Em sabatina na Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (9), o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, foi duramente questionado a respeito das ações tomadas pelo governo Bolsonaro para a área. Convocado para prestar esclarecimentos sobre o aumento do desmatamento na Amazônia na Comissão de Meio Ambiente (CMA), Salles admitiu que os números têm relação com “o aumento da pressão por atividades ilegais”, incluindo o crescimento de áreas de atividades como agricultura, pecuária, garimpo ilegal e extração de madeira.
Dados do Programa Queimadas e do sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), mostram que a área desmatada no bioma amazônico chegou a 1.173 km² até o dia 19 de setembro. Durante todo o mês de setembro do ano passado, por exemplo, a marca atingida foi de 739 km².
“O que se vê é a pressão dessas atividades, que resultam num aumento do desmatamento. Também houve, desde 2012 até 2019, o enfraquecimento das equipes dos orçamentos e dos instrumentos de fiscalização, comando e controle para a contenção do desmatamento ilegal. Ao mesmo tempo, nesse período de 2012 em diante, a inocorrência de alternativas de utilização sustentável da economia local”, disse o ministro.
Em resposta, o deputado Camilo Capiberibe (PSB-AP) provocou: “Reconhecer o problema é importante, mas queria saber qual é o seu projeto para debelar a crise na questão do desmatamento e das queimadas”. A atitude foi seguida por vários outros parlamentares. Salles afirmou que um projeto para a área ainda estaria em fase de formulação e por isso não foi levado para o conhecimento da Câmara.
“[Ele] não tem nenhum projeto de combate ao desmatamento nem de política pública. Na verdade, representa os interesses do setor privado. Ele é inapto pra ação pública”, criticou a líder da minoria, Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
O ministro também foi confrontado sobre outros temas, como é o caso da asfixia orçamentária na área ambiental. A deputada Fernanda Melchiona (PSOL-RS), integrante da CMA, destacou que o governo desmontou a estrutura de fiscalização de órgãos como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Além disso, Melchiona destacou que o Ministério do Meio Ambiente (MMA) não estaria batalhando por verbas para garantir a continuidade dos trabalhos do setor.
“Pro ano que vem, estão propondo um orçamento 25% menor que os recursos de 2019, de 34% a menos para o combate a incêndios florestais e áreas prioritárias, e de 50% a menos no do monitoramento ambiental e na gestão de informação, por exemplo. Estão cortando recursos essenciais. E que ministro do Meio Ambiente é esse que sequer briga por recursos no ministério? Isso, combinado com outras ações do governo, abre as porteiras para as forças mais atrasadas”, criticou a parlamentar do PSOL.
O líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ), também cobrou empenho na captação de verbas. Os parlamentares estão, até o final deste mês, em fase de elaboração de emendas para destinação de recursos a diferentes setores e projetos públicos. De acordo com Molon, a oposição não tem conseguido formalizar pedidos de financiamento para o MMA por falta de ação da pasta.
“Hoje de manhã, minha assessoria ligou, pela segunda vez, para o seu ministério perguntando sobre o edital para destinação de emendas. Nós da oposição queremos destinar recursos para que o senhor possa cumprir com suas obrigações e não tenha que deixar de cumpri-las por falta de dinheiro, mas não há edital, não há cartilha, não há orientação”, apontou Molon.
O ministro afirmou que irá apresentar projetos que “poderiam ser acolhidos com as emendas propostas”.
Questionado também sobre o vazamento de óleo que ocorre atualmente no litoral do Nordeste, o ministro respondeu que o produto “veio de um navio estrangeiro, ao que tudo indica” e que “muito provavelmente é da Venezuela”, em referência a um relatório elaborado pela Petrobras, mas não deu detalhes sobre o caso.
Ele também disse que o governo estaria tendo “uma enorme dificuldade de conter” o vazamento. O problema se desenrola desde o mês passado e mais de 130 locais foram atingidos nos nove estados nordestinos.
Salles se retirou da audiência antes do fim da sessão, quando ainda havia quatro deputados inscritos para falar. Ele alegou que tinha outro compromisso na sequência, o que, segundo o presidente da CMA, Rodrigo Agostinho (PSB-SP), não havia sido comunicado ao colegiado antes do início. "Uma pena que ele não tenha ouvido a todos”, disse o parlamentar. "Mais uma vez o ministro fugiu”, criticou Talíria Petrone (PSOL-RJ).
Protestos
Os protestos populares também fizeram parte da passagem do ministro pela Câmara nesta quarta-feira. Em uma intervenção ocorrida antes da audiência, Salles recebeu das mãos do adolescente Ian Coelho, de 17 anos, o prêmio de “exterminador do futuro”.
“A gente veio criticar as várias falácias que ele tem proferido acerca da Amazônia. Ele batalhou tanto pra conseguir esse prêmio que a gente deve um reconhecimento pra ele”, ironizou o ativista, mencionando questões como a não demarcação de terras indígenas e a redução de áreas de proteção ambiental.
Já a militante Tamires Felipe Alcântara, que atua em defesa da causa animal, uniu-se a um grupo de parceiros e estendeu uma faixa no plenário em protesto contra o leilão dos blocos de petróleo do arquipélago de Abrolhos, na Bahia, considerado o local com maior biodiversidade da região do Atlântico Sul.
Agendada para esta quinta-feira (9), a venda é duramente criticada por ambientalistas, que apontam risco de redução da fauna, e está sub judice desde terça (8) por conta de uma decisão da Justiça Federal na Bahia.
O grupo de militantes organiza desde abril um abaixo-assinado virtual que pede a exclusão dos blocos de Abrolhos do leilão organizado pelo governo. O documento reúne atualmente cerca de 1,1 milhão de apoios, entre assinaturas de brasileiros e estrangeiros.
“Mostra que muita gente se importa com essa causa, que tem muita gente defendendo Abrolhos, e o ministro deve ouvir as pessoas, a população, porque a gente vive numa democracia. Espero que ele escute essa mensagem da petição e repense esse leilão”, disse Tamires ao Brasil de Fato.
Ricardo Salles não comentou os protestos e saiu da Câmara fortemente escoltado por seguranças.
Edição: Vivian Fernandes