A independência do Conselho Penitenciário (Copen), no Pará, está numa queda de braço entre governo e parlamento. A questão ganhou visibilidade depois que uma série de denúncias de torturas realizadas por homens da Força de Intervenção Penitenciária (FTIP) chegaram ao conhecimento do público.
As violações de direitos humanos são de mulheres que foram obrigadas a sentar em formigueiros, excessos pelo uso de spray de pimenta, espancamentos e um homem que foi empalado com o cabo de uma arma.
Na manhã da última terça-feira (22), a Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), votou o projeto de lei (PL) n° 316 de 2019, que decidiu manter a independência do Copen e que a maior parte dos membros será de órgãos que não fazem parte do governo do estado.
Mas nesta quarta-feira (23), durante o segundo turno da votação do PL, a Alepa aprovou uma subemenda apresentada por dez deputados da base do governo e que altera uma parte substancial do que foi decido na sessão anterior: o presidente do Copen será escolhido pelo governador Helder Barbalho (MDB).
Instituições ligadas aos direitos humanos e até mesmo deputados alertam que o ato é inconstitucional.
Carlos Bordalo (PT) e Eliel Faustino (DEM) foram os únicos que se opuseram à emenda de maneira clara. Todos os outros deputados apoiam a decisão de intervir na configuração e independência do conselho.
A subemenda de hoje foi apresentada pelo deputado Chicão (MDB), líder do governo na Alepa, mas encabeçada por Ozório Juvenil (MDB) e assinada por dez deputados da base aliada, o mínimo necessário para poder ser apresentada.
Ozório Juvenil afirma que a decisão tomou como base o que é feito em outros conselhos penitenciários do Brasil, dizendo que o governador sempre nomeia os presidentes dos conselhos penitenciários. "Fizemos uma redação ontem e agora baseada no regimento interno do Copen, simplesmente esclarecemos esse regimento e trouxemos essa situação para a legislação. Tão somente isto", argumenta.
Autonomia ferida
A eleição do Conselho Penitenciário do Pará, atualmente, funciona de forma independente e democrática. Ou seja, membros do conselho votam diretamente para eleger a presidência do órgão. Após a escolha, o governador realiza a homologação.
A alteração aprovada pela Alepa transforma o ato homologatório em escolha política, segundo José Maria Vieira, membro do Conselho de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil do Pará (OAB/PA).
"A Juliana, atual presidente, foi eleita presidente Copen por unanimidade das partes. Os membros a elegeram por unanimidade. E aí ela foi nomeada pelo governador, mas é uma nomeação homologatória do processo eleitoral. Então, o que essa emenda faz está acabando com o processo eleitoral e alterando o tipo de nomeação, porque agora é indicação pura do governador. Isso é terrível", explica.
Eliel Faustino (DEM), apesar de ser da base do governo, fez uma análise crítica ao fato de o executivo querer intervir no Copen, considerou que o órgão precisa de independência e que essa interferência caracteriza uma inconstitucionalidade.
"Nós fomos contra essa emenda, porque desde o início nós tínhamos acordado com a base do governo que o conselho ia se reunir por maioria e elegeria o presidente para poder ter a independência para que ele já tenha imparcialidade, para que ele tenha também qualificação técnica. Nosso objetivo com isso é manter o que vem sendo feito desde 1925 e regulamentado em 1979 por um decreto estadual que é o 418, no sentido de que ele possa ter essa independência para poder fazer a sua ação consultiva e fiscalizadora", relatou o deputado.
Para o advogado José Maria Vieira, da OAB/PA, a questão da arbitrariedade é muito clara, uma vez que uma decisão votada e acertada entre deputados foi desrespeitada em menos de 24 horas.
"É lamentável o caminho que o Jarbas está induzindo o governador a tomar e o caminho que o governador está optando por assumir. É muito ruim o governo bancar uma disputa com a sociedade civil à toa, à troco de uma imoralidade, de quebra de compromisso e à troco da violação democrática".
Para Vieira, o processo legislativo paraense está viciado e a única solução agora para garantir a autonomia do Copen é recorrer às esferas jurídicas.
"Discutir judicialmente a legalidade do processo legislativo. Judicialmente, porque politicamente só se nós construíssemos uma maioria dentro do parlamento para poder fazer isso. Olhando de forma bem crítica estamos de braços, pés, mãos, pés e bocas atadas, porque o governo decidiu passar um rolo compressor em cima disso", conclui.
A OAB/PA afirma que nesta quinta-feira (24), medidas serão articuladas para conter a decisão aprovada pelos deputados, porque ela fere a Constituição brasileira.
Edição: Rodrigo Chagas