Trabalhadores da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) fizeram um ato em frente à sede da empresa, na manhã desta quinta-feira (2), contra a privatização da companhia. O edifício está localizado em Pinheiros, zona oeste da capital paulista.
O governo de João Doria (PSDB) estuda privatizar a empresa ainda este ano, mas o processo vai depender da aprovação da Medida Provisória (MP) 868, que altera o marco legal do saneamento básico e retira a vantagem competitiva das estatais.
O projeto, que está em tramitação no Congresso Nacional, transfere a regulação do setor para Agência Nacional de Água. Hoje, a competência é dos municípios.
O valor estimado pela venda da Sabesp é de R$ 10 bilhões. No entanto, só em 2018, a companhia estatal deu lucro de R$ 2,8 bilhões -- um aumento de 12,5% em relação a 2017.
Efeitos para o trabalhador
Wilson Lopes de Oliveira trabalha há 25 anos na empresa no setor de engenharia, de abertura e fechamento de água. Ele teme que a possível venda da empresa gere precarização do trabalho e do abastecimento de água.
"A tendência é essa. É uma coisa que já está acontecendo em vários setores da empresa, que já são terceirizados. De certa forma, a população fica com o ônus de ter que vender tudo. Então, a gente está nessa luta querendo manter o governo do estado como maior acionista e no comando da empresa", explica.
Oliveira não tem dúvida de que a privatização vai gerar impactos como demissões e baixa nos salários. "As pessoas que têm mais tempo de casa já estão indo embora porque não estão querendo pagar pra ver", relata o trabalhador. “A conta vai ficar mais cara e o serviço não vai ser de qualidade. Vão colocar mão de obra inexperiente. E sempre a corda estoura pro lado mais fraco, que é o da população.”
Se atualmente os trabalhadores da Sabesp são contratados pelo regime CLT, com a possível venda da empresa poderá ocorrer um aumento da terceirização, a redução dos salários e a perda de postos de trabalhos diretos, que têm um grande corpo técnico especializado. Esse é o cenário apontado pelo presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Água
"A gente sabe que, quem investe, não investe para ter saneamento, mas para ter lucro e retorno financeiro. E a gente sabe que já temos uma avenida pavimentada, [ou seja] eles não vão ter problema nenhum em usar novos mecanismos da reforma trabalhista", diz.
O sindicalista também afirma que uma possível privatização pode gerar descaso com o serviço em regiões mais afastadas do estado, em municípios considerados não-rentáveis. Segundo o sindicato, 60% dos lucros da empresa são da operação na região metropolitana de São Paulo.
O governo estadual diz que vai, com a venda da companhia, levantar recursos externos para investimentos no setor. Mas o presidente do Sintaema refuta essa tese. "É um argumento que não se sustenta. Até três anos atrás, o problema do saneamento básico não é a falta de recursos, mas a dificuldade de execução. Inclusive, porque do dinheiro que for captado através da capitalização da empresa, menos da metade vai ser ser revertida em investimentos."
Avanço no Congresso Nacional
A discussão foi intensificada sobre a privatização da Sabesp porque a MP 868 perde a vigência em três meses, no dia 3 junho, e não poderá mais ser votada, a não ser que o governo reedite o projeto e encaminhe novamente ao parlamento.
O Secretário da Fazenda do Estado, Henrique Meirelles disse que, caso a MP seja derrotada, o governo estadual vai optar pela capitalização da companhia. O modelo foi desenhado pelo ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB). Nele, o estado deixaria de ser o acionário principal da companhia e teria apenas 25% das ações.
A Medida Provisória pode entrar em pauta na agenda parlamentar na próxima semana, no dia 7 de maio. O deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP) prometeu que os parlamentares de oposição vão fazer do plenário "um inferno" para tentar obstruir a MP 868.
"Vamos fazer isso, porque é uma imoralidade o que eles querem fazer com as empresas de saneamento no Brasil", afirmou o parlamentar durante o ato na Sabesp. "Somos contra a privatização do saneamento, porque a água tem que ser vista como um direito, ela é fundamental para a vida das pessoas."
Silva afirma ainda que privatizações como esta podem gerar mais acidentes a partir da precarização dos serviços e do impactos nos trabalhadores do setor. Ele lembrou também da tragédia do rompimento da barragem em Brumadinho (MG), há pouco mais de três meses.
Já a deputada estadual Beth Sahão (PT) afirma que, na Assembleia Legislativa do Estado (Alesp), a oposição também vai se organizar para rejeitar o projeto de privatização da Sabesp. "O tempo tem que se colocar a nosso favor. E também a unidade da luta. Se a Sabesp for privatizada, não são só os trabalhadores que serão prejudicados, mas o conjunto da população."
Ela contextualiza a venda da Sabesp a um pacote de privatizações que Doria deve promover à frente do estado. Nele, estão rodovias, presídios e empresas como a Companhia de Desenvolvimento Agrícola de São Paulo e a Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano.
"Esse é um projeto de governo de uma ideologia que sempre propôs o papel cada vez menor do Estado, em qualquer área. E, obviamente, as primeiras a serem afetadas são as empresas públicas", avalia. "Os tucanos vêm promovendo isso no estado há muito anos. E o Doria é a forma mais bem-acabada desse pensamento privatista."
A Sabesp atua em 371 municípios do estado de São Paulo. Com a sexta tarifa mais barata do país, a companhia entrega água por menos de um centavo o litro, segundo o próprio site da companhia.
Edição: Vivian Fernandes