Campo

Programa promete alavancar Agricultura Familiar no RN

Projeto beneficia 90 mil famílias agricultoras; número pode crescer com regularização de novas famílias ao programa

Brasil de Fato | Natal (RN) |
Movimentos Sociais participaram da elaboração do projeto de lei
Movimentos Sociais participaram da elaboração do projeto de lei - Wigna Ribeiro

Foi sancionada pela governadora Fátima Bezerra (PT) a lei estadual 10.536/2019, que cria o Programa Estadual de Compras da Agricultura Familiar e Economia Solidária – Pecafes. O programa determina que pelo menos 30% das compras governamentais de gêneros alimentícios tenham essa origem.
A lei, aprovada por unanimidade na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte (ALERN), tem autoria da deputada estadual Isolda Dantas (PT) e tem a finalidade de garantir a aquisição direta e indireta de produtos agropecuários, extrativistas e resultantes da atividade pesqueira, in natura e beneficiados, produzidos por agricultores e agricultoras ou suas organizações socioeconômicas rurais, por povos e comunidades tradicionais e pelos beneficiários e beneficiárias da agricultura familiar. 
Segundo a deputada, "o Pecafes promoverá desenvolvimento sustentável para o estado, renda e trabalho para agricultoras e agricultores familiares e soberania alimentar para o povo potiguar”. Sobre soberania alimentar, ela defende que passa pelo incentivo à agricultura familiar, que produz alimentos saudáveis, de procedência conhecida e livre de agrotóxicos.
Em relação à geração de trabalho e renda, Alexandre Lima, secretário de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar (Sedraf), afirma que o programa vai viabilizar a abertura de um mercado de mais de 20 milhões de reais para a agricultura familiar do estado em 2020. Alexandre frisou que “isso é fundamentalmente acreditar que homens e mulheres do campo, que compõem esse importante segmento, são estratégicos para a economia do Rio Grande do Norte. É acreditar que, através da agricultura familiar, é possível reverter e dinamizar a economia local”.    
No RN, entre os dez principais produtos alimentícios provenientes da agropecuária, o setor da agricultura familiar corresponde à maior parte do total produzido: 90% de arroz em casca; 86% de feijão; 83% de milho em grão e 75% de suínos. Em meio a esta produção, se possibilita o desenvolvimento da economia solidária, de auto gestão de pequenas e pequenos produtores que contribuem para a democratização econômica.    
Segundo o secretário Alexandre, “já está mais do que comprovado que as políticas de compra governamentais organizam e muito o processo produtivo, porque o grande gargalo da agricultura é onde vender, e você tendo o Estado como grande comprador, tem uma garantia que, ao produzir, vai ter um mercado em potência”. Para Fátima Torres, da Central de Comercialização da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Cecafes), a agricultura familiar produz em quantidade e qualidade. "Se a gente tiver mercado, garantimos a distribuição da nossa produção e o Pecafes proporcionará isso”, aponta. 

Proposição da Lei    
No dia 03 de julho de 2019, durante a cerimônia de sanção da lei por parte da governadora Fátima Bezerra, a deputada Isolda, ressaltou que ela é fruto da luta das e dos agricultores. “Essa luta começou há muito tempo, da agricultura familiar pela sobrevivência e pela qualidade de vida e permanência do homem e da mulher no campo. Para estarmos aqui hoje fizemos muitos diálogos com a Sedraf, agricultores, movimentos. Foi um projeto feito a muitas mãos”, declarou Isolda.     
Segundo a deputada, foram realizados diversos espaços de escuta e debate que proporcionaram a inclusão de propostas de emenda ao projeto de lei e a sistematização de sugestões a serem aprofundadas e debatidas posteriormente, visando a regulamentação da lei e a antecipação e eliminação de possíveis entraves no processo de implementação do Pecafes pelo poder executivo. 
Esses espaços de debate e escuta culminaram com a realização da Audiência Pública “A agricultura Familiar e as Compras Governamentais no RN”, em maio de 2019, que contou com ampla participação de agricultores e agricultoras, cooperativas, organizações, sindicatos, movimentos sociais, órgãos do governo.
Durante a audiência, em sua fala, o secretário Alexandre Lima revelou que o estado chega a comprar cerca de 200 milhões de reais em alimentos e que é fundamental que essa verba se direcione à agricultura familiar e afirmou que o Pecafes possibilitará o crédito para quem trabalha no campo e organizará, também, os trabalhadores rurais, mudando os rumos da economia e da agricultura familiar do RN. 

Mulheres são um dos grupos beneficiados pelo programa. Foto: Wigna Ribeiro.

Aquisição de alimentos 
O Pecafes determina que os produtos sejam selecionados por meio de chamada pública paralela. Para serem comercializados junto ao governo e seus fornecedores, as organizações produtoras precisam possuir a Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (DAP) ou outros documentos definidos pela Sedraf. Entre as organizações produtivas, serão priorizadas as constituídas predominantemente por mulheres, jovens, comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas.
Rejane Medeiros, do Centro Feminista 8 de Março, destacou que: “na agricultura familiar estão homens e mulheres e o programa será muito feliz em priorizar a produção das mulheres, visibilizando o trabalho que elas fazem”. 

Segurança Alimentar
O Programa será destinado a atender hospitais públicos, estabelecimentos prisionais, refeitórios escolares, dentre outros, garantindo alimentos de qualidade a pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional.
Ricardo  Andrade Bezerra, nutricionista e professor universitário, pesquisa sobre alimentação no ambiente escolar. Segundo ele, “a alimentação na escola deve ser promovida para garantir a qualidade e quantidade mínima de alimento diário para o consumo do estudante e já se sabe que a boa alimentação na fase escolar está relacionada com o desenvolvimento cognitivo e tem impacto no estado nutricional, lembrando que muitos dos escolares que fazem consumo diário da merenda escolar estão em uma faixa socioeconômica vulnerável”.
Para Ricardo “a proposta de alimentação orgânica nas escolas é uma ótima estratégia para proporcionar uma alimentação livre de contaminantes, no caso dos agrotóxicos que estão presentes no nosso dia a dia, impostos pela indústria alimentícia e que consumimos sem controle e muitas vezes sem mesmo saber.” O pesquisador afirma que “o consumo dos agrotóxicos já tem reflexo conhecido sobre o aparecimento de diversas doenças e atualmente estão fortemente liberados no nosso país”. Ele denuncia a liberação de mais de 250 agroquímicos por parte do governo Bolsonaro.

Comitê Gestor
A lei determina a constituição de um Comitê Gestor do Programa Estadual de Compras Governamentais da Agricultura Familiar e Economia Solidária (PECAFES) no Rio Grande do Norte, com o objetivo de acompanhar e monitorar a implementação e gestão das ações correlatas às compras governamentais, tendo uma composição paritária: 50% da sociedade civil, 50% composta de representação do Governo do Estado do Rio Grande do Norte. A regulamentação será realizada por parte do Governo (Poder Executivo), na mesma lógica do diálogo utilizada na construção e propositura da lei, levando em consideração os espaços de escuta, debate e as sugestões propostas ao longo de todo esse processo.
 

Edição: Marcos Barbosa