Criado por lei em 1991, a partir de uma determinação constitucional, o Conselho Nacional de Previdência foi colocado à margem dos debates sobre as mudanças que o governo Bolsonaro (PSL) quer fazer nas regras da aposentadoria e que devem prejudicar a vida de milhões de brasileiros nesta e nas próximas gerações. A falta de participação popular na elaboração da proposta de reforma da Previdência é uma das críticas dos trabalhadores que participaram da Greve Geral desta sexta-feira (14).
O colegiado é formado por representantes do governo, dos empresários, dos trabalhadores e dos aposentados. Ele tem caráter deliberativo, ou seja, com poder decisório sobre a definição de políticas públicas e de questões orçamentárias, entre outros temas. Assim como centenas de outros conselhos ligados ao poder público, tem como premissa a necessidade de estabelecer o caráter democrático e descentralizado da administração, efetivando a participação popular de acordo com o previsto na Constituição de 1988.
No entanto, em linha com o pouco apreço do atual governo aos mecanismos democráticos, o Conselho da Previdência passa pela seu pior momento em 28 de existência. Desde a posse de Bolsonaro, o governo tem tomado diversas medidas para sufocar sua atuação.
Nas quatro reuniões de 2019, a reforma da Previdência entrou uma única vez na pauta, e a discussão limitou-se a uma apresentação do governo defendendo a medida provisório 06/19. Na abertura para o debate, as questões levantadas não foram respondidas.
Nas gestões Lula (PT) e Dilma (PT), dizem os conselheiros, o colegiado tinha atuação mais preponderante. Era o órgão que definia questões de grande relevância, como, por exemplo, a redução da taxa de juros dos empréstimos consignados dos aposentados.
“A narrativa hoje não está fácil. A presidência do conselho é do governo, como toda a mesa organizativa. Porém estamos na resistência. O Conselho Nacional de Previdência sempre foi um órgão superior de deliberação colegiada, que teve nos governos Lula e Dilma uma valorização muito boa e uma participação democrática e sistemática dos movimentos sociais”, disse José Ramix Pontes, conselheiro titular representando a Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares).
A estratégia do governo em isolar o conselho e afastar a opinião popular é evidente também para o conselheiro Marcos Barroso, da Confederação Brasileira dos Aposentados e Pensionistas (Cobap).
“No governo da esquerda você ainda era ouvido, talvez não fosse atendido. Nesses dois governos, Temer e Bolsonaro, você não é uma coisa nem outra. Nem ouvido nem atendido. Você participa de situações onde já vem definido o rumo de como eles querem que as coisas aconteçam”, disse.
Na reunião de fevereiro, quando o governo apresentou um resumo da reforma da Previdência, com todos os argumentos de defesa da medida sem contrapontos, o conselheiro titular Gerson de Carvalho, do Sindicato dos Trabalhadores Aposentados da CUT (Sintapi) fez oito perguntas sobre o tema, apresentando os questionamentos e dúvidas de especialistas sobre os objetivos da reforma. O conselheiro não teve os seus questionamentos respondidos.
“Desde o fim do Ministério da Previdência, decretado no governo Temer, a perda de espaço foi logo sentida, visto que quem presidia nossas reuniões era o Ministro da Previdência, e não resta dúvida que uma coisa era o ministro presidindo as reuniões, outra é o secretário de Previdência. O poder das decisões e compromissos assumidos passou a ter intermediários”, disse Gerson de Carvalho.
A Secretaria de Previdência Social informou à reportagem que quem escolhe os temas deliberativos é a presidência do Conselho, ligada ao governo federal. Questionada sobre o "esvaziamento" do Conselho, a Secretaria informou que o que houve foi uma "exposição" sobre a reforma da Previdência, por isso não cabiam contra-argumentos ou contestações dos conselheiros.
Edição: João Paulo Soares