Em 2015, quando o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff já estava de porta escancarada, o PMDB lançou documento intitulado “Ponte para o Futuro”. Um conjunto de propostas para, supostamente, tirar o país da crise econômica e política que vinha se aprofundando cada vez mais. Era o programa do PMDB já prevendo um provável governo através da concretização do golpe. A série de medidas, selvagemente neoliberais, significava um estrangulamento de direitos sociais conquistados. Entre as propostas estava a eliminação de leis trabalhistas e a privatização do ensino médio. O espírito da “Ponte para o Futuro” reaparece no presente com o governo atual, revestido com a roupagem violenta do governo Bolsonaro, repete-se como uma tragédia.
Contudo, não é de hoje que o PMDB apresenta documentos contendo um programa de governo para o país em um momento de transição. Em janeiro de 1985, após mais de vinte anos de repressão, censura e violência da Ditadura Civil-Militar, iniciada com o golpe de 1964, Tancredo Neves derrotou Paulo Maluf e foi eleito, através de eleições indiretas, o primeiro presidente civil. O Jornal do Brasil, de 7 de janeiro de 1985, trouxe uma reportagem cujo título dizia “PMDB leva o plano da ‘Nova República’ para Tancredo Neves”.
Dias antes das eleições, Tancredo Neves, recebeu o documento, afirmando que seria o roteiro do seu possível governo e, a partir dele, cunhou o termo “Nova República” para denominar o período histórico que se iniciava. Apesar de ter ficado conhecida como a “década perdida”, devido a crise econômica que abatia o país, causando alta inflação e aumento do desemprego, o quinto ano da década de 1980, trouxe também um sopro de esperança. Em 11 de janeiro de 1985, quatro dias antes da eleição de Tancredo, a escritora Ana Maria Machado publicava um texto no Jornal do Brasil. “Na dança da esperança” conclamava o país para uma festa da democracia.
No discurso que fez para a Câmara dos Deputados, após ser eleito, o novo presidente se apossou do espírito da época, “Tancredo promete mudanças profundas e irreversíveis” dizia a manchete do Jornal do Brasil. Falando para os deputados, convocou o país para um “grande mutirão nacional” destacando que “A cidadania não é atitude passiva, mas ação permanente em favor da comunidade”. Tancredo Neves não viveu para tentar realizar as mudanças profundas, faleceu na véspera de sua posse, mas sua figura representou um ano da esperança naquela “década perdida”. De lá para cá a República variou de esperança. O ideal que Tancredo nos deixou, não foi a necessidade de um líder, foi que para renovar a democracia precisamos de um "mutirão", como convocou em seu discurso, um "mutirão" liderado pelo povo.
*Leonardo Cruz é historiador
Edição: Marcos Barbosa