A família do sem-terra José Valmeristo Soares, o Caribé, espera há quase dez anos o julgamento dos quatro homens acusados pelo seu assassinato. Eles cometeram o crime em setembro de 2010, em Santa Luzia do Pará (PA). Antes de matar Caribé, os criminosos o torturaram. O camponês João Batista Galdino também foi torturado, mas conseguiu escapar com vida. Irmão do deputado Paulo Bengtson (PTB), Marcos Bengtson é acusado de ser o mandante do crime. Ele chegou a ser preso na época, mas foi liberado devido a um habeas corpus concedido pelo Tribunal de Justiça do Pará meses depois. Desde então, responde ao processo em liberdade.
Advogado da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos, Nildon Deleon Garcia da Silva afirma que os réus sequer foram pronunciados, momento em que a acusação faz suas considerações finais antes de o caso ser levado efetivamente a júri. Ele aponta uma morosidade seletiva no julgamento de crimes cometidos por fazendeiros contra camponeses. Procurado por meio da assessoria de imprensa, o Tribunal de Justiça do Pará não se manifestou sobre as causas de lentidão nem sobre o tempo médio de demora para os julgamentos dos crimes de homicídio no estado.
A lentidão, segundo Nildon, se repete no julgamento da posse da terra que provocou o conflito. Os sem-terra ocupam parte da Fazenda Cambará desde a década anterior. Segundo eles, as terras da gleba Pau D’Arco são públicas e foram griladas pela família Bengtson. O advogado afirma que o pai de Paulo e Marcos, o ex-deputado Josué Bengtson, chegou a apresentar um título de posse. “Além da dúvida quanto à legalidade do documento, existe um problema na localização exata do terreno a que ele se refere”, afirma.
O documento se refere a 1,8 mil hectares dos mais de 7 mil da gleba. A área onde os camponeses estão, para ele, é devoluta. Os ocupantes acompanham esse processo para ter a sua situação regularizada. Para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ao menos 300 famílias podem ser assentadas no local.
Marcos mandou destruir demarcação de terras
Antes do crime, os camponeses já haviam denunciado a ação de grileiros ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e as ameaças feitas por pistoleiros. Segundo o MST, outros ataques foram cometidos após o assassinato de Caribé. Em um deles, em outubro de 2015, dois jovens foram vítimas de uma emboscada. Um deles levou um tiro de raspão e o outro foi ferido com coronhadas no rosto. O movimento afirma que, após a ação de reintegração de posse ter sido negada em 2014, o Incra realizou vistoria na área. Dias depois, a demarcação feita pelo órgão foi destruída a mando do fazendeiro.
Marcos é o administrador da fazenda, propriedade de Josué, ex-deputado condenado à perda do mandato por enriquecimento ilícito. Isto por causa de sua participação na máfia das ambulâncias, um grande esquema de corrupção que desviou R$110 milhões destinado à saúde pública e que envolveu empresários, ex-funcionários de instituições e políticos de dez partidos diferentes. Além de político e pecuarista, Josué é pastor da Igreja Quadrangular. Em 2014, ele declarou à Justiça Eleitoral a propriedade de 4 mil hectares de terras, além de três caminhões, dois tratores, uma roçadeira, um avião e R$ 1 milhão em dinheiro vivo.
Como está inelegível, Josué escolheu Paulo para ser seu sucessor em Brasília. Foi o principal doador individual de sua campanha, com R$ 32 mil. O próprio Paulo, que era vereador em Belém e também é pastor, entrou com outros R$ 30 mil. A principal fonte de renda declarada na campanha foi o diretório nacional de seu partido. Hoje, Paulo, que está em seu primeiro mandato na Câmara, é o secretário da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), grupo que reúne, no Congresso, deputados e senadores da bancada ruralista.
Edição: De Olho Nos Ruralistas