Acabo de chegar de uma visita ao "Acampamento Marielle", com a Marina Sant'Anna, Maria Tereza (Caneca) e a Isabelzinha. É quase impossível descrever a beleza e a emoção que tomou conta da gente, ao vermos cerca de 800 mulheres sem-terra, debaixo de barracas de lona, segurando toda a estrutura daquele acampamento, desde a parte da segurança, na cancela de entrada. Fomos, junto a várias outras lideranças sindicais e populares, participar de um ato daquelas mulheres guerreiras que realizam mais uma Jornada Nacional de Lutas, com o lema "Pela Vida das Mulheres, Somos Todas Marielle!"
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Convidada a representar o Bloco Não é Não, de Goiânia (GO), falei ligeiramente da nossa iniciativa de fazer de um bloco de carnaval de rua, um veículo de protestos e conscientização contra o abuso sexual e o feminicídio. E cantei a música do Caymmi, "Minha jangada vai sair pro mar, vou trabalhar, meu bem querer...", lembrando as mulheres presas e torturadas na época da ditadura militar que, mesmo machucadas, tinham a capacidade de cantar para dar força e encobrir os gritos dos companheiros das celas vizinhas, enquanto estes eram torturados.
Abrigadas em barracas de camping ou lonas pretas, depois de uma noite de chuvas pesadas, elas enfrentavam um sol de fazer pipocar a pele, segurando com raça, arte e graça um acampamento feminista, nas terras de um homem que se auto intitulou João "de Deus" e que está sendo acusado de crime de assédio e de abuso sexual por centenas de mulheres que o procuravam, em busca de assistência médica espiritual.
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No auto-falante, duas mulheres coordenam o ato lúdico revolucionário, organizando num grande círculo as acampadas e visitantes. E revezam-se na leitura de um documento da Jornada Nacional de Luta das Mulheres do SMT-2019.
"Seguiremos nos desafiando a viver, amar, cuidar, confiar e lutar ainda mais intensamente. Seremos resistência! Estamos despertas! Cuidaremos umas das outras, de nossa classe e de nossa sementes rebeldes, que brotarão em pura conspiração, seja da terra ou da pedra, não importa. Sabemos semear na calmaria ou no conflito. Não somos pedras, mas sabemos endurecer!"
* Nonô Noleto é diretora do Sindicato dos Jornalistas de Goiás.
Edição: Brasil de Fato