Rumores sobre a privatização da Eletrobras, que começou a ser desenhada no governo de Michel Temer (MDB), voltaram a ganhar força na gestão Bolsonaro (PSL). Segundo aliados, o governo estaria finalizando os estudos para a venda da estatal, o que muito possivelmente levaria a um aumento na tarifa de energia elétrica.
A venda da companhia, parte do programa de Bolsonaro, está atrasada -- o Planalto chegou anunciar que divulgaria o plano para a privatização antes de agosto. Parlamentares e sindicalistas que acompanham o tema, entretanto, afirmam que a questão em torno da tentativa de venda por parte do governo nunca foi “se”, mas sim “quando e como”.
Para a população, a privatização deve acarretar aumento da tarifa. Não só porque a Eletrobras constrói infraestrutura de forma mais barata (o que impacta na tarifa final), mas também por conta de uma alteração na política de preços que deve acompanhar a tentativa de privatização.
“Há um item [na discussão da privatização] que coloca a energia, que hoje é vendida pela Eletrobras como a mais barata do país, voltando a ser comercializada por preço de mercado. É uma forma de atrair investidores [possíveis compradores], com a entrada maior de receita sem nenhum investimento, simplesmente com a mudança de legislação”, critica Fabiola Latino Antezana, diretora do Sindicato dos Urbanitários do Distrito Federal (STIU-DF).
Uma alteração regulatória de 2013 estabeleceu que a energia gerada em estruturas do parque elétrico cujos investimentos já haviam sido pagos ao longo de quase três décadas, deveria ter seu valor cobrado apenas levando em consideração os custos de operação e manutenção, excluindo o retorno dos investimentos.
O resultado de tal política, que deve ser revertida em caso de privatização, é que hoje a Eletrobras cobra R$ 60,00 por MW/h. As empresas privadas, que praticam o preço de mercado, cobram em média R$ 240 MW/h. Em caso de privatização da Eletrobras, portanto, o consumidor final estaria pagando muito além do que apenas os custos para a manutenção do serviço.
Passo a passo do desmonte
Antes de apresentar publicamente a proposta final, o governo deve consultar os presidentes da Câmara e do Senado para avaliar a receptividade do Congresso. Há questões jurídicas envolvidas, por conta da decisão do STF que liberou a venda de subsidiárias sem licitação e autorização legislativa, mas vedando tal fórmula para empresas-mãe.
Ikaro Chaves, engenheiro da EletroNorte e também diretor do STIU-DF, afirma que o sistema Eletrobras é, na verdade, todo composto por subsidiárias, mas que a decisão do Supremo não é o único elemento no debate.
“A Eletrobras em si não tem nenhuma usina. Ela é um holding. [Apesar disso] ela não se aplica a Eletrobras nem às suas subsidiárias”, diz. Isso porque uma lei do início dos anos 2000 retirou explicitamente tanto a empresa-mãe quanto suas subsidiárias do Programa Nacional de Desestatização. A norma continua válida, o que significa que, na prática, vender as subsidiárias necessitaria de autorização congressual, através da mudança de lei.
Um modelo que o governo estuda é repassar as subsidiárias para a Eletropar, abrir e ampliar seu capital social, o que significaria perda de controle acionário. Para sindicalistas e para oposição, pela lei mencionada, o mecanismo seria uma manobra ilegal.
Além das questões jurídicas, qualquer que seja o formato adotado, venda por leilão ou perda de controle acionário via bolsa de valores, o impacto imediato poderia ser sentido pela economia nacional. Recentemente, o governo Bolsonaro determinou que R$ 13 bilhões em dividendos da estatal fossem distribuídos aos acionistas, incluindo o próprio Estado, em busca de caixa. Sem ter o voto majoritário no Conselho de Administração, essa possibilidade se perde.
Parlamentares ouvidos pelo Brasil de Fato consideraram difícil estimar em que momento a questão da privatização será encaminhada pelo governo, já que há outros temas na agenda do governo. Após a votação da reforma da Previdência, já se fala na tributária. Além disso, o próprio Ministério de Minas e Energia tem ao menos outras duas questões em seu radar: a venda de ativos da Petrobras e a questão da mudança de normas relativas à mineração.
Alguns deputados avaliam que o tema também é polêmico e deve apresentar resistência. “Se está dando lucro, argumento de eficiência não me convence”, resumiu à reportagem o deputado federal Pedro Uczai (PT-SC).
Edição: Pedro Ribeiro Nogueira