Desde 2013, quando os Estados Unidos impuseram as primeiras sanções contra a Venezuela, o país latino-americano, que possui a maior reserva de petróleo do mundo, enfrenta problemas como escassez de alimentos e altos índices de inflação.
Entretanto, visitando os principais supermercados de Caracas, capital do país, e conversando com trabalhadores e consumidores, nota-se que a questão do abastecimento deixou de ser a mais grave, apesar de os preços continuarem a subir.
Segundo o diretor da Fundação para Desenvolvimento e Promoção do Poder Comunal, Mariano Rondón, a alta dos preços está diretamente relacionada com as sanções e, além disso, com especuladores de dentro do país.
“Neste momento, na Venezuela, especificamente em Caracas, o abastecimento não é um problema. O ponto crítico se apresenta nos preços dos produtos, já que no mercado comum, os pequenos, médios e grandes distribuidores elevaram muito os valores, baseados em um mercado especulativo”, afirma Rondón.
Em entrevista a Opera Mundi, o funcionário do governo explica que as sanções econômicas impostas pelos EUA dificultaram muito a economia interna venezuelana, mas que as elites nacionais também têm responsabilidade neste cenário.
“É inegável que o bloqueio e as sanções nos dificultam o abastecimento e elevam os preços, mas a oligarquia econômica interna é aliada dos atores externos que atentam contra a alimentação do povo”, afirma.
De acordo com Rondón, um possível caminho para normalizar a questão do abastecimento e da inflação na Venezuela seria “liberar nossos recursos do exterior que foram roubados [pelas sanções]” e punir os especuladores internos. “Temos que prender esses infratores e abrir processos judiciais por atentarem contra o povo”, afirma.
:: O que está acontecendo na Venezuela ::
CLAPs e a participação popular
Sobre as soluções adotadas pelo governo para suprir a escassez de alimentos e combater a especulação dos preços, Rondón destaca a criação dos Comitês Locais de Abastecimento e Produção (CLAP), que foram elaborados em 2016 pelo presidente Nicolás Maduro.
“A melhor alternativa são os produtos oferecidos pelo governo que, através dos CLAPs, entrega alimentos a um custo razoável. O governo faz um esforço titânico para aliviar o problema, mas a oposição e seus aliados apostam no caos”, afirma.
Segundo dados de um estudo publicado pelo Centro Estratégico Latino-Americano de Geopolítica (CELAG), em dezembro de 2017 foram bloqueados 29,7 bilhões de dólares em bancos europeus que seriam destinados a pagamentos de produtos destinados aos CLAPs.
Criados por Maduro para melhorar a distribuição de alimentos, os CLAPs estão diretamente vinculados aos Conselhos Comunais, do qual Rondón faz parte. Ele explica que a tarefa de cada conselho é, primeiramente, levantar informações e dados sobre as comunidades locais, como quantas pessoas vivem em uma residência, idade dos moradores e quais são necessidades prioritárias.
Com esses dados, os membros do Conselho Comunal contabilizam quantas “caixas CLAP” e quais produtos serão necessários para atender determinada comunidade. Após o censo, o pedido é enviado diretamente ao Ministério da Alimentação, que é encarregado de organizar o envio dos produtos. A distribuição das caixas, que custam 100 bolívares soberanos (aproximadamente R$ 0,10), fica por conta dos Conselhos e seus representantes.
Geralmente, explica Rondón, os produtos mais comuns que são distribuídos são arroz, leite, macarrão, açúcar, óleo, molho de tomate e muita farinha pré-cozida para fazer as tradicionais “arepas”, prato típico venezuelano, que se come em qualquer refeição. “Com o preço de um produto básico nos mercados privados conseguimos 10 produtos, ou mais, nos CLAPs”, afirma o diretor dos Conselhos Comunais.
Lojas CLAPs
Além de se encarregar da distribuição de caixas com alimentos de primeira necessidade, os CLAPs também possuem lojas físicas onde se podem adquirir uma série de produtos que são subsidiados pelo governo e possuem valor abaixo do mercado.
Alexandre Perez é gerente de uma importante loja CLAP, localizada dentro do conjunto habitacional Cidade Tiuna. A loja na qual ele trabalha atende oito torres do complexo, cerca de 1.000 famílias que vivem nos apartamentos construídos e financiados pelo governo. No cargo há 1 ano e sete meses, Perez conta as “caixas CLAP” são distribuídas para cada família uma vez ao mês.
“Para além das caixas, as pessoas podem comprar na loja todos os tipos de produtos que são oferecidos, porém há um limite de comprar apenas duas vezes por semana o mesmo produto”, explica. Segundo Perez, a regra do racionamento existe porque, como os produtos são em parte subsidiados pelo Estado, a loja possui cotas para fazer os pedidos. Entretanto, o gerente diz que ali nunca houve falta de nenhum produto, “nem a farinha para arepas, que é o mais vendido, nunca faltou”.
Edição: Opera Mundi