O cônsul da Venezuela em São Paulo, Manuel Vadell, afirmou nesta sexta-feira (13) que qualquer tentativa de intervenção contra o país latino-americano não terá sucesso. A fala ocorreu durante uma cerimônia no consulado venezuelano, onde movimentos sociais entregaram um abaixo-assinado em solidariedade ao governo de Nicolás Maduro e contra o bloqueio econômico imposto pelos EUA.
“Confiamos no direito internacional. Qualquer tentativa de intervenção será derrotada. A Venezuela está preparada para se defender. Como nosso chanceler [Jorge Arreaza] e nosso presidente disseram, a Venezuela nunca atacará nenhum país e nem violará sua soberania. Mas nos defenderemos de qualquer um que tentar nos violentar. O mundo conseguirá falar mais alto que quatro ou cinco países intervencionistas e lacaios do imperialismo”, afirmou o representante diplomático.
Vadell condenou ainda a reunião de ministros dos países que fazem parte do Tratado Interamericano de Assistência Mútua (Tiar) para discutir a ativação do pacto, aprovada na última quarta-feira (11) pela Organização dos Estados Americanos (OEA). A medida possibilitaria tanto o aumento de sanções econômicas contra a Venezuela, quanto uma intervenção militar.
“Esse é um novo capítulo dos ataques contra a Venezuela. Agora, com a tentativa de aprovar o Tiar, os países estão colocando, de fato, a possibilidade de uma ameaça militar na mesa. Estão tentando criar um argumento jurídico para uma intervenção militar. Nesse século é um absurdo os EUA tentarem intervir na Venezuela ou usarem um país vizinho como detonante para uma intervenção", disse Vadell.
O abaixo-assinado entregue aos representantes venezuelanos faz parte da campanha mundial #NoMoreTrump, que recolhe assinaturas para encaminhá-las ao Secretário Geral da ONU, António Guterres.
No Brasil, a campanha foi encabeçada pelo Comitê Brasileiro pela Paz na Venezuela, Alba Movimentos, e outros grupos de solidariedade ao país caribenho. Os grupos conseguiram reunir cerca de 2.250 assinaturas.
“Para além do número, foi importante conversar com a população. Percebemos que quase ninguém conhece o bloqueio e o que ele significa. Em 30 segundos de conversa com as pessoas, falando minimamente sobre o assunto, elas já ficavam chocadas em saber sobre os impactos das sanções”, afirmou o integrante da Alba Movimentos, Giovani Del Prete.
De acordo com ele, Trump mantém uma política de ódio e guerra. "Percebemos que quando conversamos sobre a pauta da Venezuela, que é tabu pra muita gente, afirmando que é um abaixo assinado contra o Trump, as pessoas já vinham assinar”.
Além do abaixo-assinado, o Comitê Brasileiro pela Paz na Venezuela entregou um documento repudiando a resolução da OEA para ativar o Tiar. O texto foi assinado por instituições e personalidades, entra elas o ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e a presidenta do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffman.
Tensões na fronteira com a Colômbia
Além dos bloqueios, nas últimas semanas a Venezuela enfrenta a escalada das tensões com a Colômbia. Bogotá acusa o governo Maduro de estar acolhendo e financiando guerrilheiros colombianos. Caracas, por outro lado, afirma que grupos paramilitares colombianos estão atuando ilegalmente em sua fronteira. As tensões fizeram com que a Venezuela declarasse, em 3 de setembro, alerta laranja.
As tensões aumentaram de vez quando 12 dos 18 países-membro do Tiar votaram a favor do projeto apoiado pelo Brasil, Colômbia, Estados Unidos e pelo “governo encarregado” da Venezuela, liderado pelo autoproclamado presidente interino Juan Guaidó.
O documento alega que “a crise na Venezuela tem um impacto desestabilizador, representando uma clara ameaça à paz e à segurança no hemisfério”.
Segundo Lígia Fernandes, secretária de Relações Internacionais da União da Juventude Comunista (UJC), a articulação intervencionista feita via OEA preocupa, sobretudo com relação à situação da Venezuela. "Vimos que outra nação irmã, como a Colômbia, também se coloca a favor de uma intervenção, para além de todo o bloqueio criminoso encabeçado pelos Estados Unidos”, lamenta.
Ainda de acordo com ela, “a Venezuela incomoda muito internacionalmente por ter conseguido alcançar seus objetivos de caminhar por meio da Revolução Bolivariana para um processo maior de emancipação da classe trabalhadora, um trabalho maior de direitos do povo trabalhador. Por isso incomoda tanto”.
Confira na íntegra o abaixo-assinado que faz parte da campanha #NoMoreTrump:
CARTA DOS POVOS DO MUNDO AO SECRETÁRIO GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS
Como Vossa Excelência certamente conhece, dada sua honrosa e enorme responsabilidade, o governo dos Estados Unidos tem empreendido unilateralmente, com o apoio de governos adeptos e de minorias políticas da Venezuela, uma série de planejadas e ardilosas agressões econômicas, políticas e psicológicas contra a população venezuelana, com a finalidade de produzir “uma mudança de regime”, que em termos reais não é outra coisa que derrubar o governo que, no exercício dos direitos soberanos elegeram os venezuelanos e as venezuelanas em eleições livres, universais e secretas; conforme as suas leis e no exercício de sua autodeterminação como nação.
Iniciadas em 2015, na gestão do presidente Obama, com a emissão da infame Ordem Executiva segundo a qual a Venezuela, seu povo, representa “uma ameaça incomum e extraordinária” para a segurança dos EUA, que é precisamente a potência militar mais perigosa que a humanidade tenha conhecido, a mesma que em somente sessenta anos tem propiciado ao redor do mundo não menos do que 201 guerras convencionais, sem falar dos conflitos criados sob a denominada guerra híbrida ou de baixa intensidade. Desde então tem se formalizado e pretende-se legalizar perante o mundo o assédio e a destruição deste Estado Nação. Estas agressões foram exacerbadas, como Vossa Excelência sabe bem, desde a eleição do senhor Donald Trump, que em menos de dois anos tem incrementado a hostilidade econômica e financeira para asfixiar o Estado venezuelano e matar de fome a sua população. Tudo isso à luz do dia e perante esta nobre instituição, cuja razão de ser é evitar a volta da guerra, zelando precisamente pelo direito internacional. Nas últimas horas, o presidente Trump tem formalizado a espoliação dos bens nacionais da nação bolivariana e ameaça os países sócios, colocando em risco a segurança de 30 milhões de habitantes.
As sequelas deste ato criminoso atingem, tal como se pretende, limites brutais e desumanos, impedindo o acesso aos alimentos, medicamentos e insumos importados imprescindíveis, incluindo tratamentos médicos de emergência e peças de reposição essenciais para as tarefas coletivas. Ninguém escapa delas. Todos, crianças e idosos, homens e mulheres, partidários do governo e opositores, todos são vítimas deste ataque canalha, contrário ao ordenamento legal que rege as Nações Unidas e os elementares princípios e direitos humanos. Ao longo da sua história, nenhum governo venezuelano tem enviado sua força armada para agredir ninguém, exceto para liberar seus irmãos do primeiro colonialismo invasor. Como expressou o Libertador Simón Bolívar ao agente diplomático norte-americano Baptist Irvine: “Não permitirei que sejam ultrajados nem desdenhados o Governo e os direitos da Venezuela. Defendendo-os contra a Espanha, tem desaparecido uma grande parte da nossa população e o restante que fica almeja por merecer igual sorte. O mesmo é para a Venezuela combater contra a Espanha do que contra o mundo inteiro, se o mundo todo a ofende”…
Na Venezuela acreditam na resolução pacífica dos conflitos. Jamais tem sido, nem são nem serão uma ameaça para nenhum povo do mundo, nem pretendem dominar ou explorar ninguém. Pelo contrário, habitam neste país milhões de irmãos de todas as partes da América e do mundo, que constituem quase um quarto de sua população.
Não acreditam que o povo dos Estados Unidos tenha outorgado mandato aos seus governos para agredir e invadir outras nações. Estes o fizeram e o fazem, porém, em nome de um Destino Manifesto que representam, como predisse Simón Bolívar, a verdadeira ameaça para a América, nos últimos 150 anos tem infetado de ditadores e misérias em nome da liberdade.
Assim, pois, Excelentíssimo Dr. Guterres, os povos do mundo dirigimo-nos a Vossa Excelência para que, em seu caráter de Secretário Geral da ONU, não só eleve a sua voz perante tão injusta e vil agressão, mas também para lhe exigir que seja protegida esta Nação deste insólito crime, pois os que sucumbirão serão a ordem e as leis internacionais que têm mantido a humanidade livre de um conflito planetário. É por isso que solicitamos, sendo a Venezuela país membro, que o Sistema das Nações Unidas exija a cessação desta brutal agressão contra esta Pátria e acione os mecanismos existentes para a proteção do povo venezuelano, e que seja garantido o pleno direito que têm todos seus habitantes ao desenvolvimento humano e à vida plena.
Edição: Rodrigo Chagas