Três josés. Três joões. Três antonios. Nomes tão afeitos ao afeto, à memória, à cultura popular. Nomes que batizaram santos. E os sobrenomes? Silvas, Pereiras, Souzas. Muitos. E Dias, Costa, Rabelo, Santana. Todos imagináveis, singelos, caboclos, mestiços de sangue português, índio e negro. Todos, porém, desprezíveis aos olhos da polícia, quase sempre extensões dos senhores do chão e do chicote. No dia 17 de abril de 1996, os joões, josés e antonios e seus companheiros tiveram seus nomes e carnes trespassados pelas balas dos fuzis.
Este 17 de abril marca o 23º aniversário daquele que pode ser considerado “O Dia da Vergonha Nacional”. Um dia de reflexão sobre um banho de sangue que – fosse em outro país mais justo e generoso – consagraria a data como de luto nacional. Vinte e um sem terra foram assassinados pela polícia militar em Eldorado dos Carajás/PA. As cenas da chacina deram a volta ao planeta, atestando o grau de selvageria no tratamento oficial dos pobres da terra no país continental que lhe nega terra.
Mas a desonra vai além das mortes. Até porque, depois que os corações deixaram de pulsar e as pás cobriram os caixões, veio o julgamento. Que explicitou, novamente, o Brasil como uma nação brutal. Em que a desigualdade no acesso à terra se reproduz no acesso à justiça: dos 144 envolvidos no massacre, apenas dois foram responsabilizados. Um deles, mesmo condenado a 228 anos de prisão, somente se apresentou para cumprir pena em 2012.
O que demonstra que, dependendo do acusado, a Justiça brasileira tanto pode deixar um assassino solto por anos a fio quanto, em velocidade recorde, jogar no fundo de uma masmorra quem não possui culpa alguma. É o que o Brasil, hoje mais do que nunca, continua mostrando ao mundo.
Este conteúdo foi originalmente publicado na versão impressa (Edição 13) do Brasil de Fato RS. Confira a edição completa.
Edição: Marcelo Ferreira