Cenário de mobilizações históricas para a classe trabalhadora desde as décadas de 70 e 80, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC completa 60 anos de existência no dia 12 de maio. Em celebração ao aniversário da simbólica entidade, neste sábado (11) aconteceram apresentações artísticas, shows e falas políticas no entorno da sede do sindicato, em São Bernardo do Campo.
Trabalhadores, lideranças sindicalistas e partidárias, movimentos sociais e moradores da região participam do evento, que conta com uma diversificada programação cultural. Em um palco montado na rua lateral da sede, apresentaram-se as cantoras Aline Calixto, Ana Cañas, rapper Dexter, Comunidade do Samba, entre outros artistas.
Além da comemoração, houve um ato político em defesa da liberdade de Luiz Inácio Lula da Silva, preso na Polícia Federal de Curitiba há mais de um ano. Principal referência sindical do país, o ex-presidente e metalúrgico dirigiu o sindicato de 1975 a 1981.
Relembrando o legado de Lula, João Cayres, atual secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT) de SP e da direção do sindicato, denunciou a perseguição política contra o petista. "Percebemos que é um golpe, que tentam mantê-lo preso por que Lula é a esperança de milhões de brasileiros, foi o único presidente que conseguiu governar esse país para todos".
História
Em 12 de maio de 1959, a assembleia de fundação do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, ainda como associação, ocorreu na sede do Sindicato dos Marceneiros de São Bernardo do Campo, com 71 trabalhadores. Apenas dez anos depois, em 1969, Lula assumiria seu primeiro cargo como suplente do conselho fiscal.
Uma exposição de fotos no saguão da sede relembrou a trajetória da entidade ao longo desses 60 anos de luta. Momentos históricos, como por exemplo, o 1º de Maio de 1968, na Praça da Sé, em São Paulo, ato que marcou a volta dos trabalhadores às manifestações de rua após o golpe militar de 1964.
Metalúrgico da Wolkswagen por 32 anos, Sebastião Cury era uma das centenas de pessoas presentes na comemoração. Sua história de vida e militância se cruza com a trajetória de consolidação do sindicato como referência para os operários, no qual atuou como dirigente desde 1986.
Cury destacou o importante papel que o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC teve durante a ditadura militar brasileira, assim como a influência de Lula neste processo.
“No final do anos 70, começo dos anos 80, o Lula, então presidente do sindicato, foi o grande comandante de uma resistência contra a ditadura militar. Também foi responsável naquela época para ajudar a derrubar de uma vez a ditadura militar. Nos anos seguintes, nos anos 90, 2000 e até agora, teve muita conquista, por que a base do sindicato é uma base politizada. Então, com isso a luta fica mais qualificada”, lembrou.
Entre outros tantos momentos, as imagens expostas no saguão da sede do sindicato reconstruíram momentos históricos das assembleias de campanha salarial da categoria. Na primeira delas, em 1979, não havia palanque. Isso não foi um problema para Lula, que subiu em cima das mesas e fez suas falas mesmo embaixo de chuva.
Em 13 de março do mesmo ano, os metalúrgicos deflagram a primeira greve geral de uma categoria urbana na história recente do sindicalismo no país. Em resposta à mobilização, o governo militar proibiu assembleias no Estádio de Vila Euclídes, e então, São Bernardo do Campo torna-se o cenário de outras lutas da categoria.
Durante o evento, Gilmar Mauro, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), enfatizou a importância histórica do Sindicato dos Metalúrgicos. "O Sindicato dos Metalúrgicos não é só dos metalúrgicos. É um patrimônio político da classe trabalhadora". Em referência às greves massivas da década de 80 que marcaram o sindicalismo no Brasil, Gilmar Mauro fez uma convocatória para a greve do dia 15 de maio, organizada pelos setores da educação. A mobilização é uma prévia da greve geral de todas as categorias, sinalizada para o próximo dia 15 de junho.
Já Vagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), um dos embriões do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, ressaltou a importância da organização de classe para a construção de um país mais justo, principalmente em tempos de retrocesso.
“Este sindicato e Lula significam o melhor que nós temos da classe trabalhadora brasileira e significam hoje o que é importante para o Brasil: a classe trabalhadora brasileira de cabeça erguida para derrotar o bolsonarismo, os banqueiros internacionais que querem a reforma da Previdência, para derrotar os grandes empresários do campo que querem acabar com a legislação em relação aos trabalhadores rurais, para acabar com a falta de democracia, para defender a mulher, os negros, a comunidade LGBT e as crianças”.
Uma feira orgânica com diversos produtos do MST também aconteceu no estacionamento do sindicato. Durante o evento foram colhidas assinaturas para um abaixo-assinado contra a reforma da Previdência.
A luta não acaba
Em razão dos seus 60 anos de existência, a entidade publicou uma nota em que se posiciona sobre os desafios atuais e convoca os trabalhadores para se mobilizarem por melhores condições de trabalho e salário.
O desmonte da indústria nacional nacional é uma grande preocupação da entidade. “O ABC e o Brasil estão sofrendo com a desindustrialização, ocasionada pela falta de uma política industrial do governo. A falta de comprometimento das esferas públicas em relação à indústria pode ocasionar a sua extinção”, denuncia o texto.
As ofensivas da atual conjuntura política contra a organização sindical e ataque às lideranças também foram citadas. Após aprovação da Medida Provisória (MP) 873, que determina novas regras para o recolhimento da contribuição sindical, a situação econômica das entidades se agravará.
Porém, mesmo em um cenário turbulento, a nota garante que o posicionamento do Sindicato frente às adversidades do presente honrará sua história de luta. “Os desafios são muitos, mas a nossa vontade de construir juntos um país e um mundo mais justo, mais igualitário e mais solidário nos permitirá seguir adiante. Essa história não acabará aqui. Vamos encarar como sempre encaramos, com muita luta, mobilização e organização”.
Carta do Lula
No final da atividade foi lida uma carta do Lula em que o ex-presidente relembra a primeira grande greve no ABC depois dos anos de chumbo da ditadura militar. Confira:
"Companheiros e companheiras,
Há 41 anos, no dia 12 de maio de 1978, as máquinas pararam na fábrica da Scania de São Bernardo do Campo.
Foi o início da primeira grande greve no ABC depois de um longo período de repressão e arrocho salarial. Foi quando a classe trabalhadora levantou a cabeça e mostrou sua força, mudando a história do país.
Por ter participado daquela greve e tantas outras, tenho muito orgulho de ser membro do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC desde 1968.
Junto com vocês aprendi que vale a pena lutar por justiça e democracia, pelos direitos dos trabalhadores e uma vida melhor para o nosso povo, por mais difíceis que sejam as condições dessa luta.
No aniversário de 60 anos do nosso Sindicato, quero dizer a vocês que nunca esqueci de onde eu vim e que, mesmo daqui onde estou preso injustamente, nunca desisti de continuar lutando.
Juntos, fizemos muito para mudar nosso Brasil. Tenho fé que vamos nos reunir novamente para mudar muito mais, porque o nosso povo merece viver num país melhor e mais justo.
Viva o Sindicato dos Metalúrgicos!
Viva a classe trabalhadora!
Um grande abraço do companheiro Lula."
*Colaboração Lu Sudré e Michele Carvalho
Edição: Michele Carvalho