Em 2019, os venezuelanos celebraram o centenário de morte do médico José Gregório Hernández criando o movimento nacional de deficientes físicos com seu nome. A homenagem ao "médico dos pobres" se tornou a primeira agrupação nacional criada por pessoas com deficiência física na Venezuela.
Maria Gabriela Vega é uma das fundadoras do movimento e comenta que a ideia existe há 10 anos e busca unificar uma série de comitês que militaram nos últimos anos, dentro da Revolução Bolivariana, pelos direitos das pessoas com deficiência e seus familiares.
“Nós nos demos conta de que cada política que o governo concedia para algum dos grupos se dirimia os recursos, porque não havia um movimento único que agrupasse as pessoas com deficiência e definisse qual era a necessidade de cada pessoa desde seu espaço de trabalho e moradia”, afirma a advogada.
Estima-se que existam hoje 1,8 milhão de pessoas com deficiência física no país. Todas fazem parte de um censo social, recebem apoio de jornadas técnicas e um bônus mensal da Missão governamental José Gregório Hernández.
Criada em março de 2008, pelo presidente Hugo Chávez, a Missão José Gregório Hernández atende cinco estados venezuelanos realizando diagnósticos e estudos médicos completos e distribuindo equipamentos de apoio, como muletas, cadeiras de roda, bastões, colchões ortopédicos, macas, entre outros.
A Missão afirma ter distribuído 16 mil artigos médicos, visitando 620 mil lares e atendido a mais de três milhões de pessoas apenas em 2019.
História
Há 20 anos, Chávez incluiu o artigo 84 na Constituição, que prevê que o Estado garantirá respeito e dignidade, com equiparação de oportunidades, condições de trabalho satisfatórias e promoverá a formação e acesso ao emprego.
Em 2006, foi aprovada a Lei para Pessoas com Deficiência, logo depois de que o governo bolivariano, junto com outras 84 nações, assinou a Convenção das Nações Unidas sobre os direitos das pessoas com Deficiência.
“Com a lei atual já conseguimos uma atuação política e protagonista das pessoas com deficiência. A ideia é de que com o movimento tenhamos um salto organizativo político e um salto qualitativo no aspecto econômico na vida de cada pessoa”, garante Vega.
Já no governo Maduro foi criada a Fundação José Gregório Hernández para promover programas sociais, planos ou projetos políticos voltados a essa população. Daí saiu o Centro de Genética e a proposta de criação do bônus, de mesmo nome, em janeiro do ano passado.
O Centro Nacional de Genética Dr. José Gregório Hernández realiza estudos cromossômicos e presta apoio neuropsiquiátrico, além de realizar exames de avaliação de riscos durante o pré-natal em mulheres que possuem alguma deficiência e estão grávidas.
Maria Gabriela da Vega reconhece as conquistas dentro do chavismo, mas não esconde as dificuldades. “O grande desafio até aqui tem sido alcançar nossa independência, poder estar presentes no cotidiano do país, superar todas as barreiras de aptidão que para muitos poderia converter-se num tabu e ajudava a conformar um gueto”, conta.
Pelos avanços nos últimos dez anos, a Venezuela recebeu menção honrosa na 168ª Conferência da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em maio do ano passado.
Representação política
Atualmente existem cinco deputados constituintes com algum tipo de deficiência física exercendo seu cargo na Assembleia Nacional Constituinte (ANC). Graças a sua militância, foi criada a Comissão Permanente para Pessoas com Deficiência.
O grupo tem o propósito de criar espaços de inserção social e laboral para as pessoas com alguma deficiência. Além, é claro, de organizar o setor para propor mudanças na legislação atual sobre os deficientes, promulgada em 2007.
A proposta é que com ajustes na lei atual se avance na inserção laboral das pessoas com deficiência física e seus familiares. Maria Gabriela Vega é vice-presidenta da comissão e afirma que o fato de, pela primeira vez, a Constituição venezuelana ter na sua redação leis voltadas para pessoas com deficiência é um grande avanço.
“Nos governos da Quarta República [1958 – 1998] éramos vistos como coitados, tratavam-nos com tom sensacionalista, com lástima de pessoas que viveriam suas vidas com alguma deficiência”, relembra Vega.
No entanto, a constituinte também alerta para o risco de cair em políticas assistencialistas. Por isso a comissão permanente da ANC pretende ampliar a lei para deficientes físicos pensando na autonomia econômica dessa população.
“Um dos maiores avanços é a inserção laboral, além da atenção aos familiares, porque entendemos que muitos pais, mães ou familiares diretos vivem dedicados exclusivamente ao cuidado, quando é uma deficiência severa e sua família não tem condições de trabalhar. Estamos projetando a criação de uma pensão para cobrir as necessidades básicas dessa família. Por outro lado também pensamos em dar assistência para que as pessoas que possam ingressar no mundo do trabalho o façam”, finaliza a deputada constituinte.
Edição: Pedro Ribeiro Nogueira