Parlamentares autores de Propostas de Emendas Constitucionais (PECs) para permitir a prisão imediata de réus condenados segunda instância se movimentaram assim que o Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu decisão contrária sobre o assunto, na quinta-feira (7).
O posicionamento do ministro Dias Toffoli durante a votação, favorável à possibilidade de mudanças na lei pelo Legislativo, foi primordial para reacender a discussão nos corredores do Congresso.
Há PECs em tramitação nas duas casas legislativas: a 5/2019, do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), e a 410/2018, do deputado Alex Manente (Cidadania-SP). Ambas estão em processo de apreciação nas respectivas comissões de Constituição e Justiça (CCJ).
Manente garantiu que já tem acordo com o presidente da CCJ na Câmara, Felipe Francischini (PSL-PR), para que a proposta na Câmara seja votada na próxima segunda-feira (11).
“É hora de a Câmara dos Deputados e o Congresso Federal cumprirem o seu papel e avançarem a nossa emenda constitucional para que possamos, de uma vez por todas, colocar um ponto final nessa história, dar segurança jurídica e, principalmente, combater a corrupção e a impunidade, mostrando que a Câmara está pronta para cumprir o seu papel de responder os anseios da sociedade”, afirmou o deputado paulista.
A presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Simone Tebet (MDB-MS), também prometeu pautar a PEC na próxima sessão da CCJ.
“Diante da decisão do STF, principalmente da declaração de voto do presidente daquela Corte no sentido de que o Congresso pode alterar a legislação sobre a prisão em segunda instância, incluirei, na pauta da próxima reunião da CCJ, PEC de autoria do senador Oriovisto”, pronunciou-se em nota.
Do que tratam as PECs
A PEC 410/2018, em tramitação na Câmara, prevê mudança no inciso LVII do artigo 5ª da Constituição Federal. A proposição altera o texto que diz que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, para “ninguém será considerado culpado até a confirmação de sentença penal condenatória em grau de recurso”.
A discussão central da proposta é o princípio da presunção da inocência. Para o autor, os recursos cabíveis da decisão de segundo grau, ao STJ ou STF, não se prestam a discutir fatos e provas, mas apenas matéria de direito. Ele cita o regime militar para justificar que, na Assembleia Constituinte de 1987, foi preciso “inserir garantias processuais contra prisões e condenações arbitrárias”, em razão as perseguições políticas e tragédias sociais da época.
No entanto, conforme a PEC, houve mudanças na sociedade preponderantes para confiar nas decisões de primeira instância. “A democracia brasileira amadureceu. As instituições funcionam perfeitamente; com autonomia e dentro dos limites constitucionais. O Poder Judiciário é independente, não sofre influência daqueles que estão no poder. Não vigoram, portanto, os motivos determinantes que levaram os Constituintes a adotar norma extrema que, na prática, desconsidera a independência dos magistrados de instâncias inferiores”.
Já a PEC 5/2019, em pauta no Senado, propõe acrescentar ao artigo 93 da Constituição Federal o seguinte inciso: “a decisão condenatória proferida por órgãos colegiados deve ser executada imediatamente, independentemente do cabimento de eventuais recursos."
O argumento central do autor da proposta é o de excessivo número de recursos processuais. “Quando se entende que a aplicação da pena depende do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, tem-se uma grave consequência: a utilização da via recursal passa a servir para retardar o cumprimento da sanção penal, o que só aumenta o sentimento de impunidade generalizado entre os brasileiros”, justifica o senador Oriovisto.
Possibilidades e riscos
A aprovação de PECs no Congresso passa por votação especial, com a necessidade de aprovação por três quintos dos parlamentares, após dois turnos de discussão (1º turno tem cinco sessões e 2ª turno tem três sessões).
Em razão disso, juristas ouvidos pelo Brasil de Fato dizem não acreditar que as propostas prosperem, justamente pela dificuldade em angariar os votos necessários para uma alteração tão brusca. Outra questão que diminui as chances das alterações é que os ministros do STF não têm acordo sobre o trânsito em julgado como cláusula pétrea da Constituição.
Para o professor de Direito Penal da Universidade de São Paulo, Maurício Dieter, trata-se de cláusula pétrea e, portanto, uma mudança seria inconstitucional.
“Fazer uma PEC não vai dar. O custo é muito grande, a maioria que você precisa é qualificada. Não passa a PEC. Juridicamente, é uma PEC que vai gerar muita resistência e não tem pressão social suficiente para fazer avançar”, afirma.
O jurista Aury Lopes Jr., professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), segue a mesma linha. “Uma proposta de Emenda Constitucional demanda uma votação qualificada, tem todo um sistema de aprovação diferenciado, e que eventualmente vai acabar esbarrando em uma discussão sobre a constitucionalidade ou não. Se passar, é muito possível que se tenha ações declaratórias de inconstitucionalidade no Supremo”, explica.
Os dois juristas afirmam que o maior risco de alterar o entendimento do Supremo por meio do Congresso seria criando leis ordinárias que alterariam o texto do Código de Processo Penal (CPP)
“Se fosse para alterar isso, teria que ser feito por reforma legislativa, ampliando as possibilidades de prisão processual ou então dificultando acesso a recursos especiais e extraordinários”, explica Dieter. "A tendência é de um esvaziamento dessa discussão, dessas PECs. O maior risco para mudança de entendimento no Congresso é por meio de leis simples", reforça Lopes Jr.
Edição: Daniel Giovanaz