Cerca de 5,84 milhões de bolivianos foram às urnas para eleger presidente, vice-presidente, deputados e senadores. Após quase 84% dos votos apurados pelo Tribunal Supremo Eleitoral (TSE), a disputa pela presidência deve ir para o segundo turno, previsto para o dia 15 de dezembro.
O atual presidente Evo Morales, candidato do Movimento ao Socialismo (MAS) tem 45,3% dos votos. Principal opositor, Carlos Mesa tem 38,2%.
O pastor Chi Hyun Chung aparece em terceiro lugar, com 8,8% dos votos; Oscar Ortiz é o quarto colocado, com 4,4%. Nulos e brancos somam 5% dos votos válidos e os demais candidatos têm menos de 2%.
Os resultados preliminares foram divulgados por volta das 21h30. Com a manutenção da diferença atual de 7,1 pontos percentuais, haverá segundo turno. Para vencer em primeiro turno, seria preciso ter 40% dos votos e mais de dez pontos percentuais de vantagem em relação ao segundo colocado.
A previsão, porém, é de que a vantagem de Evo cresça com a apuração dos votos restantes. Tratam-se das urnas de locais mais isolados do país, onde Evo tem favoritismo.
Ao se pronunciar no palácio da presidência, por volta das 22h30 (horário de Brasília), Morales disse ser necessário aguardar a chegada dos "votos do campo" e afirmou acreditar na vitória.
Se as eleições fossem disputadas apenas na zona rural, Morales venceria em primeiro turno com 52% das intenções de voto contra 15% do segundo colocado, Mesa. Considerando campo e cidade, ele tem 40% das intenções de voto contra 22% do ex-presidente, segundo o instituto IPSOS.
Por sua vez, Mesa já comemorou a ida ao segundo turno em coletiva de imprensa após a divulgação dos resultados parciais. "Conseguimos um triunfo inquestionável, que nos permite dizer: estamos no segundo turno", declarou. O ex-presidente boliviano sabe que terá um cenário muito mais favorável caso se confirme o novo pleito. "Estamos seguros de ter a maioria ao nosso lado para vencer no segundo turno", concluiu.
::Veja como foi o dia de votação na Bolívia::
As mesas de votação permaneceram abertas entre as 9h (horário de Brasília) e as 17h. Cerca de 7 milhões de bolivianos estavam aptos a votar.
Durante a votação, Carlos Mesa disse ter "alta desconfiança" em relação ao TSE – indicando mais uma vez que não aceitaria o resultado das urnas em caso de derrota.
"Não confio na transparência do tribunal. É um braço do governo", disse o opositor em coletiva de imprensa logo após depositar seu voto. "Espero que mudem minha opinião com seu trabalho".
Conheça os principais candidatos
Prestes a completar 60 anos, Evo Morales, do Movimento ao Socialismo (MAS). Liderança histórica dos cocaleiros em Cochabamba, região central, ele concorre ao quarto mandato ao lado do vice Álvaro García Linera. Sociólogo e ex-membro do Exército Guerrilheiro Tupac Katari (EGTK), referência na luta dos povos indígenas por direitos, Linera é um dos principais teóricos das transformações promovidas pelo governo atual.
Durante os três mandatos de Morales, a Bolívia quadruplicou seu Produto Interno Bruto (PIB) e reduziu a extrema pobreza de 38,2% para 15,2%. Os três pilares da economia são: a nacionalização dos hidrocarbonetos, o investimento público e a distribuição de renda
Um dos pontos altos dos 14 anos de governo foi o referendo constitucional de 2009, que transformou o país em um Estado Plurinacional, ampliando o conceito de democracia e garantindo direitos que antes eram negados aos povos originários.
Hoje, a Bolívia tem mais de 30 idiomas oficiais, um sistema inédito de cotas para mulheres no parlamento e é um dos únicos em que os integrantes do Poder Judiciário são eleitos pela população.
O ex-presidente Carlos Mesa (Comunidade Cidadã), aos 66 anos, propõe uma mudança gradual de modelo econômico, distanciando-se do horizonte socialista.
O seu principal desafio durante campanha foi desvencilhar-se de seu passado neoliberal. Mesa governou o país interinamente de outubro de 2004 a março de 2005. Antes, era vice de Gonzalo Sánchez de Lozada, que teve que abandonar o país após um mandato marcado por recessão, entrega de bens naturais a estrangeiros e violência do Estado.
O candidato a vice escolhido por ele é o ex-ministro Gustavo Pedraza, especialista em “desenvolvimento sustentável” com formação nos Estados Unidos e nascido em Santa Cruz de La Sierra – uma tentativa clara de disputar eleitores nas “terras baixas”, como é conhecida a porção oriental do país.
O empresário e senador Óscar Ortiz (Bolívia Diz Não) tem 50 anos e era o terceiro colocado nas pesquisas, com 10% das intenções de voto. Em Santa Cruz, maior cidade da Bolívia e sua terra natal, ele ficaria em primeiro lugar nas eleições com 27% dos votos.
Apoiado por grandes proprietários de terra e com um programa neoliberal, Ortiz tem como principal bandeira uma reforma institucional na Bolívia – combate à corrupção e controle dos gastos públicos.
A jovem deputada Shirley Franco, de 32 anos, é candidata à vice nesta chapa. Ela foi anunciada às pressas em agosto após a surpreendente desistência do senador Edwin Rodriguez.
Fundador de mais de 70 igrejas presbiterianas, o sul-coreano Chi Hyun Chung (Partido Democrata Cristão) chegou a 6% nas pesquisas e foi candidato que mais cresceu nas pesquisas na reta final.
Com uma campanha realizada principalmente pela internet, ele aposta em uma agenda ultraconservadora e agressiva, com bandeiras semelhantes às que elegeram Bolsonaro no Brasil: ataques a mulheres, homossexuais e minorias.
Analistas políticos bolivianos afirmam que, se a curva de crescimento de Chi houvesse começado um mês antes, ele seria um dos favoritos a uma vaga no segundo turno.
A vice da chapa é a empresária Benigna Irma Acne Vargas, descendente de aimara da região de La Paz.
Chi (centro) é conhecido pelo discurso sarcástico e agressivo. (Foto: Divulgação/Facebook)
Quase metade dos eleitores são jovens de até 35 anos, muitos deles sem memórias dos tempos de recessão que antecederam Evo Morales – presidente desde 2006. Com 11 milhões de habitantes e mais de 10 mil pontos de conexão fixa e móvel a internet, a Bolívia se tornou um prato cheio para a circulação de notícias falsas em aplicativos de conversa como o WhatsApp.
*Com informações de Daniel Giovanaz, direto de La Paz (Bolívia).
Edição: Rodrigo Chagas