Com pautas difusas e tons de autoritarismo, manifestantes pró-Bolsonaro (PSL) foram às ruas neste domingo (26) para demonstrar apoio ao presidente da República. Embora a convocatória nas redes sociais falasse em "parar o Brasil" com atos "do Oiapoque ao Chuí", os números divulgados até o momento são inferiores à greve nacional do último dia 15 em defesa da educação pública, que mobilizou mais de um milhão de pessoas em todos os estados brasileiros. Em várias capitais, a Polícia Militar (PM) não informou a estimativa de participantes nos atos deste domingo.
Grupos como Movimento Brasil Livre (MBL) e Vem pra Rua, que lideraram as manifestações pelo golpe contra a presidenta Dilma Rousseff (PT) e ajudaram a eleger Bolsonaro nas ruas, não compareceram aos protestos deste domingo -- que reuniram setores com pautas mais conservadoras, como o Direita São Paulo, Revoltados Online e o Clube Militar. Entre as demandas apresentadas na rua, estão a aprovação da reforma da Previdência e do pacote "anticrime", do ministro Sergio Moro. As palavras de ordem mais agressivas eram direcionadas ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao chamado "Centrão", ala que reúne partidos de centro-direita no Congresso Nacional.
A organização dos atos deste domingo informou que haveria manifestações em 350 cidades brasileiras. Até as 20 horas, haviam sido registrados protestos em 156 municípios -- menos da metade do prometido. No protesto em defesa da educação pública, no dia 15, houve manifestações em 222 cidades.
Segundo os manifestantes, o governo não sofre de inaptidão e ineficiência, ao contrário do que apontam cientistas políticos e especialistas desde janeiro. Para quem foi às ruas neste domingo, Bolsonaro não consegue reverter a crise econômica e institucional porque não há harmonia entre os poderes, que impossibilitam a efetivação dos planos do presidente e sua equipe ministerial. Aos gritos de "mito", os apoiadores do presidente criticaram o vice, Hamilton Mourão, e enalteceram Olavo de Carvalho, considerado o "guru do bolsonarismo".
Os atos aconteceram em algumas das maiores cidades do país desde as 10 horas da manhã. Em Brasília (DF), se reuniram 10 mil manifestantes, segundo a PM -- para efeito de comparação, foram 50 mil em defesa da educação pública. Em Belém (PA), foram três mil às ruas neste domingo -- no 15M, eram 10 mil contra os cortes nas universidades. Em Belo Horizonte (MG) e no Rio de Janeiro (RJ), não foi divulgada uma estimativa oficial de público.
Em São Paulo (SP), Recife (PE), Fortaleza (CE), Porto Alegre (RS) e Curitiba (PR), os atos começaram a partir das 14 horas. Na capital do Paraná, manifestantes arrancaram da fachada do prédio histórico da Universidade Federal do Paraná (UFPR) uma faixa com os dizeres "Em defesa da educação", pendurada no dia 15.
A Avenida Paulista, na cidade mais populosa do Brasil, recebeu o maior protesto do dia.
O clima no ato em São Paulo
Passava das 14 horas quando nove carros de som utilizados por grupos de direita e extrema direita espalhados pela Avenida Paulista, no centro da cidade de São Paulo, ligaram seus auto-falantes no volume máximo. As caixas de som tocavam o grande hit deste domingo: o Hino Nacional Brasileiro.
Foi também por volta das 14 horas que começaram a circular pela principal avenida da cidade manifestantes de todas as faixas etárias, em apoio ao governo Bolsonaro. Eles se misturavam aos já tradicionais frequentadores da “Paulista Aberta” aos domingos -- quando a via é utilizada para as atividades culturais e de lazer e, por isso, não comporta carros e ônibus.
Além do apoio a Bolsonaro, os manifestantes demonstravam desprezo por membros do STF e do Congresso Nacional. Um dos principais alvos foi o deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados. Chamado de “chantagista”, Maia também ganhou cânticos nada elogiosos sobre sua presença na Câmara.
O parlamentar do Democratas tem protagonizado disputas com Bolsonaro e também com a ala ideológica do bolsonarismo, comandada por Olavo de Carvalho. Os apoiadores do capitão reformado pedem celeridade no trâmite das propostas do presidente e de sua equipe econômica.
A manifestante Regiane Aparecida dos Santos, manicure e pedicure, explica que foi às ruas porque “as instituições precisam pensar mais no Brasil, não somente em si”. Essa também é a opinião da advogada Áurea Brown: “Sou contra esse 'Centrão', que quer fazer 'toma-lá-dá-cá', negociata. O país se governa com a vontade do povo, e é isso que o Bolsonaro está tentando fazer”. A reforma da Previdência que o presidente tenta aprovar acaba com o modelo de repartição solidária e impõe uma transição para o modelo de capitalização individual, favorecendo os bancos.
Regiane e Áurea tinham em comum, além das opiniões, as cores verde e amarela no vestuário. Em geral, os manifestantes vestiam camisas da Seleção Brasileira de Futebol. Outros utilizavam camisetas na cor preta com o rosto do presidente em branco, ou frases alusivas a seus discursos -- entre elas, o lema “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”. Havia ainda que os ousaram se vestir com o verde-oliva dos militares brasileiros e com trajes em alusão à Polícia Militar de SP -- segundo divulgados esta semana, as mortes de civis por PMs aumentaram 15% no estado nos primeiros três meses do ano.
Ausência de parlamentares
De modo geral, os parlamentares do PSL ficaram em segundo plano, ou não foram ao ato da Avenida Paulista. Janaína Paschoal, deputada estadual mais votada no estado pela sigla, disse que não fazia “sentido quem está com o poder convocar manifestações”. O governador do estado, João Doria (PSDB), apoiador de Bolsonaro, também se isentou dos atos deste domingo.
Porém, alguns fieis escudeiros do presidente deram as caras. Os colegas de partido Major Olímpio e Carla Zambelli foram ao ato. Zambelli, que recebeu declarações de amor e ódio – foi criticada em um carro de som e exaltada por outro – pediu vaias a políticos de esquerda, em um jogo de “Sim ou Não”, sem grande sucesso.
Questionado pela reportagem do Brasil de Fato sobre o desembarque de parlamentares do ato, Olímpio disse que veio à Paulista “pelo Brasil, pelo governo Bolsonaro, pelo pacote 'anticrime'. Eu não tenho que pedir [para que os parlamentares compareçam]. Eu estou aqui pelo Brasil”, disse.
Agnaldo Duarte, taxista, criticou a ausência de mais parlamentares da base governista e de “oportunistas” como o governador de São Paulo. “O João Doria é empresário e tem os ideais dele. Já está visando algo maior, que é a Presidência. Eles têm discordâncias políticas, mas temos que ter uma mudança radical na política, e isso vem do povo. Todos eles são nossos funcionários. Quem manda somos nós”, afirmou.
A ausência de representantes do MBL e do Vem Pra Rua também foi criticadas pelos manifestantes. Além de gritos de ordem contra Kim Kataguiri e seus seguidores, cartazes faziam alusão à declaração do deputado do Zeca Dirceu (PT), ao criticar o ministro da economia Paulo Guedes [confira na foto abaixo].
Religião
Orações, cruzes e escapulários também estavam presentes na Avenida Paulista. Em um dos carros, padres fizeram discursos em defesa "da família, da moral e dos bons costumes".
Outras formas de religiosidade também eram vistas circulando entre os nove carros de som. O culto à figura do filósofo Olavo de Carvalho era renovado a cada fala, em cada carro de som. Em um deles, uma fotografia impressa em grande formato, com pouco mais de 2 metros de altura, mostrava o "guru" com um raro sorriso.
Camisetas e cartazes espalhados pelo ato com a hashtag “Olavo Tem Razão” se multiplicavam e demonstravam o clamor pelo homem que inspira Bolsonaro, mesmo morando nos Estados Unidos.
Olavo de Carvalho é considerado um dos pivôs na crise que se instalou no governo federal. O filósofo tem criticado a ala militar do governo, entre eles o vice-presidente Mourão, por sua articulação com movimentos progressistas.
Para Vander Ribeiro, auxiliar de serviços gráfico, o vice é um dos culpados pela crise institucional do governo. Segundo ele, caso organizem um impeachment contra Bolsonaro – hipótese que tem circulado nos corredores de Brasília – “aí é que o Brasil não vai para frente”. “Se fizerem o impeachment do Bolsonaro vai ser ainda pior. Se entrar o Mourão você vai ver como vai ficar... Ele não sabe dialogar”, opinou.
A esperança dos brasileiros presentes ao ato é que se concretizem as reformas, entre elas a da Previdência, para que o país volte aos trilhos. Outra aposta é a aprovação do pacote "anticrime", apesar das críticas apontadas por especialistas no tema.
Enquanto elogiavam o pacote de Moro, os manifestantes saudavam os policiais militares presentes no ato -- do alto dos carros de som e também do chão --, com direito a fotos e apertos de mão.
Por volta das 17 horas, os manifestantes começaram a se dispersar. Os carros de som foram desligados e a Paulista voltou a ser palco, ao menos por mais uma hora, de atividades culturais, caminhadas e pedaladas, como acontece em todos os domingos.
Atualizado às 20h35.
Edição: Daniel Giovanaz