Trabalho

Sob pretexto de desburocratizar indústria, Bolsonaro pode elevar índice de acidentes

Presidente quer reduzir normas de segurança no trabalho; país registrou 4,5 milhões de acidentes de trabalho em 7 anos

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Desburocratizar normas de segurança e saúde no trabalho podem aumentar acidentes e precarização no setor
Desburocratizar normas de segurança e saúde no trabalho podem aumentar acidentes e precarização no setor - Pixabay

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) anunciou que o governo federal vai realizar mudanças nas Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde no Trabalho à partir de junho. A informação foi divulgada na última segunda-feira (13) pela rede social do presidente sob a justificativa de que as leis estariam defasadas e travando o desenvolvimento da indústria. O objetivo do governo é desburocratizar o setor e, com isso, aumentar a produtividade.

Para repercutir o anúncio do presidente e suas possíveis consequências, o Brasil de Fato conversou com o supervisor do Núcleo de Políticas Públicas do Dieese, Nelson Karam, considerado um especialista na área. Segundo ele, o discurso de que as normas regulamentadoras estão desatualizadas e brecam a indústria é equivocado.

"O primeiro esclarecimento é que isso já vem sendo feito, então não é que essas normas ficaram paradas no tempo. Elas são renovadas, atualizadas, adaptadas continuamente. Em segundo lugar, essa mudança nas normas passam sempre por um olhar tripartite, uma comissão composta por representações de governos, trabalhadores e empresários, que sentam, pactuam e discutem as características dessas normas, as modificações que necessitam ser feitas. Então, não é uma obra de governo fazer essa atualização. A menos que o governo queira quebrar uma regra na concessão dessas normas".  

O especialista aponta que o governo tem trabalhado na ideia de que uma regulação traz dificuldade para as empresas produzirem e eleva os custos de produção. Porém, em um país onde os acidentes de trabalho tem números alarmantes, a flexibilização das Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde trazem como principal consequência a fragilização do trabalhador e aumento da precarização do trabalho. Nos últimos sete anos, foram registrados 4,5 milhões, dos quais 16,9 mil foram fatais.

Além disso, o próprio Estado também sofre as consequências de um ambiente de trabalho inseguro, na dimensão da saúde pública com atendimento dos acidentados pelo SUS e pensões pelo INSS. 

Karam também explica que ambientes de trabalho mais seguros significam a possibilidade de produção com mais eficiência e produtividade. 

"O que nos preocupa neste momento é que, ao que tudo indica, a intenção do atual governo ao rever essas normas não vai na linha de proteger o trabalho, a produtividade das empresas. Ao contrário, o governo sinaliza e olha pra essas normas unicamente como uma barreira de custo para as empresas".

Recentemente, o Brasil assistiu a casos onde a diminuição dos custos empresariais se deu justamente nos setores de segurança, como é o caso do crime da Vale em Brumadinho (MG), onde mais de 200 funcionários foram soterrados pela lama do rompimento da barragem da mineradora. O caso é considerado o maior acidente de trabalho do Brasil. 

Karam também dá como exemplo de acidentes trabalhistas o uso do amianto no Brasil, produto químico altamente cancerígeno e proibido em diversos países por causar morte dos trabalhadores que manipulam o material. Além disso, ele cita a liberação do uso de agrotóxicos já banidos internacionalmente por causar malefícios à saúde dos trabalhadores do campo. 

Para ele, a melhor saída para a retomada da produtividade industrial está longe de ser “simplificar” as normas de segurança. Ele aponta que a manutenção é necessária para acompanhar as mudanças do mercado e das formas de trabalho, mas que é preciso debate. 

“As normas regulamentadoras tem que caminhar para incorporar essa nova dimensão do trabalho, então tem que ser continuamente atualizadas. Agora simplesmente em uma canetada querer burocratizar um único sentido de reduzir custos para empresa e expor o trabalhador não é a direção correta nem mais adequada para um país que busca caminhar para retomada do crescimento”, finaliza. 

 

Edição: Aline Carrijo