grupo As Calungas existe desde 2012 e é o precursor deste fenômeno contemporâneo na cena da cidade. Elas contam que começaram tocando nos blocos da cidade, e na época, estavam com 12 integrantes, que tinham um propósito musical e cultural. "Nós começamos a criar o nosso próprio bloco e aumentar o grupo convidando mais mulheres e ensinando-as a tocar. Hoje temos oito oficineiras do grupo oficial e nos apresentamos o ano todo, artisticamente, inclusive com cachês, que revertemos para o nosso bloco, que é independente", relata Priscilla Fernandes, uma das integrantes principais. O grupo conta com cerca de 130 mulheres inscritas nas oficinas que acontecem todo domingo até fevereiro, trazendo diversos ritmos nordestinos. Integrantes oficiais das Calungas
Priscilla acrescenta que há quatro anos fazem homenagem a uma mestra, e esse ano será Zabé da Loca. "A intenção não é política e sim musical, mas não tem como fugir disso. Somos o primeiro grupo só de mulheres da cidade com oficinas de batuque, onde a gente se fortalece política e culturalmente", pontua ela. "O foco das Calungas é o empoderamento das mulheres na percussão mesmo, porque historicamente eram só os homens que tocavam, e ainda existe muito preconceito hoje em dia."As Calungas ensaiam na UFPB
As batuqueiras, no geral, integram vários grupos e transitam por várias propostas. Nara Limeira, ativista cultural e percussionista, fez recentemente convite para formar mais um grupo na cidade. "A ideia é de que o grupo venha somar com todos os que já existem para ocupar as ruas e praças, com calendário fixo, fazendo intervenção feminista. Nosso sonho é ter um grupo em que a gente possa desfazer ao máximo as hierarquias e as pessoas venham como colaboradoras, ensinando e aprendendo de forma horizontal." O nome ainda está sendo definido, mas muitas mulheres já estão chegando junto, demonstrando a efervescência deste movimento local.Cortejo do bloco das Calungas
Formado por poetisas e percussionistas desde 2012, o grupo Ajamulher não se denomina batuqueiro. Segundo elas, é um grupo performático que executa cantigas, coco, ijexás e cirandas populares, e que mescla varias expressões artísticas, corporais e do teatro. "Somos o único grupo de mulheres com essa característica aqui no estado da Paraíba, trazendo a ciranda, o coco de roda, a poesia e os elementos do teatro, tocando alfaia, ganzá, agogô e berimbau", conta Lisiane Saraiva, integrante e produtora do Ajamulher . O grupo tem ensaio fixo todos os sábados e recentemente recebeu um prêmio federal de cultura popular. Também foi contemplado pela Funjope com um projeto a ser desenvolvido nas escolas sobre A Mulher Negra.Grupo Ajamulher
Ajamulher 2013
Ajamulher se apresenta na Usina Cultural Energisa em 2017
O Coco das Manas surgiu apos a ocupação do Minc em 2016. Tornou-se primeiro um coletivo (elas chamam coletiva) e depois de duas festas decidiram formar o grupo onde cantavam paródias feministas, e hoje, tem repertório totalmente autoral. São mulheres jovens, a maioria se identifica como negra, feministas, e de diversas identidades de gênero - algo muito presente nas letras das músicas. "O viés do grupo é político e cultural, e a gente se apresenta com cachê, mas também fazemos intervenções e participações culturais gratuitas", conta Cintia Luz, integrante e vocalista do grupo.Coco das Manas no Teatro
Na Parada LGBT de Conde 2017
Outro grupo extremamente importante é o Baque Mulher, movimento que surgiu em 2008 no Recife, através da mestra Joana Cavalcante, e se espalhou por várias partes do Brasil - hoje existem 23 células em todo o país. "Quando iniciou em 2008, as mulheres do Baque não tinham consciência de que estavam praticando o feminismo", conta Mauriene Freitas, participante do grupo. A organização chegou em João Pessoa em março de 2017 através de Dani e Carol. Mauriene explica que o Baque é uma brincadeira de Nação, que traz a discussão do papel da mulher na cultura negra e fala, também, das comunidades, da pobreza, da diversidade e da cultura dos Orixás."Sempre há rodas de conversas sobre a questão feminina e os problemas enfrentados pelas mulheres; estivemos presentes no 8M, em protestos junto com os movimentos sociais, e agora, então, com esse novo presidente, a reforma da previdência e o assassinato de Marielle Franco, nós vamos às ruas protestar sempre", afirma ela.Roda de conversa do Baque Mulher
Nesta diversidade de atuações, não podemos deixar de fora a Batucada da Marcha Mundial de Mulheres, que traz, através de vários ritmos, como o funk, o samba-reggae e o maracatu, letras de músicas e palavras de ordem que representam a luta das mulheres. Os instrumentos são fabricados por elas, com material reciclado, como tambores de plásticos, latas, garrafas e cabos de vassoura. Segundo Danielle Alexa, a batucada representa uma ação política fundamental da Marcha, que é a de levar o feminismo para as ruas e denunciar os males de uma sociedade patriarcal e capitalista. "A gente canta e toca de modo irreverente, engajado e que traz unidade, força e alegria para as militantes do movimento e para as mulheres que se juntam nos espaços por onde a batucada passa". Ela destaca que qualquer mulher pode se juntar para tocar, que tem repertório e instrumentos, mas nos espaços sempre há muitas mulheres querendo participar e a ideia é agregar o máximo de mulheres.Batucada da MMM
Ao centro, Paula Adissi, integrante da Batucada
Edição: Heloisa de Sousa