Os brasileiros que foram atingidos pelos crimes ambientais de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais, e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) estão na luta para denunciar o descaso e a impunidade da mineradora Vale, empresa responsável pelos dois crimes.
Em Mariana, foram 19 mortes e em Brumadinho morreram 249 pessoas, além de outros 21 desaparecidos. Há, porém, milhares de pessoas atingidas que não têm seu direito de reparação reconhecido pela mineradora.
Buscando justiça, o MAB lançou a jornada de luta “A Vale Destrói, o povo constrói”, com programação de outubro de 2019 a março de 2020. O evento ocorreu na sede do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), na capital paulista, nesta terça-feira (15).
As atividades envolvem encontros de atingidos, uma audiência pública, uma feira estadual da saúde dos atingidos, uma marcha até Brumadinho e um festival cultural.
Como parte da iniciativa, em regime de mutirão, o Movimento vai construir uma casa para simbolizar a luta dos moradores atingidos que ainda aguardam a reparação da Vale e que, muitas vezes, nem entraram na lista dos atingidos.
A casa a ser construída é a da faxineira Yolanda Gouveia, 29 anos, que tem três filhos com idade entre seis anos e 12 anos -- e foi sorteada para receber a nova moradia. Ela e o marido que é pescador e pedreiro moram perto do rio Doce e não podem nem mais comer o peixe do rio. A família luta há quatro anos para ser reconhecida como atingida de Mariana.
"Essa casa vai ser construída para mostrar que a Vale há quatro anos não fez nada. Tiraram as pessoas das casas não reformaram as casas. Tem casa que vai ter que ser derrubada depois de tanto tempo fechada", explica.
A casa nova da faxineira será na região rural da cidade, longe da área contaminada pelos caminhões que passam pela rua com a lama contaminada.
Em Barra Longa, a Vale deixou um rastro de desemprego e tristeza. “O aluguel era de 200 a 300 reais. Agora, quando tem uma casa pra alugar é 2.000. Muita gente, muitos amigos, tiveram que ir embora”, relata.
Durante este período, de acordo com o MAB, a Vale, por meio da Fundação Renova, gastou R$ 5 bilhões com ações de reparação, porém não construiu uma única casa.
O ex-ministro dos Direitos Humanos Paulo Vannucci elogiou a iniciativa do MAB. “É importante e muito simbólico a construção de uma casa. Ter um lugar para morar e poder recomeçar a vida”, afirmou o ex-ministro do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Uma das participantes do evento em São Paulo, a funcionária pública Joelisia Feitosa, 56 anos, mora em Joatuba, a 40 km de Brumadinho. Quase um ano depois, ela ainda sente no cotidiano os efeitos do crime ambiental e o descaso da Vale.
“As pessoas estão ficando doentes o tempo todo. Só quem tem dinheiro pode comprar água mineral. O restante tem que usar a água que está contaminada. Daí fica com dor de barriga, na cabeça, em tudo”, conta.
Enquanto a população passa por necessidades, a Vale vai empurrando como pode para frente as ações de reparação. “Os mortos de Mariana e de Brumadinho falam. Eles falam por meio dos protestos dessa jornada e das denúncias que não podem deixar de ser feitas”, disse o ex-ministro.
Jornada de lutas: A Vale destrói, o povo constrói
Confira a programação anunciada pelo MAB:
Outubro - Início da construção da casa (Barra Longa/MG)
25 e 26 de outubro - Encontro das mulheres atingidas por barragens (Belo Horizonte/MG)
3 a 5 de novembro - Encontro dos Atingidos (Mariana/MG)
5 de novembro - Audiência Pública na Comissão de Direitos Humanos (Brasília/DF)
15 de novembro - Feira estadual da saúde dos atingidos (Baixo Guandu/ES)
20 a 20 de janeiro - Marcha dos atingidos (de Poméu/MG a Brumadinho/MG)
21 e 22 de março - Festival cultural da água (Belo Horizonte/MG)
Fundação Renova
Contatada pelo Brasil de Fato, a Fundação Renova informou uma série de ações de reparação:
"A Fundação Renova é a entidade responsável pela mobilização e execução da reparação dos danos provocados pelo rompimento da barragem de Fundão. Até agosto, foram destinados R$ 6,68 bilhões para as ações integradas de recuperação e compensação socioambiental e socioeconômica da bacia do rio Doce. Cerca de R$ 1,84 bilhão foram pagos em indenizações e auxílios financeiros emergenciais para cerca de 320 mil pessoas. Mais de 1.400 obras foram executadas ao longo de todo o território atingido."
Edição: Rodrigo Chagas