Pergunta do quadro Fala Aí questiona como funcionam as organizações criminosas que atuam no Rio de Janeiro atualmente
O Ministério Público do Rio de Janeiro prendeu, na última terça-feira (22), integrantes do Escritório do Crime, uma das milícias mais poderosas da cidade. O grupo é suspeito no assassinato da vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes, no ano passado, e tem possível envolvimento com o senador eleito Flávio Bolsonaro.
A morte de Marielle e Aderson completa 11 meses sem solução do caso. Recentemente, houve a divulgação de um possível elo entre o senador Flávio Bolsonaro e o capitão Adriano Magalhães da Nóbrega (foragido), considerado pelo Ministério Público do Rio como um dos chefes do Escritório do Crime. Mãe e esposa de Adriano foram empregadas do gabinete de Flávio Bolsonaro enquanto ele ocupava o cargo de deputado estadual.
Além disso, Raimunda Veras Magalhães, mãe de Adriano, também foi responsável por parte dos depósitos feitos na conta de Fabrício Queiroz, ex-motorista de Flávio Bolsonaro, de acordo com o relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeira (Coaf).
Flávio Bolsonaro alegou não saber nada sobre o ocorrido, e destaca que a nomeação das duas funcionárias ao gabinete foi indicada por Queiroz. O senador também relata, em nota, ser vítima de difamação ao governo de Jair Bolsonaro.
Outros cinco chefes da milícia Escritório do Crime foram presos. Entre as acusações, estão compra, venda e aluguel de construções irregulares, posse e porte ilegal de armas. Nas buscas também foram encontrados R$ 50 mil e mais de duzentos cheques com valores altos.
A partir desse contexto, o Brasil de Fato foi às ruas e ouviu a pergunta de Anoã Vanneli, que quer saber o que, de fato, são as milícias.
Quem responde é Bruno Langeani, que trabalha com segurança pública no Instituto Sou da Paz:
" O tema das milícias vem ocupando bastante o noticiário desde 2008, quando aconteceu o CPI da milícia no Rio de Janeiro, e mais recentemente com as notícias que falam tanto do Flávio Bolsonaro, como também da possível ligação de milícias na morte da Marielle Franco.
Para falarmos um pouco de milícias, tem um conceito mais geral, que fala que milícia é um grupo organizado e armado. Mas é importante falar do conceito de milícia relacionado ao contexto brasileiro, que tem algumas diferenças importantes.
A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) traz um conceito de milícia no contexto brasileiro bem importante, que define a milícia como grupos que têm um controle de território e um controle da população, ocupando bairros e algumas comunidades. Eles trabalham a partir da lógica de coação dessa população, visam o lucro e têm como composição, nesse contexto de milícia carioca, integrantes das forças armadas, de policiais militares, de bombeiros militares que estão ainda atuando nessas organizações ou que já foram expulsos por problemas disciplinares.
Por último, há uma tentativa de dar um verniz positivo nessas milícias, dizendo que elas geram segurança para a população ou que expulsam traficantes de determinadas comunidades. Mas, na prática, esses grupos não diferem muito dos grupos de traficantes, na medida em que o principal objetivo deles é, de fato, conseguir o lucro. Isso acaba trazendo uma série de prejuízos para os moradores que estão nessas comunidades.
Essas milícias exploram ligações clandestinas de luz, de TV a cabo, cobram mais caro por serviços de transporte nessas regiões, por botijões de gás, etc. Então, na prática, são grupos criminosos que atuam à margem do Estado e que trazem uma série de prejuízos para a população.
Essas são algumas das características principais que ajudam a entender a milícia no contexto brasileiro. É um problema bastante grave de segurança pública que esperamos que, com essas denúncias mais recentes, seja de fato enfrentado pelo Estado, que por muito tempo teve uma conivência e até elogiou alguns desses grupos. "
Edição: Guilherme Henrique