Na juventude, carregava comigo muito do revolucionário romântico. Eu me espelhava no Padre Camilo Torres, em Che Guevara, Carlos Lamarca, por pensar que somente com armas iríamos conquistar o poder, então estaria tudo resolvido.
A União Soviética, após a revolução liderada por Lenine e Trotsky, tornou-se o modelo que eu sonhava. A Classe Operária subira ao poder destronando a velha oligarquia dos czares, e se estruturava para ter uma existência solidária, onde o acesso às oportunidades não fosse privilégio, mas o direito de cada um, assim como os bens não seriam concentrados nas mãos de poucos, mas distribuídos a cada um, segundo as suas necessidades.
Na minha cabeça cheia de sonhos, Jesus e Marx andavam de mãos dadas, o segundo continuando o trabalho do primeiro, sempre na perspectiva da felicidade do ser humano.
Entendi, ainda cedo, que o capitalismo se identifica com os interesses pessoais e que daí decorre: o mercado excludente, a propriedade privada dos bens de produção, a concentração e acúmulo de renda.
Fulton Sheen e sua produção “A Vida de Jesus” era a minha frequente leitura, e me marcava quando dizia que os capitalistas morreriam abraçados aos seus bens, não sendo nunca capazes de compartilhá-los.
Hoje, aos 86 anos, já não tenho mais o ardor revolucionário de ascender ao poder pelas armas, da mesma maneira que não tenho nenhuma ilusão quanto ao capital ser capaz de distribuir voluntariamente seus bens.
E então, o que fazer?
Se o capitalismo, cada vez mais, acumula os bens produzidos pelos trabalhadores se no seu top se instala o sistema financeiro explorando cruelmente os povos do mundo, deixando por onde passa um rastro de fome e miséria?
Se ele corrompe consciências, destruindo os direitos duramente conquistados, se o capital põe em risco os bens da natureza, como a água, as florestas e, em consequência a vida humana?
Que fazer, se há dúvidas quanto ao êxito social/humano/econômico da revolução armada?
Vamos recorrer à História.
A União Soviética, com os desvios de Stalin desabou, deixando de ser modelo para a Classe Operária de todo o mundo, como entendia Rosa de Luxemburgo. Cuba está cada vez mais distante do novo Éden – o Comunismo. A China aliou-se ao sistema na exploração dos trabalhadores.
Parece que há um desencanto revolucionário armado, há uma trégua até mesmo nas manifestações de rua.
Mas há uma força que resiste, essa força tem o nome de “Cristianismo”, como seguimento dos ensinamentos e da prática de Jesus. Ela não se confunde com a Igreja a qual se afastou dos pobres e do povo e se aproximou do poder. O seguimento de Jesus não se identifica com os cultos e rituais os quais não passam de espetáculos que, quando muito, trazem um bem-estar emocional.
Eu acredito na Solidariedade, força que não conhece limites para acontecer, acredito na força da Justiça que reconhece a Dignidade (marca indelével do ser humano) e os Direitos Humanos, seu irmão siamês. Eu acredito na Fraternidade, tênue, e inquebrantável liame que une as pessoas como irmãs e irmãos; eu acredito na Bondade, suave como a brisa, irradiando acolhimento, generosidade, sensibilidade, compreensão. Quando esses valores se encontram, surge o Amor.
Esse conjunto de valores que estabelece a mais humana das convivências chama-se Reino de Deus.
No caminho da sua conquista, com armas ou sem armas, muitos já tombaram, mas a Fé, como convicção, nos diz que um mundo sem exploração virá, e a esperança nos aproxima desse dia.
*João Fragoso é ex-militante sindical, membro do Coletivo Cotonetes e do Memorial das Ligas Camponesas
Edição: Cida Alves