Não preciso ser um gênio em análise de crise para ver que a política implantada pelo então presidente da Petrobras Pedro Parente, em julho de 2017, iria dar rolo, como diz o jargão das redações. Parente alinhou os preços às variações do mercado internacional, que usa o dólar como moeda. Até então, os preços da gasolina, do diesel e, principalmente, do gás de cozinha eram subsidiados pela empresa de uma maneira disfarçada, como evitando, ou atrasando, o repasse para o preço das variações do mercador internacional. A bem da verdade, que se diga que Parente realizou o sonho de muitos ex-presidentes da Petrobras que defenderam o reajuste dos preços dos combustíveis atrelado ao mercado internacional. E nunca conseguiram sucesso, porque, desde os governos militares (1964 a 1985), passado pelos presidentes da República eleitos, usaram os preços dos combustíveis como um dos instrumentos para frear a inflação.
Em 2017, Parente conseguiu atrelar o reajuste dos preços dos combustíveis – diesel, gasolina e gás de cozinha – às variações dos mercados internacionais, porque foi favorecido por uma conjuntura política muito especial. O Brasil era governado pelo presidente da República Michel Temer (MDB – SP). Em 2016, o grupo político de Temer havia tido sucesso em uma conspiração que acabou em impeachment da então presidente da República Dilma Rousseff (PT – RS). Temer era vice de Dilma e assumiu o governo. Na época, diariamente, inundavam as páginas dos noticiários brasileiros casos de corrupção envolvendo a Petrobras, descobertos pela Força-Tarefa da Operação Lava Jato. Parente assumiu a Petrobras com carta branca de Temer para colocar a empresa nos trilhos.
Aqui chegamos ao xis da questão. Nós temos noticiado que o atrelamento dos preços dos combustíveis às variações dos mercados internacionais tem sido benéfico para a saúde econômica da Petrobras. Esse é um dos lados da moeda. Tem o outro. Lembramos que o governo federal tem usado a política de subsídios disfarçada com os preços dos combustíveis por décadas. Ou seja: toda a economia brasileira se acomodou nesse modelo, especialmente o transporte de cargas por caminhões. Mais ainda: a política implantada por Parente tem duas mãos, ela repassa para os combustíveis as subidas e as descidas dos preços internacionais do petróleo. Por operar em forma de cartel, os postos de combustíveis só repassam as altas nos preços, raramente as baixas. A soma disso tudo? Um baita rolo. Em 21 de maio de 2018, os caminhoneiros decretaram uma greve que entrou para a história do Brasil.
A maneira imprudente como foi implantada a nova política de preços dos combustíveis pelo Parente foi o estopim da greve que causou bilhões de prejuízos para a economia do país. Mas não foi a razão do sucesso da paralisação. O sucesso aconteceu porque os empresários do setor de transporte aderiram à greve – investigações da Polícia Federal (PF) apontaram o envolvimento de vários empresários no movimento. Inclusive houve grupos de grevistas que foram bater nos portões dos quartéis, pedindo a volta dos militares ao poder. Nessa greve foi significativa a participação dos militantes da candidatura à presidência da República do atual presidente, Bolsonaro, capitão da reserva do Exército. Os militantes de Bolsonaro não cometeram crime algum. Aproveitaram a oportunidade, faz parte do jogo político. Tudo isso que contei é passado. Então, qual é a novidade? Foi esquecida pelos conteúdos dos noticiários de jornais, TVs, rádios e sites. Portanto, estamos contando uma história pela metade para o nosso leitor. Vejamos: é presença nos noticiários a lembrança que os caminhoneiros podem parar. A ameaça é real. Mas ela só acontece se donos das transportadoras romperem com o Bolsonaro. Uma lembrança: a grande maioria dos empresários são pequenos e médios. Portanto, gente de paciência curta. Hoje, eles pagam um combustível reajustado pelos preços dos mercados internacionais. E tem uma tabela de preços do frete que é uma ficção, porque existe oferta de caminhões e carência de cargas. Como manda a lei de mercado, o dono da carga coloca o preço.
A situação é essa. Eu insisto que temos que lembrá-la ao nosso leitor. E não precisamos, aliás não tem como fazer, escrever um “paper” em cada matéria. Mas podemos colocar frases que lembram esse contexto, tipo: recebemos em reais e pagamos os combustíveis em dólar – moeda usada pelos mercados internacionais. Esse é o nó da questão. É simples assim.
* Carlos Wagner é repórter, graduado em Comunicação Social – habilitação em Jornalismo, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). Trabalhou como repórter investigativo no jornal Zero Hora (RS, Brasil) de 1983 a 2014. Recebeu 38 prêmios de Jornalismo, entre eles, sete Prêmios Esso regionais.
Edição: Marcelo Ferreira