Depois de quase três horas de discussão, foi aprovado na noite de terça-feira (18) o relatório do Congresso de Comissões ao Projeto de Lei 435/2019, de autoria da deputada Janaína Paschoal (PSL-SP), que permite que gestantes optem por fazer cesariana na rede pública, a partir da 39ª semana de gravidez, independentemente de orientação médica.
A iniciativa é condenada por entidades como o Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP) e o Núcleo de Defesa da Mulher da Defensoria Pública Estadual (Nudem).
Na sessão de terça, parlamentares do PT e do PSOL apresentaram voto contrário em separado, por considerarem que a proposta vai na contramão do que recomenda a Organização Mundial de Saúde (OMS), ou seja, cesarianas apenas com indicação médica.
Com 21 votos favoráveis e 8 contrários, o Congresso de Comissões, que reúne a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a Comissão de Finanças e Orçamento (CFO) e a Comissão de Mulheres, aprovou a emenda ao PL das cesarianas, que além da escolha da parturiente pelo método cirúrgico, seja afixada placa em maternidades e hospitais com os seguintes dizeres: “é assegurado o direito ao parto humanizado nos seguintes estabelecimentos de saúde do estado de São Paulo, nos termos da Lei 15.759, de março de 2015”.
Psol e PT também conseguiram adiar por uma semana a votação do projeto em plenário. A deputada Beth Sahão (PT) explicou que o ganho de uma semana dá um fôlego aos que são contrários ao PL, mas lembrou que basta maioria simples para aprovar matéria.
Além de uma audiência pública marcada para esta quarta-feira (19), a deputada estadual Márcia Lia (PT) disse que haverá, na próxima terça (25), uma reunião técnica sobre o assunto.
“Com pessoas que possam nos dar mais informações sobre complicações advindas do parto, da cesariana, tudo que possa subsidiar o debate do projeto. Vamos lutar com todas as nossas forças para que possamos derrubar esse projeto, porque sabemos que a OMS, os médicos conscientes, as doulas [defendem] o parto humanizado como a melhor conduta médica”.
Já a autora do PL justifica a propositura como garantia de parto humanizado.
Para a sanitarista Deborah Delage, doutora em Ciências pela Faculdade de Saúde Pública de São Paulo (FSP/SP) e doula, está havendo uma simplificação no debate entre má assistência e cesariana.
“Enquanto as mulheres tiverem acesso apenas ao serviço de saúde que não lhes trata como sujeitas, não lhes fornecem informações importantes sobre os processos de gestar, parir e cuidar das crianças; enquanto essa mulher não for protagonista, ela não fará escolhas baseadas em evidências”, acrescenta.
Na avaliação de Delage, a falta de investimento em qualificação da gestação e parto leva à escolha da cesariana, o que poderá ampliar mais as taxas de mortalidade materna.
“Nós já temos um excesso de cesarianas no país. Temos dificuldade de reduzir taxas de morbidade grave e mortalidade materna, assim como taxas de prematuridade dos bebês, justamente pelo excesso de cesarianas no país. É difícil dizer se a mortalidade materna é maior ou menor onde tem mais cesarianas, porque a mortalidade materna tem um conjunto de acontecimentos, mas certamente se tivéssemos assistência por boas práticas, isso significa também reduzir cesarianas desnecessárias, teríamos redução paulatina da nossa razão de mortalidade materna”.
Na mesma linha, Sahão defende que os recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) sejam para aprimorar e facilitar o parto normal.
“O acompanhamento de parto, as condições de informação das parturientes, criar mecanismos que possam facilitar o parto normal, como [o acompanhamento da mulher por] educadores físicos, orientação à ginástica, a uma alimentação adequada e tudo que ajuda na dilatação, que reduz as dores das contrações”, cita a deputada.
Entenda a proposta
O PL 435/2019 estabelece que “seja garantida à gestante a possibilidade de optar pelo parto cesariano a partir da trigésima nona semana de gestação, bem como a analgesia, mesmo quando escolhido o parto normal".
A parlamentar afirmou em suas redes sociais que "não tem nada contra o parto normal, não tem nada contra o parto natural, mas tem tudo contra o desejo de impor convicções de umas poucas pessoas às demais. Ousa-se dizer, à maioria”.
Um requerimento pedindo urgência para a tramitação do projeto, feito pela própria Janaína, acabou aprovado - o que eliminou no debate da matéria em comissões importantes na Casa, incluindo a de Saúde.
Edição: João Paulo Soares