Em palestra feita nesta quinta-feira (17), no Senado, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes criticou a Lei nº 12.850/2013, que instituiu a delação premiada no país. Um dos principais mecanismos utilizados pela operação Lava Jato, a prática consiste na aceitação formal da colaboração de réus no processo de investigação criminal e tem sido comumente utilizada para entregar possíveis comparsas do acusado.
Ao discorrer sobre o tema da criminalização da política, Mendes disse que a legislação teria sido aprovada como “tábua de salvação para o combate à corrupção”, mas sugeriu que a medida trouxe como ressonância um conjunto de problemas.
“Hoje nós vemos que faltaram [na lei] normas de organização e procedimento. Ainda anteontem, o ministro Nefi Cordeiro dizia, no STJ [Superior Tribunal de Justiça], que a prisão do delator ou a delação feita por alguém preso, de fato, sugere uma tortura. E nós estamos agora, com as revelações do Intercept, apreendendo o que se fez nesse ambiente”, afirmou.
Crítico da operação, o ministro também lembrou uma das denúncias feitas pelo veículo na série de reportagens conhecida como “Vaza Jato”, que vem sendo publicada desde junho deste ano. Ele fez menção indireta à pressão da equipe da operação sobre a filha do empresário luso-brasileiro Raul Schmidt, alvo da Lava Jato, para tentar convencer o acusado a se entregar.
“‘Delate, fulano’ ou ‘delate, sicrano’ ou ‘talvez a gente prenda a filha dele porque, assim, ele fica mais sensível’. Quer dizer, tudo isso sugere que tem que ter um outro tipo de tratamento [para tais casos]”, (15:05) acrescentou, ao citar diálogos trazidos à tona pelo Intercept.
“Esse é um debate que muitos estão tendo e, [sobre] os abusos que vêm sendo revelados nas delações, há alguma sugestão que já tramita hoje aqui na própria Câmara ou no Senado no sentido de proibir a delação daquele que está preso”, destacou.
O ministro também comentou a questão da preservação do Poder Legislativo no sistema institucional do Brasil e se disse preocupado com o envio de policiais ao Congresso Nacional para cumprimento de medidas de busca e apreensão em gabinetes. No mês passado, por exemplo, a situação se repetiu e teve como alvo o líder do governo de Jair Bolsonaro (PSL) no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).
“Nós temos uma tradição de interrupção dos ciclos democráticos entre nós. A Constituição Federal já está vivendo o seu limite em termos temporais. Trinta anos, normalmente, já é um período de estresse nas instituições, e é o mais longo período de normalidade institucional da República. Agora, você mandar polícia para o Congresso em ação ostensiva passa uma imagem extremamente negativa sem que haja necessidade”, defendeu.
Julgamento
Questionado por jornalistas a respeito da expectativa para o julgamento do STF sobre a legalidade de prisão após condenação em segunda instância, que se iniciou nesta quinta-feira (17), Gilmar Mendes se limitou a confirmar a projeção de que a Corte deve se concentrar nas sustentações orais nesta semana, deixando a retomada do tema para a próxima semana, a partir do voto do relator do caso, ministro Marco Aurélio.
“Acho que esse tema precisa ser definido. Acho que é preciso ter segurança jurídica nessa quadra e acho que vamos ter isso definido agora”, disse.
Edição: Rodrigo Chagas