O jovem Germán Cohen, de 33 anos, aproximou-se de uma manifestação de opositores ao governo de Nicolás Maduro e gritou a plenos pulmões que era um Tupamaro (integrante do movimento político chavista), contrário às tentativas de golpe na Venezuela. Essa atitude bastou para despertar a fúria dos manifestantes. Cohen foi morto a tiros e teve o corpo queimado ali mesmo, enquanto agonizava. Ele não pertencia a nenhuma organização e sofria transtornos mentais.
O assassinato aconteceu no dia 23 de janeiro, na cidade de Mérida, capital do estado venezuelano que leva o mesmo nome. Esse é um dos chamados “crimes de ódio” que aconteceram na Venezuela nos últimos dias. Os meios de comunicação locais relatam entre 26 e 35 assassinatos dessa natureza na última semana. As autoridades trabalham com o número de 30 homicídios, mas investigam caso a caso para checar se estão relacionados a disputas políticas, tipificados na Lei Constitucional contra o Ódio, pela Convivência Pacífica e a Tolerância, ou se são crimes comuns.
:: O que está acontecendo na Venezuela? ::
Na maioria dos casos, as testemunhas, amigos e familiares relatam que as vítimas que morreram participavam de protestos e foram atingidas por balas que "ninguém sabia de onde vinham". Foi assim com um adolescente de 16 anos, Alixon Pizani, que estava em um protesto noturno, no bairro popular de Cátia, zona oeste de Caracas, no dia 22 de janeiro. Naquela noite, em Cátia, outra pessoa também foi morta e outras duas feridas.
Segundo o Observatório Venezuelano de Segurança, foram registradas 408 manifestações – das quais 205 foram violentas –, 108 assaltos a bens públicos e privados, e 803 detenções. Destes, 74 tinham antecedentes penais.
Os opositores acusam grupos armados chavistas, conhecidos como "coletivos", de dispararem para inibir manifestações. Os chavistas, por outro lado, se defendem afirmando que são grupos paramilitares de direita que atiram contra opositores para responsabilizar o governo e criar pânico na sociedade. As duas versões são debatidas há anos na Venezuela, sem que se chegue a um acordo.
Em entrevista coletiva, na semana passada, Maduro responsabilizou os grupos e partidos opositores pelas mortes violentas no país. “Fizeram protestos noturnos com que objetivo? Por que noturno? Pagaram pessoas para promover a violência nos bairros populares”, afirma o presidente.
Na última semana, opositores queimaram o centro cultural Robert Serra, localizado no bairro La Pastora, a poucos metros do Palácio Presidencial de Miraflores. Vizinhos relatam que pessoas encapuzadas também lançaram bombas caseiras contra o centro cultural.
No dia 21 de janeiro, quando um grupo de militares tentou roubar armas do quartel da Guarda Nacional Bolivariana (GNB), na Unidade Especial de Segurança Waraira Repano, no bairro de Cotiza, grupos opositores foram até a região para protestar. Carros foram incendiados e dezenas de pessoas ficaram feridas.
Nos vídeos divulgados nas redes sociais, foram identificados militantes do partido Vontade Popular, que já haviam participado de protestos violentos em 2017. Entre os militantes, estão Franklin Bucaral, uma mulher cujo nome não foi identificado, mas que é assistente do deputado opositor Gilber Caro, do mesmo partido, e um ativista conhecido como “o poeta do Vontade Popular”.
Entre os dias 21 e 23 de janeiro, opositores realizaram atos noturnos violentos em mais de 60 localidades, em Caracas e no interior, a maioria deles com relatos de feridos e alguns com registros de mortes. O estado venezuelano de Barinas, no centro do país, foi um dos mais violentos, com quatro mortes reportadas.
Para esta quarta-feira (29), a oposição convocou um novo protesto. "Onde estiver, saia e proteste", disse o líder da oposição e autodeclarado "presidente interino" Juan Guaidó, no domingo (27). Para o jornalista argentino radicado na Venezuela, Bruno Sgarzini, as convocações de protestos sem lideranças podem "ser ainda mais perigosas". "Essa era a maneira como os opositores, em 2017, convocavam as guarimbas [como são chamadas os atos violentos com fechamento de rua]", afirma Sgarzini, que acompanha os conflitos de rua desde então.
Edição: Daniel Giovanaz