O presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, sabia das negociações do acordo firmado com o Brasil sobre Itaipu e ainda pediu para que não se "polemizasse" sobre o texto e se "guardasse silêncio". A informação consta de uma série de mensagens de WhatsApp vazadas e reveladas nesta terça-feira (6) pelo jornal paraguaio ABC Color, e aumenta a temperatura da crise política no país.
Nas mensagens, trocadas entre Abdo e Pedro Ferreira, então presidente da Ande (Administração Nacional de Eletricidade), aponta-se que o governo brasileiro pressionava para o cumprimento do acordo, assinado em maio e tornado público somente há duas semanas. O documento previa elevar os custos para a empresa paraguaia em mais de 200 milhões de dólares.
Os termos da ata levaram à renúncia do então ministro das Relações Exteriores, Luis Castiglioni, e do embaixador paraguaio no Brasil, Hugo Saguier. Importantes funcionários do setor de energia do país vizinho também pediram demissão do cargo: o titular paraguaio da usina hidrelétrica de Itaipu, José Roberto Alderete, e o atual presidente da Ande, Alcides Jiménez, que havia assumido o cargo poucos dias antes com a renúncia de seu antecessor (Ferreira), também por discordâncias em relação ao pacto.
“Guarde silêncio”
Mesmo com os alertas de Ferreira de que o pacto poderia ser prejudicial ao Paraguai, e em meio às pressões do Brasil, Abdo diz que “é preciso fazer isto passar”. “Guardar silêncio, não polemizar”, afirmou. Assim, o presidente deixa claro que quer seguir a linha de negociações defendida pela equipe diplomática do país, não obstante os avisos de que o acordo poderia impactar desfavoravelmente a Ande.
Nas conversas, fica clara a pressa de Abdo em encerrar as negociações do acordo. “Temos que passar esta crise e que Itaipu financie o que Ande necessitar. Tem que passar isso. E depois vemos. Fazê-lo com sabedoria. Estamos em momentos difíceis. O Brasil congelou relações conosco por não cumprir o que firmamos”, escreveu, em resposta a reclamações de Ferreira de que o acordo traria prejuízos ao Paraguai.
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O presidente paraguaio usa o argumento de “movimentar a economia” para justificar a pressão, mesmo com os alertas de Ferreira. “Pedro, acelere a solução. Ande, Eletrobras, está tudo parado. Temos que movimentar a economia. Não se pode ganhar tudo em uma negociação.”
Abdo também deixa claro o que, para ele, seria uma negociação. “Ao se negociar, sacrificam-se posições, e até, algumas vezes, princípios”, disse. “Mas é a responsabilidade que temos hoje. Não ache que faço tudo o que quero. Todos os dias tenho que digerir tragos amargos. Mas o país está hoje em nossas mãos. E creio que está nas melhores mãos. Força”, afirmou a Ferreira.
Presidente insiste que não sabia
Em entrevista nesta manhã, Abdo disse, no entanto, que não sabia o que estava na ata. “Não sabia o quanto havia na ata e nem sobre o que estava se tratando. Quando começa a polêmica, pedi ao chanceler que viesse, nos reunimos no domingo, e ali, pela primeira vez, pedi que viessem todos aqui e os disse: ‘Expliquem-me o que acontece nesta ata’. É aí quando começo a avaliar ponto a ponto”, disse.
“Eu sabia a linha seguida pela chancelaria, fazia o que me dizia meu secretário de Estado [Castiglioni], a quem o deleguei esta missão. Uma vez que chega às altas partes, delego à Chancelaria, espero que a Chancelaria realize uma avaliação da proposta. E recebo isso de Luis Castiglioni como uma proposta benéfica ao Paraguai”, afirmou.
Impeachment
Antes mesmo da reportagem do ABC Color, o Partido Liberal Radical Autêntico (PRLA) havia confirmado na segunda (5) que as legendas de oposição apresentariam um novo pedido de impeachment contra Mario Abdo.
O pedido incluirá não só o presidente, mas também o vice-presidente, Hugo Velázquez, e o ministro da Fazendo, Benigno López.
Nesta terça, diante das revelações do ABC Color, o presidente do Congresso, senador Blas Llano, disse que o “juízo político” - em outras palavras, o impeachment de Abdo - deve ser tratado “o quanto antes”.
“Com respeito ao juízo político, insto que seja tratado e resolvido o antes possível no sentido que for. Estou convencido de que a República necessita recuperar sua estabilidade política”, afirmou à imprensa.
Edição: Opera Mundi