Do mesmo partido do presidente, o deputado federal delegado Marcelo Freitas (PSL) foi o escolhido para analisar a admissibilidade da Proposta de Emenda Parlamentar (PEC) nº 6, que tramita na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara Federal. A PEC -- que altera as regras de concessão e o regime de contribuição para as aposentadorias e benefícios da Previdência Social -- é prioridade do governo Bolsonaro.
Além de ser do mesmo partido, Freitas foi o coordenador de campanha, no segundo turno, da chapa de Bolsonaro na região de Montes Claros, no Norte de Minas Gerais, reforçando o discurso "anticorrupção", conservador e "antissistêmico". Porém, quando trabalhava como delegado, sua atuação era marcada pela defesa de questões sociais e combate aos latifundiários.
Ao assumir o cargo como deputado federal, em seu primeiro mandato, Freitas afirmou que abriria mão do direito à aposentadoria especial como parlamentar e ao auxílio-moradia, como um gesto de combate aos privilégios. No entanto, no documento assinado pelo parlamentar e entregue à mesa da Câmara dos Deputados, a renúncia é só do valor pago em espécie. Freitas fez a solicitação de um imóvel para morar, de graça, em Brasília, durante os quatro anos de mandato.
Além disso, a desistência da aposentadoria como deputado é um detalhe burocrático, pois como delegado da Polícia Federal, com salário acima do teto do INSS, Freitas já tem uma previdência complementar.
O deputado, que promete entregar até o dia 9 de abril o relatório sobre a reforma da Previdência, gastou, em dois meses, janeiro e fevereiro, mais de 19% da verba anual do gabinete. Os maiores gastos são com bilhetes e passagens de avião (R$ 10.306, apenas em fevereiro) e combustível (R$ 1.085,45, em fevereiro).
Na Polícia Federal, o deputado começou a carreira no concurso de 2002 e ascendeu na carreira durante o período de reestruturação e valorização da PF nos governos do Lula. Em 2017, o nome do delegado entrou na lista tríplice para substituir Daiello Coimbra no cargo de diretor-geral. Porém, foi rejeitado pelo presidente Michel Temer (MDB). Formado em Direito, o deputado Marcelo Freitas chegou a ser assessor do ministro Nelson Jobim, no Supremo Tribunal Federal (STF). Ele também deu aulas na Universidade Federal de Lavras, na cidade de Montes Claros (MG).
Pela proximidade com Jair Bolsonaro durante a campanha, Freitas teve o nome cogitado para ser ministro da Justiça no novo governo, mas perdeu a queda-de-braço para Sergio Moro.
Apesar de ser amigo “próximo” do presidente Bolsonaro, uma das principais propostas do deputado, em primeiro mandato, vai de encontro ao perfil político da presidente. Freitas quer que os políticos só tenham direito a dois mandatos, para seja possível a renovação das lideranças políticas. Por sua vez, Bolsonaro foi deputado federal por 27 anos seguidos.
Norte de Minas
A base eleitoral do deputado é a cidade de Montes Claros, onde teve uma atuação importante como delegado da Polícia Federal na investigação de crimes cometidos por latifundiários e apurando as denúncias feitas pelos organizações de pequenos produtores rurais.
Foi responsável pela operação especial que prendeu, em 2017, o fazendeiro Adriano Chafik Luedy, condenado pela massacre de Felisburgo, em 20 de novembro de 2004. Na ocasião, o latifundiário e 16 jagunços invadiram o acampamento Terra Prometida e mataram cinco trabalhadores sem terra.
O delegado também organizou junto com o Ministério Público a operação que desmontou uma quadrilha de jagunços do Brejo dos Crioulos, que atuam como uma quadrilha de roubo a bancos. Outra ação em conjunto com o MP que repercutiu foi a prisão, por corrupção, do ex-prefeito de Montes Claros Rui Muniz, marido da deputada federal Raquel Muniz, que votou a favor do impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
O procurador Afonso Henrique Teixeira acrescenta que Freitas foi um dos responsáveis pela prisão do então mandante-executor da chacina de Felisburgo, em que 5 pessoas foram assassinadas e 12 sofreram tentativa de homicídio. “O doutor Marcelo sempre recebeu o Ministério Público de uma forma bastante honrosa, sempre de maneira prestativa, eficiente”, afirma.
Para os agricultores do norte de Minas, ouvidos em off pela reportagem do Brasil de Fato, o deputado Freitas tem um perfil progressista, engajado com um olhar para questões sociais. Eles se dizem surpresos ao notar a proximidade entre Freitas e Bolsonaro. A própria filiação ao PSL foi encarada com espanto pelos pequenos agricultores, uma vez que o partido se mostra alinhado com as pautas dos latifundiários e do mercado financeiro -- considerados "inimigos" dos camponeses na luta pela terra.
O apoio à reforma da Previdência também vai de encontro ao perfil do delegado descrito pelos camponeses, já que a PEC promove o desmonte da aposentadoria no campo, tanto pelo aumento do tempo de contribuição de 15 para 20 anos, como também com a regra das contribuição em dinheiro para o sistema previdenciário para cada membro da família que trabalha na terra. Atualmente, a contribuição dos agricultores é indireta e acontece na comercialização da produção.
Edição: Aline Carrijo