AMBIENTE

Mineração em Lavras do Sul avança silenciando comunidade local, aponta manifesto

MPF recebe documento contra Fosfato Três Estradas, mais um projeto que avança sem o devido diálogo com a população

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Sociobiodiversidade no Bioma Pampa está gravemente ameaçada de destruição, da mesma forma que em outras áreas no país.
Sociobiodiversidade no Bioma Pampa está gravemente ameaçada de destruição, da mesma forma que em outras áreas no país. - Fotomontagem: Divulgação

Inúmeras violações de direitos, ameaças da destruição da biodiversidade, falta de transparência e de participação social na instalação de grandes projetos de mineração na metade Sul do Rio Grande do Sul estão sendo denunciadas por organizações da sociedade civil, comunidades locais e pesquisadores. Está nas mãos do Ministério Público Federal (MPF) o “Manifesto sobre violações de direitos provocadas pela mineração no Brasil e como se reproduz no projeto `Fosfato Três Estradas´ (RS)”, entregue pelo Comitê dos Povos e Comunidades Tradicionais do Pampa, em parceria com a Fundação Luterana de Diaconia (FLD).

O projeto Fostado Três Estradas pretende instalar uma mina de fosfato que deve funcionar por 50 anos no município de Lavras do Sul (RS). A região é de cabeceira do rio Santa Maria e fica há cerca de 10 km das cabeceiras do rio Camaquã. Juntas, as Bacias Hidrográficas compreendem 33 municípios onde existe grande concentração de Povos e Comunidades Tradicionais, famílias pecuaristas e Assentamentos da Reforma Agrária.

Segundo informações do manifesto, a Águia Fertilizantes, responsável pelo projeto, tem atuado na região desde 2011. Porém, a sociedade tomou conhecimento da intenção de mineração da empresa apenas em 2017, o que está em desacordo com a legislação. A Constituição Federal e o Decreto 6040/2007 (Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais), bem como a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos da ONU e a Convenção nº 169/1989 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), preveem processo de consulta específica, livre, prévia e informada junto aos Povos e Comunidades Tradicionais. 

“A Águia Fertilizantes participou da elaboração do Plano de Recursos Hídricos da Bacia rio Santa Maria entre 2013 e 2016 e determinou a mudança no enquadramento das águas (de especial para Classe 1) nas cabeceiras onde o projeto pretende se instalar. Recentemente o Comitê do rio Santa Maria aumentou o número de vagas da categoria mineração em detrimento das categorias associações comunitárias e organizações ambientalistas naquele Comitê de Bacias.” aponta o relatório.

A justificativa para realização do projeto  é econômica. Em funcionamento, a mina deve empregar 320 pessoas, fora empregos indiretos, beneficiando principalmente o agronegócio e o setor de exportações. “Com o início das atividades do Projeto será disponibilizado para o mercado do Rio Grande do Sul uma importante fonte de fosfato, um insumo indispensável para a fabricação de fertilizantes, que hoje é 100% importado. Toda a produção de fosfato deverá ter como destino o porto de Rio Grande, onde estão concentradas as principais indústrias de fertilizantes do estado”, informa a Águia Fertilizantes no site do projeto.

Mina Guaíba ameaça 4 milhões de gaúchos

Na região metropolitana de Porto Alegre, a Mina Guaíba já está em processo de licenciamento ambiental e coloca em risco 4 milhões de gaúchos. Localizada entre os municípios de Charqueadas e Eldorado do Sul, será a maior mina de carvão a céu aberto do Brasil. A exploração ficará com a Copelmi Mineração, hoje o maior grupo privado na exploração do carvão no país. 

A mina vai trazer “a contaminação química por metais pesados tóxicos (zinco, cobre, mercúrio, chumbo, cádmio, entre outros) além da turbidez maior dos cursos de água e particulados (poeira de minério de carvão) que afeta flora, fauna e saúde humana”, prevê o biólogo Paulo Brack, coordenador do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá). 

Além disso, o projeto prevê a remoção do assentamento Apolônio de Carvalho, a segunda maior unidade produtora de arroz orgânico do estado depois de Viamão. São 72 famílias de agricultores, 700 hectares de cultivo de arroz, além da produção de hortaliças. O impacto ainda se estende a três unidades de conservação e um loteamento urbano, o Guaíba City.

Metade Sul do RS na mira das mineradoras

Em Caçapava do Sul, a empresa Nexa Resources S.A, antiga Votorantim Metais Holding, deseja minerar zinco e cobre na região das Guaritas, distante apenas 800 metros do rio Camaquã, na divisa com o distrito de Palmas, pertencente a Bagé. A cada hora, a mineradora vai beber 150 metros cúbicos de água rio, contribuindo para seu assoreamento e diminuição drástica do volume do caudal. 

Além disso, os rejeitos serão depositados em pilhas a céu aberto, comprometendo a saúde e o meio ambiente de forma perpétua. Sujeitos a intempéries, serão transportados para o rio e daí espalhando-se pelos 28 municípios que formam a sua bacia do Camaquã, chegando à lagoa dos Patos e o oceano.

Em São José do Norte, a empresa Rio Grande Mineração (RGM) quer minerar titânio e zircônio na região de Retiro. Planeja explorar cerca de 600 mil toneladas de minerais pesados em uma faixa de terra de 30 quilômetros de extensão, entre a lagoa dos Patos e o Atlântico. A mina impacta diretamente na quem vive do rio, como os pescadores artesanais, que não são levados em consideração no estudo de impacto ambiental. 

Mesmo com os protestos de rua e o alerta do Ministério Público Federal, o Ibama concedeu licença prévia para a mineração. O MPF pediu a suspensão da licença do empreendimento. Mas a 2ª Vara Federal de Rio Grande negou a concessão de liminares nas duas ações civis públicas movidas contra o Ibama e a empresa RGM. No final de março, o MPF recorreu da decisão ao TRF da 4ª Região.  

A Bióloga da Fundação Universidade de Rio Grande (Furg), Jaqueline Durigon, enfatiza que o governo federal, para implantar seu projeto de mineração, está flexibilizando normas e procedimentos adotados no processo de licenciamento.

Edição: Marcelo Ferreira