“Sou a favor da reforma agrária, da agroecologia, da agricultura familiar e de tudo que se faz aqui”, disse Odair José minutos antes de entrar no palco e se apresentar para centenas de participantes da 18ª Jornada de Agroecologia. O evento acontece em Curitiba entre os dias 29 de agosto e 1º de setembro e reúne agricultores de todo país em defesa de outro modelo de agricultura.
Durante o show na Praça Santos Andrade, no centro da capital paranaense, o cantor e compositor apresentou suas músicas mais conhecidas e as faixas de seu novo disco “'Hibernar na casa das moças ouvindo rádio”, lançado este ano. Ao longo da apresentação, Odair se manifestou em defesa da democracia e da diversidade.
Em entrevista ao Brasil de Fato, o cantor afirmou que o país está enfrentando um de seus piores momentos.
“A democracia está mutilada no Brasil. Ela vinha tão bem... começamos a ter governos democráticos. Mas veja o que aconteceu com o presidente Lula. Isso é uma injustiça, um golpe, um preconceito. No momento não existe democracia no Brasil”, ressaltou.
Para Odair, em momentos de retrocesso a arte não pode permanecer omissa. “Não se pode fazer perseguições políticas, usar julgamentos parciais para chegar ao poder. Para mim foi o que aconteceu”, disse, em referência à prisão do ex-presidente.
“Se depender de mim, que é pouca coisa, vou falar isso por aí. Quero ser o despertador na mente dessas pessoas que estão sendo manipuladas por alguns setores da mídia e da sociedade”.
Confira a entrevista na íntegra.
Brasil de Fato - O que te motiva a estar aqui nesta noite, participando da 18ª Jornada da Agroecologia? Para o senhor, qual a relevância desse espaço?
Odair José - Esse evento é de maior importância. Estou feliz em participar. É a primeira vez que participo cantando mas sempre acompanho. Eu acompanho a reforma agrária no Brasil desde a época do João Goulart, sou a favor da reforma agrária, da agroecologia, da agricultura familiar e de tudo que se faz aqui. Sou a favor do produto limpo, isso é o melhor para a humanidade. Acho uma sacanagem tentarem brecar isso. Eu venho na esperança de estar ajudando um pouco.
O Brasil passa por um cenário político conturbado, com a retirada de muitos direitos sociais, e, inclusive com a paralisação da reforma agrária. Qual o papel da arte em um contexto como esse?
Evidentemente cada pessoa tem o direito de não fazer nada ou de fazer aquilo que acha que tem que fazer. Mas eu vejo que a arte não pode ser omissa. Não podemos ficar em uma zona de conforto achando que está em um arco-íris.
Se quem faz arte não sabe, tem que saber. A arte tem que participar das coisas do seu tempo. Eu sou um compositor e não posso, nesse momento, escrever algo como se estivesse tudo bem. Eu não me sinto bem fazendo isso. Eu procuro fazer música, subir no palco, de uma forma que o meu trabalho tenha relevância para o momento pelo qual meu país passa. E esse momento é péssimo. A arte tem obrigação de saber fazer essa leitura.
Quais são os principais problemas que enxerga nessa conjuntura, com o governo Bolsonaro?
Olha, tenho 71 anos de idade. Vi o que aconteceu em 1964. Morei no Rio de Janeiro em 1968, participei de muita coisa ligada à resistência naquele momento.
Acho que estamos vivendo uma época muito difícil, muito triste. Na minha opinião, sem querer ser pessimista, talvez seja uma das piore épocas que já vi.
A democracia está mutilada no Brasil. Ela vinha tão bem... começamos a ter governos democráticos. Mas veja o que aconteceu com o presidente Lula. Isso é uma injustiça, um golpe, um preconceito. No momento não existe democracia no Brasil.
A alternância de poder é necessária. O que não se pode é existir perseguição política, usar julgamentos parciais para chegar ao poder. Para mim foi o que aconteceu. Se depender de mim, que é pouca coisa, vou falar isso por aí. Quero ser o despertador na mente dessas pessoas que estão sendo manipuladas por alguns setores da mídia e da sociedade.
Qual a perspectiva para o próximo período, tanto para a arte quanto para a política?
Estamos vivendo um grande retrocesso no mundo... Por conta de Donald Trump, Boris Johnson. Não sei porque o Brasil resolveu seguir isso. Não vai ser bom.
As pessoas têm que entender o seguinte: Se o povo estiver bem, não tem como a elite estar. A elite só vai ser uma classe privilegiada se a outra ponta estiver mal.
Durante a Jornada, houve a apresentação de muitos artistas populares. Eles identificam que o lugar da arte é no front da resistência. Além dos agricultores, quilombolas e indígenas, outro grupo que esse governo odeia muito são os artistas. É um momento de se aproximar aos movimentos populares?
Eu estou aqui hoje com o MST, na Jornada de Agroecologia, porque acredito que temos que nos misturar com esse tipo de comunidade. Você citou que o governo atual também é contra arte... ainda bem! Tudo que eles metem a mão, atrapalham mais ainda.
Edição: Daniela Stefano