O governo brasileiro e os diretores da Petrobrás insistem na tese de que o vazamento de petróleo na costa Nordeste do país são de origem venezuelana.
O ministro de Petróleo da Venezuela, Manuel Quevedo, rechaçou a possibilidade. "Condenamos estas acusações infundadas, cujo objetivo é aprofundar as agressões unilaterais coercitivas contra o povo venezuelano. Ratificamos nosso compromisso de preservar a vida na Mãe Terra, tal como estabelece a Constituição da República Bolivariana da Venezuela e a Lei do Plano da Pátria", escreveu o executivo venezuelano na sua página na rede social Twitter.
Apesar de não apresentar dados ou qualquer prova, e basear sua argumentação em um suposto estudo -- não divulgado -- de técnicos da Petrobrás, o governo brasileiro mantém a denúncia.
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O Brasil de Fato consultou o especialista em geopolítica do petróleo, Miguel Jaimes sobre o tema. O professor autor dos livros "Petrocaribe: a geogerência petroleira" e "O Poder Oculto de PDVSA: abertura petroleira" reiterou ser impossível afirmar que os resíduos de combustível fóssil que atingem o Brasil desde setembro têm origem na Venezuela.
Ele explicou que, se o vazamento fosse venezuelano, deveria ter atingido outros locais na própria Venezuela, além de ilhas do Caribe, antes de chegar ao Brasil. Mas não há qualquer relato de contaminação nesses locais.
O especialista afirma ainda que a acusação do governo de Jair Bolsonaro (PSL) é "apressada e parte de um planto para culpabilizar o país presidido por Nicolás Maduro". "Jamais recebemos uma denúncia como essa na nossa região, nem agora com o governo bolivariano, nem há décadas", afirmou.
Brasil de Fato: É possível afirmar que o petróleo que está chegando à costa Nordeste do Brasil é de origem venezuelana, assim como afirma o governo Bolsonaro?
Miguel Jaimes: O petróleo que está chegando no Brasil não vem da Venezuela. A Venezuela tem a infraestrutura das suas oito refinarias na zona norte-costeira venezuelana, em frente ao Atlântico, ao Mar do Caribe, na zona noroeste do país.
Se seguimos caminho para o leste do país, temos ainda o território das duas Guianas antes de chegar ao território brasileiro. Ou seja, é uma distância de uma quantidade de milhas náuticas que torna totalmente impossível que as águas do Caribe estejam levando resíduos de petróleo para o Brasil.
Vale lembrar que a zona norte venezuelana tem confluência para as ilhas do Caribe. Se o petróleo venezuelano estivesse chegando ao Brasil, num suposto vazamento, como acusa o governo de Jair Bolsonaro, deveria ter atingido também qualquer ilha do Caribe, que estão muito mais próximas da Venezuela que do Brasil. E até agora não há nenhuma notícia ou denúncia de resíduos de petróleo venezuelano chegando a essa área.
Cabe destacar que na parte nordeste da Venezuela, que digamos, poderia ser relativamente próxima ao Brasil ou no caminho para o Brasil, no estado Sucre, nós temos produção de gás e não de petróleo.
E na nossa fronteira sul com Brasil temos atividade de mineração, de extração de ferro, ouro, diamante. Nossa estrutura de petróleo não está desenvolvida ao sul do país.
Por isso é impossível. Esse petróleo não corresponde à Venezuela.
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Quais outros fatores poderiam ajudar a comprovar que esse vazamento não tem nada que ver com as atividades da PDVSA?
Não há um estudo técnico feito por engenheiros. É uma loucura afirmar que nosso petróleo possa atravessar nossa costa, passe por vários países e chegue ao Brasil. Se isso estivesse acontecendo, antes chegaria à região do Delta do Orinoco, a Caño Manamo, ao Rio Orinoco e até agora não há qualquer denúncia por parte das comunidades ou mesmo da PDVSA.
Isto certamente corresponde a um plano, a uma denúncia muito apressada feita pelos técnicos brasileiros e apoiadas pelo governo, que imediatamente trata de culpabilizar a Venezuela.
Certamente, se existe algum vazamento de petróleo essa responsabilidade é do Brasil, que tem atividade petrolífera com a Petrobras nessa região.
Fruto da falta de manutenção das suas plataformas, da sua infraestrutura e seus poços, por falta de investimento governo de Jair Bolsonaro, e a consequência paga o seu próprio território com contaminação das suas águas, dos oceanos, costas.
E isso é produto do descuido e de não levar em conta o poder da indústria petrolífera brasileira.
Então, você acredita que é possível existir um fundo político por detrás dessas acusações?
A situação política do Brasil é muito delicada. Entendemos se comparamos com a situação atual do Equador e do Peru. Ambos governos têm se dedicado a atacar o governo da Venezuela para tentar esconder uma situação de terrível instabilidade política.
Agora onde Brasil acusa e denuncia que o governo venezuelano é culpado e responsável pelo vazamento, sabemos que é uma região controlada pela presença norte-americana, há tropas da marinha estadunidense, que realizam exercícios militares.
Algo que é muito mais complicado e muito mais atrevido por parte do governo brasileiro, que permite que uma região do seu país tenha intervenção dos Estados Unidos, algo que contraria tratados e acordos de não intromissão estrangeira em nossos territórios, assinados junto com outros governos da América Latina.
De maneira irresponsável, o governo do Brasil, contrariando os princípios de soberania, de autonomia, assinado com seus próprios irmãos latino-americanos, permitiu que no seu território se instalem forças militares estadunidenses.
Primeiramente, Venezuela denuncia que a presença das tropas militares norte-americanas não serve para estabilidade e paz da região, ao contrário, o que busca é criar planos de intervenção e sabotagem, como o que faz contra a República Bolivariana da Venezuela.
Agora é claro, vão atacar a Venezuela, dizer que Venezuela é responsável pelo vazamento de petróleo na costa nordeste do Brasil. Isso corresponde a políticas dirigidas por serviços de inteligência de Estados Unidos que atuam nessa região para cobrir, dificultar e não necessariamente gerar governança, mas buscam seguir atacando de maneira irresponsável e desmedida a Venezuela -- um país que mantém sua estrutura petrolífera bem cuidada.
Jamais recebemos uma denúncia como essa na nossa região, nem agora com o governo bolivariano, nem há décadas. Isso porque a infraestrutura petrolífera venezuelana conta com muita segurança e certificados internacionais.
Outros países na América Latina não podem dizer o mesmo. Brasil inclusive, que não é a primeira vez que tem denúncias de vazamento petroleiro na sua estrutura.
Quais medidas a Venezuela poderia tomar?
Somos um país soberano e pacifista.
Certamente, se qualquer país da América do Sul, inclusive Brasil, que deseje qualquer tipo de ajuda, nós poderíamos oferecer apoio logístico para recuperar sua estrutura petrolífera ou para controlar esse vazamento de petróleo, porque ainda que tenhamos muitas diferenças políticas com o atual governo brasileiro, estamos interessados no meio ambiente.
Se pudéssemos ajudar a controlar esse vazamento, com nossa solidariedade regional, de defesa do Sul-Sul, certamente apoiaríamos.
Edição: Rodrigo Chagas